A fome apertava. O estacionamento não estava fácil. E aproximava-se a hora do segundo turno, 21h30, no restaurante Il Matriciano, em São Bento. Apesar de já estar de portas abertas há sete anos, em frente à Assembleia da República, esta foi a primeira vez que aqui entrámos — e por momentos esquecemos que estávamos em Portugal e acreditámos sem problema algum se nos tentassem convencer que do lado de fora do espaço estava Roma e o Coliseu.
A verdade é que não estávamos em Itália nem tínhamos o Papa à vista, mas sim uma verdadeira cozinha italiana com produtos de excelência (exceto os frescos) vindos do país da bota, incluindo os vinhos que compõem a garrafeira com mais de 90 referências italianas de que Stefania Carpoca se orgulha.
A italiana e o marido, Alessandro Lagana, abriram este restaurante quando vieram para Portugal, em 2015, mas Alessandro continua sempre entre cá e lá para todas as semanas trazer de Itália mais produtos com que são feitos os pratos da carta.
Um deles, bastante famoso, é a pasta com trufa e com a qual salivámos durante todo o dia até ficar com a boca seca quando soubemos que naquela noite não havia trufa de qualidade para compor o prato. E Stefania admitiu-nos que prefere não servir a pasta al tartufo (16€) do que apresentar algo que não faz jus à excelência do Il Matriciano — que até esteve no programa italiano "Little Big Italy", em que Francesco Panella procura os melhores restaurantes italianos pelo mundo, e foi distinguido como o melhor italiano de Lisboa.
E, para sermos sinceros, ainda bem que não houve pasta com trufa. Para a devorarmos, teríamos passado a oportunidade de provar outros sabores tradicionais italianos.
Antes disso, logo à chegada fomos presenteados com um pedaço de foccacia com molho pesto caseiro e uma flute de prosecco (oferta da casa há sete anos) que borbulhou na boca tanto quanto o entusiasmo que sentíamos dentro de nós ao saber o que se seguiria: bruschetta ai funghi porcini (12€) e malanzane alla parmigiana, isto é, beringelas com queijo parmesão mozarella e molho de tomate (9€).
A primeira chegou com cogumelos cremosos depois de envolvidos em queijo e colocados sobre uma fatia de pão bem tostada e a segunda deixou-nos inquietos. Seria entrada? Principal? Teria somente beringela e não placas de massa sobre o molho de tomate? Eis o veredito final: era mesmo beringela, sem massa ou carne, mas com um abundante molho de tomate e neve de queijo parmesão ralado que soube a lasanha numa espécie de versão vegetariana.
Seguiu-se uma pausa para assentar os sabores e apreciar a música italiana que reforça o ambiente de um restaurante em plena Itália — a Itália portuguesa.
Merecemos pimenta na língua (e mais fosse)
Nos pratos principais, a escolha ficou mais fácil ao excluir a pasta com trufa e um dos pratos que mais sai pelo facto de não consumirmos carne: a Sua "maestá" la carbonara (14€). Se isso foi impedimento para ficarmos tremendamente satisfeitos de prazer? Não. Veio logo o ravioli recheado de burrata, com tomate cherry, manjericão e pinhões tostados (14€), impressionante pela massa vinda de Itália, com sabor bem apurado a espinafres, e depois o auge: a massa tonnarelli, com queijo e pimenta preta (13€).
Nunca escondemos que somos fãs de tudo o que pica na boca (uma das provas está aqui) e esta massa tinha esse toque (na medida certa para os menos tolerantes). Além de pimenta na língua — no sentido gastronómico do termo — somos fãs de queijo e quando isso se junta numa massa al dente é de devorar em dois tempos.
Para acompanhar o restante do vinho branco Argiolas Costamolino Vermentino di Sardegna ainda demos generosas colheradas no clássico tiramisù (7€) e de outra sobremesa comemos casca e tudo. Falamos dos mini gelados artesanais em forma de fruta (12€ para duas pessoas), um conceito em que o gelado, feito com a verdadeira fruta, é apresentado dentro da casca que lhe pertence. Pela primeira vez provámos gelado de castanha, mas os nossos favoritos foram o de banana e o de figo (do qual nem a casca sobrou).
Curioso é que há portugueses que vêm ao restaurante desde que abriu portas e, contou-nos Stefania, uma das famílias que os visita regularmente foi entretanto a Sardenha, uma das regiões de Itália, e quando aterrou de novo no italiano com raízes portuguesas afirmou que nem no país da cozinha mãe comeu tão bem quanto nas múltiplas visitas que faz ao Il Matriciano.
Também nós já estivemos em Itália, mais precisamente nas regiões do sul, e podemos afirmar que o Il Matriciano arruma a um canto grande parte dos restaurantes que experimentámos.
Se o restaurante terá novidades no futuro? Perguntámos à mulher do também proprietário Alessandro Lagana e, tirando algumas novas referências de vinho italiano ou pontuais pratos, não. Há sete anos que a carbonara está na carta, há sete anos que é repetido o ritual de boas vindas aos clientes e há sete que este pedaço de Itália está em Portugal e poupa-nos uma viagem para comer a verdadeira cozinha italiana.