
Com milhões de leitores conquistados por todo o mundo, Erin Doom é um fenómeno literário nascido do anonimato. A jovem italiana — que por muito tempo escondeu a sua identidade atrás deste nome — tornou-se numa das vozes mais conhecidas da literatura young adult, com romances carregados de emoção, traumas profundos e personagens que prometem ficar com o leitor muito depois da última página, com uma escrita tão detalhada que prende qualquer pessoa.
Agora, Erin Doom é Matilde (que nunca revelou o apelido), e vai estar presente na Feira do Livro de Lisboa no próximo sábado, 21 de junho. Autora dos sucessos "Fabricante de Lágrimas" e "Como Cai a Neve" e da sua mais recente obra publicada "Como Uma Cicatriz", a jovem está bastante entusiasmada para conhecer os seus leitores portugueses, e quer dar mais do que um simples cumprimento durante a sua sessão de autógrafos. "Estou muito animada, espero conseguir comunicar com eles, fazer-lhes entender o quão bonito é para mim estar aqui", começou por dizer Matilde à MAGG.
"Cada vez que me encontro com os meus leitores, vejo nos seus olhos uma espécie de distância mas, para mim, o facto de as pessoas lerem e apreciarem os livros faz com que crie uma ligação, e é isso que eu também lhes quero passar", acrescentou. E isto vem depois de uma altura em que Matilde nem sequer se dava a conhecer, uma vez que até há pouco tempo ninguém conhecia a sua identidade. "O meu medo era de me sentir julgada pelo que eu escrevia, escolhi o anonimato como uma forma de proteção. Mas, na verdade, depois descobri que aquela liberdade não me era perdida, não iria ficar sem ela se me revelasse."
Matilde decidiu fazer essa escolha depois do sucesso que foi "Fabricante de Lágrimas", uma vez que o livro conseguiu vender mais de meio milhão de exemplares. Esta é uma obra intensa que procura falar sobre temas como a dor, o abandono e a redenção, e a jovem referiu que foi o livro mais difícil que escreveu até hoje. "Foi o livro mais difícil para mim de escrever até hoje. Demorei dois anos a escrever mais oito meses de revisão, e é um pedaço importante da minha vida, foi onde eu coloquei todas as coisas que eu mais amo e me faziam sonhar mais quando era pequena", começou por dizer.
"Na personagem da Nica, que é a personagem mais estranha, eu coloquei muito de mim mesma, com todos os meus defeitos e estranhezas, coloquei todas as minhas características mais estranhas. Hoje, se calhar, não era capaz de escrever o mesmo livro, porque fui crescendo e perdi aquela espontaneidade de escrever tudo o que queria sem saber quem o iria ler. Mas é um pedaço de mim. E é muito estranho ver todo o seu sucesso", disse Matilde.
Aliás, o sucesso foi tão grande que a obra chegou mesmo a ser adaptada para um filme da Netflix. No entanto, a escritora explicou que, apesar de a produção acertar em algumas cenas, outras ficaram mais aquém, uma vez que não é possível colocar mais de 600 páginas em menos de duas horas de filme.
"Acho que para cada autor é muito difícil aceitar que a própria obra seja realizada através dos olhos de outro alguém, e, portanto, é preciso sempre chegar a um certo tipo de compromisso. Acredito que, em algumas coisas, conseguimos representar o livro, como a sonoridade. Noutras coisas, acredito que o livro foi mais aprofundado, tem muitos mais detalhes que se perderam".
E os detalhes são bastante importantes para Matilde, uma vez que são aquilo que mais a prende a qualquer obra. "Amo muito os detalhes. Eles são, na minha opinião, a coisa que nos distingue, a coisa que nos caracteriza. Nós apaixonamo-nos pelos detalhes, pelos pormenores, não pelas coisas perfeitas. Acho que são o que nos deixa únicos e, portanto, tento sempre dar essa particularidade aos meus livros", disse. Mas não são só os detalhes: aquilo que também faz Matilde apaixonar-se pela escrita é a oportunidade que tem de criar um espaço onde as impossibilidades emocionais se tornam reais, conseguindo sempre ser realista.
"Eu tento criar uma realidade em que o leitor consiga viver uma história de forma sonhadora, um pouco como fugir à nossa realidade. Ou seja, aquela relação que não viveríamos na realidade num lugar seguro, está no livro, como por exemplo em 'Fabricante de Lágrimas'. 'Como uma Cicatriz', pelo contrário, é muito mais realístico. É mais cru. Foi o último livro que escrevi e já estou mais velha, mais desiludida com a vida, então há muito mais realismo. Tento usar as duas formas", explicou.
Este último, "Como Uma Cicatriz", é o mais recente livro da autora publicado em Portugal. Aqui, o leitor fica a conhecer Mireia, uma rapariga que também já se desiludiu bastante com a vida, e que acaba por ir para Filadélfia desesperada à procura de trabalho. Lá, consegue tornar-se numa bartender, e é aí que vai conhecer Andras, o protagonista masculino que é o segurança do bar.
"É uma história forte, os dois protagonistas têm dois caráteres muito fortes. Fala de um amor muito mais difícil, digamos, do que os meus romances anteriores. É uma história para as pessoas que talvez sentem a necessidade de encontrar um milagre", disse Matilde.
Além deste, outro dos temas que a jovem escritora gosta de abordar é a esperança, o amor de uma família que nos é dada por milagre — ou, melhor, o amor de uma família que é feita depois do sangue. "Tu só te lembras do valor de uma coisa quando não a tem mais, quando a perdes. Então, na realidade, com estas minhas histórias, tento fazer entender o quanto isso é importante, o quanto os meus protagonistas precisam de milagres e de uma família e que, muitas vezes, a família encontra-se fora dos laços de sangue. São temas que, para mim, estão muito no meu coração. Porque não existe coração sem dor", acrescentou.
E estas são exatamente as sensações que Matilde quer deixar nos seus leitores. A jovem deixa claro que se não tivermos esperança, há muito que podemos não concretizar, e que há algo na vida que temos de fazer para conseguirmos conquistar tudo: sermos nós mesmos.
"A esperança está em todos os meus livros. Em momentos de verdadeira dor, é a única coisa a que nos podemos agarrar e é a única coisa que nos impede de afundar. A outra é ser nós mesmos. Dedica, instiga, diz a ti mesmo que tens coragem de simplesmente seres tu mesmo. Todas as minhas personagens são elas mesmas. São estranhas, mas são elas", disse Matilde, que acrescentou que a família é também um dos aspetos mais importantes do seu livro.
E de futuro? Por agora, Matilde vai descansar, uma vez que acabou de escrever a sequela de "Como Uma Cicatriz" (que se chamará "Arcádia"), mas garante que a sua próxima obra vai ser mesmo aquilo que sempre quis fazer. "O que eu digo há muitos anos é que quero escrever uma fantasia. É um projeto muito empolgante, porque escrever uma fantasia, que é o meu género literário preferido, eu preciso de ter muita dedicação e compaixão. Requer muito trabalho porque é todo um mundo a construir, mas é o que eu quero fazer", rematou.
Todos os livros de Matilde são publicados em Portugal pela Planeta. "Fabricante de Lágrimas" está disponível por 20,50€, e "Como Cai a Neve" e "Como Uma Cicatriz", estão ambos à venda por 19,90€. Também consegue encontrar os livros em qualquer livraria, pelo que se quer aparecer no sábado para a sessão de autógrafos com todas as suas obras, pode encontrá-las em qualquer lugar.