Daniela Santos e Isabel Ferreira conheceram-se em 2015 e, dois anos depois, começaram a pensar em constituir família antes do casamento. "A Isabel queria casar grávida”, conta Daniela à MAGG. A adoção nunca foi uma hipótese: "Nunca pensámos em adotar porque sempre achei que teríamos o mesmo direito que um casal heterossexual de passar pela gravidez, pelo parto e pela experiência da maternidade num todo."
Numa altura em que ainda não era permitido aos casais de mulheres homossexuais a procriação medicamente assistida — a lei só viria a entrar em vigor em 2017 —, Daniela, 26 anos, e Isabel, 27, fizeram duas tentativas de inseminação artificial em Espanha. Nenhuma delas foi bem-sucedida.
“Depois das tentativas em Espanha, decidimos parar um pouco e avançar com o casamento. Casámos a 15 de setembro de 2017”, conta.
Já em Portugal, na clínica Ferticentro, em Coimbra, as autoras do blogue “O Amor Vence Sempre” fizeram uma terceira inseminação, que infelizmente voltou a falhar. Mas algo estaria prestes a mudar: nessa altura, Daniela e Isabel ouviram falar pela primeira vez no método de fertilização recíproca, ou maternidade partilhada. Uma doaria os óvulos, outra receberia-os no seu útero. Além de poderem contribuir ambas para a gestação, a taxa de sucesso era maior, uma vez que o método pressupõe que o óvulo já está fecundado quando é colocado no útero da mãe gestante.
“Comecei a estimulação dos ovários em maio de 2018. Fizemos a primeira transferência de embrião em junho, que resultou num aborto às 8 semanas de gestação”, explica. “A segunda tentativa foi realizada em novembro com teste negativo e a terceira em janeiro de 2019. Soubemos que estávamos grávidas logo no final desse mês”.
Daniela deu os óvulos e Isabel recebeu-os no seu útero. A filha do casal chama-se Leonor e nasceu a 23 de setembro deste ano, o que as tornou no primeiro casal homossexual feminino a recorrer a este método com sucesso em Portugal.
A maioria dos casais de duas mulheres opta por realizar o tratamento em clínicas privadas, onde o preço ronda os seis mil euros, porque o tempo de espera no Serviço Nacional de Saúde chega a ser de um ano para os casais que não têm prioridade.
"O Serviço Nacional de Saúde tem longas filas de espera e dá prioridade a casais com problemas de fertilidade, o que não é o nosso caso", explica, acrescentando que investiram mais de 12 mil euros em tratamentos e medicação para que pudessem ter um filho.
Na altura de registar a bebé Leonor, Daniela e Isabel foram surpreendidas com o facto de não terem permissão para serem as duas mães. No registo civil e no cartão de cidadão não tiveram problemas, mas nos restantes documentos legais Isabel é a mãe e Daniela é o pai. "Infelizmente, lançam as leis mas não preparam tudo para que se evitem coisas como estas", explica Daniela, a quem foi atribuída a licença de paternidade.
Lígia e Liliana ainda estão a tentar a maternidade partilhada
Lígia Rocha, 32 anos, e Liliana Oliveira, 26, conheceram-se num bar, em 2009, porque tinham uma amiga em comum. Depois de alguns anos “não muito sérios”, decidiram assumir a relação em março de 2012 e em 2015 foram morar juntas para Alcobaça.
A diferença de idades fez com que Lígia começasse a pensar em ser mãe mais cedo do que Liliana. “Ela ainda era muito nova, mas começámos a falar sobre o assunto, sem nunca pensar muito em como poderíamos ser mães”, explica. Na altura, a maternidade partilhada não existia e a inseminação artificial não era legal em casais do mesmo sexo ou em mulheres solteiras.
A vontade de casar sempre esteve presente desde muito cedo, mas quando um casal de duas mulheres quer engravidar, há questões que se sobrepõem.“O casamento é algo que custa muito dinheiro e, infelizmente, ter um filho também. Tivemos de definir prioridades e, neste momento, a prioridade é sermos mães”, conta Liliana.
A jovem admite que, antes de Lígia aparecer na sua vida, sempre teve o sonho de fazer voluntariado em África e adotar lá uma criança. Mas com a inovação da ciência e a possibilidade de poderem ter um bebé que seja igualmente das duas, decidiram partir para o método de fertilização recíproca.
A história de Daniela e Isabel foi muito importante na altura em que realmente pensaram em constituir família: “Elas foram pioneiras e ao partilharem as suas histórias, estavam a informar muitos casais que não sabiam que a maternidade partilhada era possível”.
Em 2018, decidiram que estava na altura de pesquisar sobre quais os tratamentos disponíveis para que pudessem realizar o seu sonho. “Podemos não ser casadas, mas vivemos como se fossemos e o pedido já foi feito, em outubro do ano passado, nas Filipinas. Achávamos que aquela iria ser a última viagem antes de termos o nosso bebé”.
Também elas optaram pela Clínica Ferticentro, em Coimbra, e a 26 de dezembro do ano passado foram à primeira consulta. A primeira transferência dos ovócitos para o útero de Liliana foi realizada em abril deste ano, mas às 13 semanas de gestação descobriram que o feto estava morto.
“Ainda estamos a fazer o luto. É um processo muito complicado tanto a nível físico como psicológico”, afirma.
O casal espera fazer uma nova transferência em dezembro. Se tudo correr bem, poderão dar as boas-vindas ao primeiro filho já em 2020.