O terceiro e último dia de ModaLisboa, que se realizou este domingo, 10 de março, foi de regressos. É que Béhen, a marca criada por Joana Duarte, que tinha feito uma pausa e ficado de fora do alinhamento da edição passada, voltou para dar encanto à reta final do evento de moda da capital – e mostrar que as técnicas artesanais estão vivas e de boa saúde.
Não Te Quero. Foi assim que a criadora apelidou a coleção, cuja inspiração nasceu de um "talego muito antigo que tinha esta frase bordada", encontrado aquando do trabalho de terreno que leva a cabo no período que antecede os seus momentos de criação. E nunca o nome de uma coleção foi tão paradoxal em relação ao que sentimos por ela – porque, na verdade, é difícil de conter a vontade de fazer um enxoval com tudo aquilo que compõe o repertório da marca.
Afinal, sempre foi esse o objetivo que Joana Duarte quis atingir com a marca, que se encontra em celebrações dos seus primeiros quatro anos de existência. "Eu venho de uma família que está ligada às artes", começa por dizer, explicando que as três gerações de mulheres que a antecederam têm o hábito de bordar, uma técnica que pode ser vista em várias peças de enxoval. E é por isso que passava horas a falar desse tema com a avó. O mesmo não se pode dizer das irmãs.
"As minhas irmãs não ligavam nenhuma", enfatiza. "Eu criei o projeto para perceber como é que eu, com estas técnicas, com estes materiais, consigo apresentar isto de outra forma, para que as minhas irmãs também se identificassem", conta à MAGG. Percebemos perfeitamente – afinal, já ninguém quer uma toalha de quatro metros bordada, hoje em dia. "Os hábitos mudaram, mas, mesmo assim, tento manter algumas destas técnicas tradicionais", reitera.
Voltando à Não Te Quero. O talego "peculiar" que encontrou despertou-lhe a atenção, já que não são essas mensagens que estava habituada a encontrar. "Normalmente, as coisas dizem 'amo-te muito', 'quero-te muito', 'amizade'. E de repente cruzou-me com uma que diz 'não te quero'. E a peça era muito minuciosa, com um ponto muito miudinho", afirma, acrescentando: "Como é que alguém passou tanto tempo a fazer aquilo para dizer 'não te quero' e dar a alguém? Achei curioso".
No entanto, não descura o facto de poder haver outra versão dos factos. "Nesta altura, muitas das mulheres não sabiam escrever nem ler. Portanto, também é possível que possa ter sido copiado de outro sítio, sem saberem realmente o que é que queria dizer", continua. Mas, inspiração à parte, em que é que ela se traduz?
Então, por conta da sua veia ribatejana, Joana Duarte voltou para dar bom nome ao bordado da Glória do Ribatejo, reiventando-o, tal como manda a premissa da sua marca. Este esteve presente um bocadinho por todas as peças, desde casacos a cachecóis, passando por tops, calças e cintos. E as próprias novidades são uma reinvenção de algumas apresentadas anteriormente.
"Estamos a trabalhar nas peças que chamamos de peças core. Portanto, são fits em que já temos estado a trabalhar e que temos estado a aperfeiçoar ao longo do tempo, juntamente com técnicas que também temos a certeza que são core", avança. "Há aqui um trabalho muito grande de atelier", acrescenta, como se ainda restassem dúvidas disso.
Além de estar a levar a cabo um trabalho constante para tornar "as peças mais vestíveis", há outra missão que tem em mente: "convencer as pessoas de que há potencial nas técnicas artesanais, mas que tem é que ser pensada a forma como podem ser usadas daqui para a frente". E embora este tenha sido o primeiro desfile da marca a que assistimos, considerem-nos (mais do que) convencidos.