Ontem à noite estava a ver o “Late Late Show with James Corden” quando o apresentador lançou uma questão que não me saiu da cabeça a manhã inteira: quando é que vai parar o ódio na internet? Para alguém que todos os dias tem contacto direto com o público através das redes sociais, garanto-vos que é um tema premente — dia após dia, os ataques vão ficando cada vez mais pessoais, cruéis e, já agora, difíceis de ler devido aos erros ortográficos. Mas isso já é outra história.

Já tivemos situações de autêntico bullying digital. Houve quem mandasse uma das nossas jornalistas comprar um dildo só porque esta escreveu um artigo sobre sexo ou quem vasculhasse a vida pessoal de outra para a humilhar nas redes sociais. Tudo porque não concordavam com o tema de um determinado artigo.

Isto acontece de vez em quando. Todos os dias, porém, há emails e mensagens de ódio, que têm como único objetivo destruir quem está deste lado.

Não há qualquer tipo de controlo nestes tipo de situações exceto, claro, a possibilidade de eliminar comentários ofensivos das redes sociais. Mas um comentário apagado não é uma mentalidade mudada, por isso apaga-se um e aparecem mais 20. Ninguém está a ir ao cerne da questão, nem tão pouco a entender o que se está a passar. Nunca a pergunta de James Corden fez tanto sentido: quando é que isto vai parar?

Esta sexta-feira, falámos com Sofia Novais de Paula, uma influenciadora digital que partilhou as mensagens altamente ofensivas que recebeu de uma seguidora — sim, seguidora; sim, uma mulher.

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“Namoras, é verdade, mas já nem um filho lhe podes dar. Nem a ele, nem a homem nenhum. Infelizmente já estás velha”, escreveu-lhe através do Facebook. “Nunca na vida vais ter o prazer de saber o que é ser mãe”.

Parece que chegámos a um ponto em que já ninguém tem paciência para falar em feminismo. Já ninguém quer ouvir falar nas mulheres que continuam a ganhar menos do que os homens, a ouvir piropos porcos na rua ou a serem pressionadas para escolher entre a sua vida pessoal e profissional. Já tanto se disse sobre o assunto, algumas coisas até já começaram a mudar, não é verdade? Não vamos bater mais no ceguinho, deixam lá de se vitimizar, mulheres. Já ninguém tem paciência para vos ouvir.

Eu entendo que algumas pessoas possam sentir que ultimamente não se fala noutra coisa. Mas eu pergunto-me se é possível falar noutra coisa. Porque nós falamos, falamos e falamos, e continua a haver pessoas — mulheres, realço mais uma vez — a deixarem este tipo de comentários. Pior, ainda há uma leitora — mais uma vez, uma mulher — que comenta o artigo dizendo "Quando se dizem verdades, nunca se gosta...".

Nunca, em momento algum, um homem receberia uma mensagem como a que Sofia Novais de Paula recebeu. Mas o mais triste ainda é que nunca, em momento algum, alguém comentaria uma coisa destas se de facto a notícia fosse sobre um homem. Posso garantir-vos isso porque até nos artigos que publicamos todos os dias se nota isso: os comentários depreciativos são muito mais frequentes quando escrevemos sobre mulheres. E o mais triste? Na grande maioria das vezes, vêm de mulheres.

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Hoje de manhã, perguntava-me quando é que me iria parar o ódio na internet. À tarde, a minha questão passou a ser quando é que vai parar o ódio contra as mulheres. Contra as gordas e as magras, as altas e as baixas, as que deixaram de trabalhar para ficar a cuidar dos filhos e as que decidiram que não queriam ser mães. Contra as que falam abertamente sobre sexo e as que nem sequer tocam no assunto, contra as que usam um minissaia e as que andam sempre de calças.

Não me digam que já não têm paciência para ouvir falar nas lutas das mulheres. Todos os dias perdemos. E nem com o nosso género podemos contar.

Esta semana, ouvimos três jovens e três eurodeputados para tentar responder à pergunta "Porque é que os jovens não querem saber de política?". Eles batem recordes de abstenção, são acusados de ser egoístas e mimados mas defendem-se dizendo que a comunicação não é feita para eles. Vale a pena ler. Analisamos também um estudo que diz que a pílula pode causar sintomas depressivos. É mesmo assim? Um especialista esclarece todas as dúvidas.

Há mais. Os millennials estão sozinhos e deprimidos e há 11 razões que ajudam a explicar o porquê. E porque a ModaLisboa já começou, mostramos-lhe ainda o que pode comprar no Wonder Room e tudo o que pode fazer sem convite.

Qualquer dúvida, questão, comentário ou até uma palavra de simpatia — hoje mais do que nunca precisamos (todos) disso —, estou por aqui. Até para a semana.