"Psicólogos recebem cada vez mais crianças com ansiedade provocada pelo clima". É este o título do "Diário de Notícias", mas podia ser da BCC, do "Le Monde" ou do "El País".
Felizmente, as preocupações ambientais não veem fronteiras, até porque finalmente percebemos que as alterações climáticas também não. Se as inundações eram coisa para fazer parte de um cenário das Filipinas, agora o perigo está numas férias em Veneza ou numa ida a Alcântara. E ainda que seja comovente vermos koalas a morrer na Austrália, serve apenas de lembrete para os quase 500 cadáveres de animais mortos pelo fogo durante os incêndios de Pedrógão.
Nós, adultos, acordámos tarde para a realidade. Mas as crianças, felizmente, qual tofu marinado, absorvem tudo o que se passa à volta. De bom e de mal. E se ficam ansiosas com a inconsciência de quem lhes deixou este planetazinho cada vez menos verde, ainda bem.
Não quero pôr aqui em causa o que são distúrbios psicológicos, depressões e ansiedades. Nem quero que quem sofra disso desvalorize os sintomas. Mas ficar ansioso porque de facto fizemos merda e agora estamos a lidar com as consequências? Desculpem, mas parece-me só a pessoa a ser pessoa.
Quando um dia viajei sem bilhete de metro e fui apanhada pelos fiscais? Yep, fiquei ansiosa porque, de facto, fiz merda e paguei uns 150€ de consequência. Quando estacionei num sítio que sabia que era só para residentes e fiquei com o carro bloqueado? Mais uma vez, ansiosa. E zangada também, que lá foram mais 100€ à vida por uns cinco-minutos-que-eu-só-vou-ali-ao-supermercado.
É por isso que não me parece estranho que algumas crianças fiquem, de facto, ansiosas com o facto de as alterações climáticas terem sido responsáveis pela morte de 1.200 pessoas na África Oriental e Meridional. Ou que fiquem a pensar no que será um 2050, no qual haverá mais plástico do que peixe nos oceanos. O que acho estranho é que os adultos não fiquem.
Passei esta manhã numa festa de Natal de uma escola — não perguntem, continuem só a ler. Nesta época esperamos pinheirinhos a brilhar, estrelas a guiar o menino e que lindo que está, certo? Claro que as músicas tinham isso tudo mas sempre com um twist ecológico. Até o "I'm dreaming of a white Christmas" passou a um "I'm dreaming of a green Christmas", intercalado com mensagens aos pais para ofereçam prendas que receberam e não gostaram, para fazerem presentes caseiros, para pouparem nos embrulhos e para que, no limite, deitem o papel de embrulho no ecoponto certo.
Nessa mesma escola, já não há papel de tabuleiro na cantina para evitar o desperdício e não é autorizado o uso de garrafas de plástico. Nessa escola também já há uma miúda a 8 anos que diz ter deixado de comer Nutella por ser responsável pelas mortes de orangotangos. Fact check: não será assim uma relação tão direta, mas a verdade é que a produção do óleo de palma, matéria-prima da Nutella, leva à desflorestação da Indonésia e da Malásia, habitat destes animais.
Mas muni-me dos professores e pais em meu redor para mais depoimentos. A minha tia, educadora de infância, garante que quando vai com os miúdos na rua, são eles que apontam para os adultos que deitam o lixo no chão. "Ainda hoje viram uma lata de sumo e disseram logo que devia ir para o ecoponto amarelo e que as pessoas não têm cuidado", conta à MAGG.
A minha mãe já tem alunos que decidiram que a partir de 2020 serão vegetarianos — o que, no Minho, é o equivalente a tentar comer tofu numa churrasqueira.
Amigas garantem que têm os filhos a apanhar o lixo das praias e das ruas, e que com quatro anos não deitam nada no ecoponto sem se certificarem que é o certo.
Por isso é que digo: crianças com eco ansiedade? Ansiosa estou eu que sejam elas a mandar neste mundo.