"Você é rijo, você aguenta!", disse uma senhora de idade a António Costa, naquele célebre passeio pelas ruas do Peso da Régua, onde decorreram as comemorações do Dia de Portugal, e que incluiu trocas de galhardetes, cartazes de gosto duvidoso e uma certeza: o Portugal que não é sexy gosta de políticos como António Costa. Rijos.

António Costa no Peso da Régua, nas comemorações do 10 de Junho
António Costa no Peso da Régua, nas comemorações do 10 de Junho António Costa no Peso da Régua, nas comemorações do 10 de Junho créditos: Instagram

E, já que falamos de rijeza, falemos Pedro Nuno Santos. O ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação, que se demitiu em dezembro de 2022, regressou ao Parlamento para uma dupla atuação – peço desculpa, audição. Emagreceu, está mais atlético, com ar descansado, e com mais tempo para não perder a paciência. O tema continua a ser a TAP, que o fez tombar e o remeteu para um exílio forçado (temporário até quando?), mas a exaustão com o assunto, que virou um verdadeiro folhetim de guião estafado e repetitivo (que, tal como as novelas, só teve piada nos primeiros 110 episódios) faz-nos (faz-me?) concentrar noutro aspeto.

A forma. Não menosprezo a capacidade dos portugueses de discernirem o bom do mau mas creio que, quando chega a altura de votar, se vota pouco com a razão e mais com a emoção. Com a empatia. E Pedro Nuno Santos retemperou-se para regressar ao Parlamento empático q.b.. Uma espécie de bulldozer fofinho, com voz de trovão mas que vai dizendo umas coisas com graça, falando enfaticamente, com as mãos, com energia e polvilhando as suas explicações com reconhecimento de culpas e pedidos de desculpa. E o que é que as explicações sobre um tema que não vai ser resolvido nem agora nem nunca interessam se a forma satisfaz? Se, ao ouvirmos, não com demasiada atenção, Pedro Nuno Santos, ficamos com a sensação que ele é um gajo que faz coisas. E isso dá tesão. E uso esta palavra mais coloquial aqui, não no sentido sexual, mas no vital. O que é que nos estimula? Alguém que decida. Que faça. Que avance, mesmo que erre, que não esteja parado a pensar se deve fazer ou dizer. Alguém que tome decisões ou as queira muito tomar, mesmo que, depois, pareça que não as tomou porque não o deixaram. E Pedro Nuno Santos é muito isso. Um político com tesão por fazer.

E se há uma semana Pedro Nuno Santos se autoelogiou (para regozijo um pouco patético de certos comentadeiros, que o abominam por não ser um arrumadinho do eixo Lisboa-Cascais), esta quinta-feira, 15 de junho, veio mais explicativo, mais conversador, menos 'eu' e mais 'nós'. Ao contrário de João Galamba, que devia estar a cravar as unhas nas mãos para não se descontrolar, Pedro Nuno Santos surgiu descontraído, a falar com o corpo todo, o tom de voz fluido, a deixar de vez em quando vir ao de cima o sotaque da Beira Litoral, que ele sabe que importa e que o coloca numa posição de privilégio em termos eleitorais, numa região muito importante para o País e que se sente subrepresentada, entalada entre os interesses do Porto e o centralismo de Lisboa. 

O ex-ministro e potencial próximo primeiro-ministro (alguém consegue vislumbrar um outro candidato neste País, além de Pedro Passos Coelho, que é ansiado pelo PSD mas que não me parece querer voltar a entrar nessa máquina trituradora de almas que é São Bento?) é o equivalente ao marido ou namorado que, sem que ninguém lhe peça, arregaça as mangas e troca a lâmpada fundida que está no hall de entrada ou monta aquele móvel do IKEA sem dizer 500 asneiras ou beber 10 minis. Visão machista? É verdade. Mas a política, aqui e no Mundo, ainda é assim, profundamente machista e patriarcal, não perdoa fragilidades e está assente nessa ideia viril de força.

Pedro Nuno Santos
Pedro Nuno Santos Pedro Nuno Santos na audição da Comissão Parlamentar de Inquérito à Tutela Política da Gestão da TAP, esta quinta-feira, 15 de junho

E tudo isto até podia parecer uma opinião deslumbrada com Pedro Nuno Santos. Mas é exatamente o contrário. Há um esvaziamento completo de conteúdo na política e nos políticos portugueses. O que nós deveríamos ter eram Servos do Povo, pessoas que executavam o seu trabalho de forma digna e discreta, sem que tivéssemos de passar todas as semanas a pensar neles, se estão a portar-se bem ou a portar-se mal. Os políticos ideais seriam aqueles que não se fazem notar a não ser quando deixam os seus cargos, de preferência no final dos mandatos. Mas não é o que temos, nem sei sequer se é isso que queremos, na nossa orfandade por líderes de punho firme e voz de trovão. Enquanto não olharmos os políticos como nossos pares, enquanto não lhes exigirmos explicações pelo trabalho do dia a dia (e isso passaria por exigirmos critérios mais rigorosos nas escolhas dos representantes para os círculos eleitorais), o que vamos continuar a ter é isto. Tesão, que inevitavelmente acaba em desilusão.