“Este post irá muito provavelmente originar títulos sensacionalistas que levam as pessoas a clicar em notícias tendenciosas. Mas já ganhei uma armadura rija o suficiente para não deixar que isso me afete, e muito menos que me proíba de falar com o meu público sobre assuntos que considero importantes. Por baixo deste vestidos estão três cintas. Três cintas e um body a tentar disfarçar a minha barriga indisfarçável. Já perdi conta da quantidade de vezes que me dão prioridade nas filas e que me põem a mão na barriga a perguntar se é menino ou menina. Aprendi a lidar com isso, a operação que terei de fazer obrigar-me-á a ficar em repouso pelo menos três semanas e não estou preparada para ficar sem pegar nos meus filhos.”
Começa assim o longo texto que Carolina Deslandes partilhou com os seus seguidores no Instagram, aquele que acompanha uma fotografia em que aparece no novo programa da RTP1, em que faz parte do painel de jurados, “La Banda”.
O problema que levará Carolina Deslandes ao bloco operatório chama-se diástase abdominal e está longe de ser só seu. É um problema que, de forma mais ou menos evidente, é comum, não só a quem sofre de obesidade ou excesso de peso, como a todas as mulheres que acabaram de ser mães. “Na gravidez acontece sempre”, explica à MAGG Ana Silva Guerra, cirurgiã plástica. Mas do que se trata, afinal? E, se todas têm, como é que há mães que recuperam tão rápido e outras que demoram mais tempo?
O nome é esquisito, mas é fácil perceber aquilo que acontece. Basta imaginar uma barriga tonificada, daquelas com quadradinhos definidos — o amigo six pack, a zona a que clinicamente se chama de reto abdominal. O que na diástase acontece é que, devido ao enfraquecimento dos tecidos da parede abdominal — para os quais uma gravidez, o excesso de gordura e a obesidade contribuem —, dá-se um afastamento das duas partes destes músculos da barriga, formando-se uma espécie de barreira entre eles. O resultado é uma barriga mais flácida, porque o conteúdo abdominal, onde se insere a gordura, fica mais exposto.
Com o crescimento da barriga na gravidez, é natural que isto surja. “Mesmo que seja uma mulher que quase não aumentou de peso, acontece sempre, porque basta que a parede abdominal se afaste.”
Mas nem todas as diástases são iguais, sendo que a gravidade se mede através da distância que é criada entre os músculos. Quanto maior, pior. Aquilo que determina se ela será maior ou menor relaciona-se com uma série de fatores. Num contexto de gravidez — porque a diástase não é um problema exclusivo de quem está em processo pós-parto ou sequer do sexo feminino — o aumento do peso, o tamanho e número de fetos são causas que podem fazer crescer ou decrescer esta barreira entre os músculos, uma vez que são fatores que aumentam a pressão intra-abdominal e o estiramento das paredes desta parte do corpo.
“Quanto maior o aumento de volume, pior”, diz a cirurgiã, que salienta, por este motivo, que pessoas com excesso de peso e obesidade são muito suscetíveis de ter o mesmo problema. “E nas gravidezes em que há mais do que um bebé também se torna maior [a probabilidade].”
Apesar de só se “resolver cirurgicamente” — porque o tecido fica entre os músculos não tem, como eles, elasticidade ou capacidade para crescer ou decrescer — nem todas as mulheres com diástase terão de recorrer a uma intervenção tão invasiva. ”Nos casos mais leves, a mulher pode viver assim. Perder peso é uma solução: se reduzirmos o volume intra-abdominal, não se vê tanto, porque não há tanto conteúdo abdominal [onde se inclui a gordura] saliente.”
O exercício físico e a fisioterapia são uma ótima ajuda. “Numa gravidez de uma mulher magra, que tem uma diástase de quatro dedos, ela depois no pós-parto, se fizer exercícios físicos, com reforço muscular, consegue viver com esse pequeno afastamento, porque os músculos compensam”, explica a médica.
Só que também há casos mais graves em que esta zona central da barriga se torna demasiado flácida, quase deformada. Aqui, as soluções fora do bloco operatório (não pode acontecer logo depois de dar à luz) tornam-se ineficazes.
Catarina Macedo Ferreira, 32 anos, fotógrafa e autora de "Ties", usa tanto esta página como a sua conta de Instagram como uma espécie de diário, onde partilha a vida em família, o trabalho, os desafios do dia a dia. Em março de 2017 passou pelo mesmo difícil processo pelo qual Deslandes irá passar, aquele que foi relatando em vários posts do blogue.
O problema, conta, foi-se tornando maior de filho para filho. “Quando tinha barriga por causa da diástase, sentia-me mal comigo e pior ainda pela pressão de todos. Tantas pessoas que já tinham tido bebé e estavam ótimas e eu ali”, diz à MAGG.
Catarina foi operada. A cirurgia, uma abdominoplastia, reservada para casos mais graves, em que o exercício ou a fisioterapia já não são eficazes, passa pela remoção de uma parte da linha branca, a que fica entre os músculos do reto abdominal, e a reaproximação dos mesmos. Não é uma operação para emagrecer, atenção, ainda que os ponteiros possam decrescer. Catarina Macedo Ferreira relata que perdeu quatro quilos de barriga e um de pele.
O doloroso pós-operatório valeu a pena. A fotógrafa não podia estar mais feliz com o resultado: “Sinto-me fantástica. O meu corpo antes da operação em termos funcionais era quase o equivalente ao de uma mulher de 60 anos. Agora sinto-me uma miúda outra vez. Posso treinar e tenho uma figura mais harmoniosa, que me devolveu a confiança que talvez nunca tenha tido.”
Ana Silva Guerra diz que não há grandes perigos associados a esta condição, exceto no que se refere ao aparecimento e ao crescimento de hérnias umbilicais, que provocam dores e condicionam a mobilidade. Além disto, a barriga fica mais fraca e frágil, porque não tem músculo a protegê-la. Por outro lado, esta condição associa-se ao excesso de peso, na origem de vários problemas de saúde, desde os cardiovasculares à diabetes. Esteticamente, no pior dos casos, dá-se uma deformação muito acentuada nesta zona do corpo.
A prevenção aqui é fundamental. Para isso, além da alimentação, existe o exercício físico, crucial para uma massa muscular forte e para um índice de gordura corporal dentro dos valores certos. E mais do que no pré e pós-parto, deve ser um hábito do quotidiano, para a vida toda.