Fundada há 15 anos, a Clínica Hugo Madeira, em Lisboa, não é o típico consultório de dentista. Respira-se calma, serenidade e boa disposição, e a sala de estar, com sofás confortáveis onde apetece ficar a beber um café, mais parece a de um centro de wellness.

O médico dentista de 38 anos é presença assídua no programa das manhãs da SIC "Casa Feliz" onde ajuda pessoas que, pelos mais variados motivos de saúde, ficaram com a dentição gravemente danificada. Durante a visita guiada à clínica da qual é CEO, em Lisboa, Hugo Madeira, que é também responsável pelo departamento de cirurgia, vai-nos mostrando os espaços onde a sua equipa trabalha.

Desde as salas onde é feita a higiene oral GBT (Terapia Guiada por Biofilme), um espaço mais humanizado, com cadeiras cor de rosa e longe da imagem por vezes amedrontadora que temos do dentista, até aos gabinetes onde são analisados ao computador os casos de implantes (e onde a tecnologia permite não só acompanhar a evolução de um paciente como também prever como vai ficar uma dentição após uma intervenção), passando por espaços onde são fabricados os implantes e, no último piso, a área da medicina integrativa, onde há uma abordagem 360º, desde a psicologia à consulta do sono, passando pelo life coaching.

Hugo Madeira, fotografado na sala de higiene oral da Clínica Hugo Madeira
Hugo Madeira, fotografado na sala de higiene oral da Clínica Hugo Madeira Hugo Madeira, fotografado na sala de higiene oral da Clínica Hugo Madeira créditos: Rita Almeida / MAGG

A Clínica Hugo Madeira recebe pacientes de várias nacionalidades e também emigrantes a viver no estrangeiro. "Somos conhecidos por termos uma medicina dentária de excelência. Aliando isso ao facto de as pessoas pensarem, um dia, voltar a Portugal. Como hoje em dia conseguimos condensar bem os tratamentos, um paciente, mesmo que faça uma grande reabilitação, consegue fazê-lo em duas, três viagens ou, se estiver cá, em duas, três semanas. Também temos muitos estrangeiros a virem de propósito cá, maioritariamente da Europa mas também dos Estados Unidos, onde os tratamentos são muito caros", revela o médico dentista.

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Quando e como escolheu ser dentista?
Foi uma coisa muito natural. Desde pequeno que dizia que queria ser dentista. Acabei por passar uma grande parte da minha infância e adolescência no dentista. Tinha os dentes muito tortos, quando era mais criança tinha um dos dentes centrais completamente negro. Enquanto criança, sofri muito dos dentes e acabei por ser um caso de sucesso ao longo deste tempo.

Essa sua experiência foi boa ou má? Porque a sua filosofia de trabalho é muito focada no conforto do paciente. 
As minhas experiências foram muito boas, por isso é que me inspiraram. Eu quis recriar isso, mas à minha maneira. Sinto-me completamente no meu playground quando estou na clínica, quando estou a fazer cirurgia, quando estou com pacientes. Sinto que a minha missão é tentar acrescentar algo à vida daquela pessoa.

Quando começou a sua formação, teve a certeza absoluta que era o que queria?
Sempre tive, mesmo durante o curso, a certeza que era aquilo. Claro que é uma área muito vasta e, hoje em dia, pode ser-se dentista de muitas especialidades diferentes. No início, queria ser ortodontista, devido à minha história com os aparelhos. Mas rapidamente percebi que me identificava mais com as mudanças a nível da reabilitação oral. Pacientes com grande falta de dentes, com dentes muitos desgastados, era isso que me fascinava.

O Hugo abriu esta clínica com apenas 25 anos. Como é que se dá esse passo tão cedo na carreira?
Eu trabalhava noutras clínicas, fazia aquilo que eu gostava, que era reabilitação, mas há 15 anos não me identificava com as clínicas onde trabalhava. Gostava do que fazia mas, em termos de experiência do paciente, ambiente, decoração, sentia que não era eu e isso estava a desgastar-me muito. Foi dessa forma que me lancei. Abri uma clínica muito pequenina na Charneca da Caparica, de onde é a minha mãe e, mais tarde, aos 27 anos, abri a primeira clínica em Lisboa, no Lx Factory. Eu estava tão farto de clínicas convencionais, do típico consultório entre quatro paredes fechadas, que queria projetos mais ambiciosos e provocadores. Foi assim que viemos para o Lx Factory fazer uma clínica em que os gabinetes eram cubos em acrílico, só com cortinados. Era muito engraçado.

Hugo Madeira, médico dentista
Hugo Madeira, médico dentista Hugo Madeira, médico dentista créditos: Rita Almeida / MAGG

De que forma é que se concilia o lado de empresário com a profissão de dentista?
É um desafio que é necessário assumir quando se tem uma estrutura destas, pesada mas, ao mesmo tempo, ágil. Tenho pessoas comigo em que confio plenamente. Sou aquele CEO que delega e que tem ao seu lado as pessoas certas. Isso permite-me dedicar-me às consultas com os doentes, aos meus colegas médicos. É muito importante, para mim, ter a leveza de cabeça para poder estar a passar a minha energia às pessoas lá em baixo. Tento que seja apenas 30% do meu tempo dedicado à parte da gestão.

"A forma de combatermos muitas doenças, principalmente inflamatórias e crónicas, é mantendo uma boa saúde oral"

O que é que mudou, em termos de tendências, nesta área? O que é que era muito usado e falado há 10 anos e não o é agora?
Há 10, 15 anos, a estética era a bandeira, era o que trazia as pessoas ao dentista. Hoje, felizmente, as pessoas não estão tão fanáticas por quererem colocar facetas nos dentes todos, por quererem mudar tudo o que têm. Felizmente, as pessoas têm um bocadinho mais de respeito pelo seu corpo. Devido a esse ganhar de consciência, o que hoje está mais em cima da mesa é, sem dúvida, uma medicina dentária mais consciente, mais biológica, mais integrativa. As pessoas querem saber que materiais são utilizados no seu tratamento, que impacto é que pode ter na sua saúde. De certa forma, como a nossa alimentação tem vindo a mudar.

Estamos a falar de pacientes que são um microcosmos, que não reflete a realidade do País. A sua participação no "Casa Feliz", por exemplo, as pessoas que ajuda, reflete uma realidade que é mais representativa do que se passa em Portugal. Acha que está a ser feito pouco para promover a saúde oral nos cuidados primários?
É feito mais do que há uns anos, já se notam algumas iniciativas como o cheque-dentista, como médicos dentistas em alguns centros de saúde... Alguma coisa já mudou, mas acho que faz falta mais educação para a saúde oral. Incutir rotinas básicas de higiene que as pessoas não têm. Como usar o fio dentário, como fazer a escovagem. São os maiores aliados da nossa saúde oral, que podem prevenir doenças, idas ao dentista. E muitas vezes não se investe nisso porque nos preocupamos mais com o tratamento em vez do que com a prevenção. Acredito que há muito a fazer e que precisamos de mais iniciativas.

Em relação ao "Casa Feliz", acaba por ser uma janela para mostrarmos ao País e ao mundo o que pode ser feito ao nível da medicina dentária. Tenho colegas a agradecerem-me, a dizerem que tiveram pacientes que os procuraram porque viram um caso meu no "Casa Feliz" e gostaram do resultado. É algo que ajuda não só a nossa clínica como o País inteiro.

Também é uma forma de chamarmos a atenção para métodos e dicas, o tipo de escova certa, a pasta certa. Mesmo à distância, através das redes sociais ou da televisão, podemos ajudar as pessoas a melhorar a sua qualidade de vida e os seus hábitos.

Cuidar dos dentes continua a ser visto como um luxo, no sentido em que continua a ser o que as pessoas deixam para último?
Faz muitas vezes parte da educação. Se eu for ensinado em casa a escovar os dentes pelo menos duas vezes por dia e que devo usar determinadas técnicas, que tenho de cuidar dos meus dentes como cuido do meu corpo, isso vai mudar qualquer coisa na minha vida. Muitas vezes as pessoa dizem, 'ah, é tão caro ir ao dentista, eu já não tenho alguns dentes e tenho cáries', mas depois não escovam os dentes corretamente. Se tivesse prevenido, que era barato, não chegava a ter de fazer investimentos mais tarde, ou a ter de ficar com um sorriso degradado, o que vai degradar a sua saúde geral.

Que problemas de saúde podem advir de uma boca maltratada?
Tudo o que está na nossa boca acaba por entrar no nosso corpo. Se eu tenho bactérias que são patogénicas, se tenho uma gengiva inflamada, se tenho um quisto dentário, essas bactérias vão entrar na nossa corrente sanguínea e podem causar um problema num órgão como o coração, pulmões, cérebro. A forma de combatermos muitas doenças, principalmente inflamatórias e crónicas, é mantendo uma boa saúde oral, sem lesões, sem quistos, sem gengivas inflamadas para garantirmos que temos uma saúde minimamente estável.

"Os médicos têm de sair fora das suas bolhas"

Na sua clínica tem consulta do sono e também psicologia. Tudo isto está relacionado com os dentes?
Sim. Se não dormimos bem, a nossa saúde não está bem. E não dormimos bem porquê? Porque não respiramos bem, porque  somos respiradores orais. Um respirador oral é uma pessoa que não respira pelo nariz e, muitas vezes, tem uma posição inadequada do maxilar, ou tem bruxismo, ou um problema articular entre a maxila e a mandíbula. Ou seja, muitos problemas de sono podem ser resolvidos através dos dentes. Ou através de aparelhos dentários, da ortodontia, ou outro tipo de dispositivos que podem ajudar a colocar a boca numa posição que torne a via aérea mais aberta e permita que a pessoa respire e durma melhor.

Já teve casos desses, em que o sono da pessoa melhorou por causa dos dentes?
Todas as semanas. É uma área que está completamente ligada à medicina dentária. Muitas vezes, os otorrinolaringologistas reencaminham diretamente para o dentista. É uma ligação entre duas especialidades que eu acredito que é chave de ouro na medicina hoje em dia. Os médicos têm de se unir, têm de sair fora das suas bolhas. Unidos, vamos promover um melhor estado de saúde geral para o paciente.

Quando é que se diz 'não' a um paciente? Já lhe aconteceu dizer 'não' a uma pessoa que quer mudar tudo na sua dentição por questões estéticas, de falta de autoestima?
Por isso é que temos psicólogos e psiquiatras a trabalhar connosco. Mas, muitas vezes, nem preciso de outro colega para poder indicar que aquele paciente não deve fazer um tratamento. Há pedidos que são completamente surreais. Uma coisa é a pessoa querer ficar com os dentes mais brancos, com outro tipo de formato, está tudo certo. Se a pessoa tem uma certa distorção da sua própria imagem, nunca vai gostar do sorriso que tem, tal como não gosta da cara, do pé ou do braço. E aí é um perigo se nós começamos um tratamento com uma pessoa que não está bem. Por vezes, tenho de passar para os nossos especialistas mas outras vezes consigo eu dizer à pessoa que o mais indicado é investirmos na saúde, tentarmos encontrar o equilíbrio e depois, sim, pensar em fazer um tratamento.

Não diria que acontece muito, mas acontece às pessoas que fazem intervenções estéticas na cara. Já tive um ou outro caso em que os pacientes tiveram uma distorção da própria imagem e quase que tiveram depressões com os resultados. Às vezes, quando cortamos o cabelo, ficamos alguns dias a enquadrar aquela imagem, se mudamos completamente a estética do nosso sorriso, pode haver um perigo, se não estamos bem cientes do que vai acontecer. Hoje em dia, com todos os projetos e ensaios que fazemos antes de começar, é algo que é muito difícil de acontecer porque o nosso objetivo está definido à partida e conseguimos testá-lo.

Qual é o impacto das redes sociais nos pedidos dos pacientes que vos chegam à clínica?
Eu diria que é mais uma janela que temos para o mundo. É a possibilidade de termos a nossa galeria de sorrisos exposta para toda a gente ver. Isso acaba por inspirar as pessoas quando querem mudar o seu sorriso. Para mim, as redes sociais sempre foram importantes. Foi uma onda que eu surfei desde o início, quando ainda era orgânico e que eu acho que me deu um boost muito grande quando comecei com a minha primeira clínica. Foi o que me ajudou a crescer mais rapidamente. Hoje em dia, é um canal aberto que temos com as pessoas, é uma forma de os pacientes chegarem até nós, ter uma receção online, de tirar dúvidas após uma consulta. Ou seja, humaniza muito a nossa prática clínica diária. Não só para pacientes como para colegas. Acabamos por nos tornar uma referência para os que nos rodeiam. E passamos a história da nossa marca, da nossa casa.

A nova área de medicina integrativa está já em funcionamento no último andar da clínica.  O que é medicina integrativa?
O nome acaba por ser um bocadinho comercial porque toda a medicina deve ser integrativa. Às vezes nós é que nos esquecemos disso. O nosso grande objetivo, com esta área, é poder fazer tratamentos complementares à medicina dentária que vão melhorar o pós-operatório dos pacientes e os nossos resultados. Estamos num momento de transição da medicina dentária mais focada na boca, a abrir os horizontes para o resto do organismo. Nas nossas primeiras consultas, hoje em dia, já são mais alargadas. Já queremos saber do estilo de vida do paciente, como está a sua saúde geral, a sua saúde emocional, a psicológica. Este piso vem reafirmar como é que vamos poder tratar os nossos pacientes.

Quando os pacientes entram na vossa clínica, a ideia é começarem por esta área?
O paciente tem de nos dar abertura para esta abordagem mais abrangente. Há pessoas que pretendem tratar apenas do sorriso. Há pessoas que se querem entregar de uma outra forma, e este piso está aberto a isso. Um paciente que faça um tratamento mais profundo, nós sugerimos que seja acompanhado por outras áreas. Por exemplo, uma cirurgia de implantes com alguma extensão implica um compromisso grande do paciente e um bom estado de saúde geral. Se um paciente diz que "só" tem uma periodontite e que está muito bem de saúde mas está a perder os dentes, então não está bem de saúde. Temos de ir ver o que se está a passar. Os médicos que aqui temos vão estudar o que se passa com o paciente. Muitas vezes até com análises genéticas, do microbioma da boca. Tentamos estudar o paciente como um todo nesta área.

Hugo Madeira, médico dentista
Hugo Madeira, médico dentista Hugo Madeira, médico dentista créditos: Rita Almeida / MAGG

Imagine que eu não tenho num problema de saúde oral, mas tenho medo de ir ao dentista e venho à sua clínica. O que é que eu posso fazer perder esse medo?
Primeiro, pode começar por fazer uma higiene oral. Nós temos uma higiene oral que acaba por dar aos pacientes uma experiência muito confortável. Dizemos que é uma experiência ao mesmo tempo feliz e educativa. É um tipo de consulta em que há uma conversa com o paciente para perceber como é a sua higiene oral. Depois, aplicamos um corante nos dentes para perceber onde há mais placa bacteriana e onde é que o paciente tem de insistir mais na escovagem diária em casa e, depois, trabalhamos com jacto de eritrol, que acaba por fazer toda a remoção da placa bacteriana e tártaro. Tentamos, acima de tudo, fazer uma experiência muito suave para que o paciente não sinta qualquer tipo de dor e desconforto e possa voltar as vezes que quiser.

Fotos: Rita Almeida / MAGG