Por mais que se troquem mensagens em janelas de chat, por mais gostos que caiam em cada fotografia de Instagram ou por mais emojis que preencham as caixas de comentários das publicações, nada substitui um fator fundamental para mantermos a sensação de solidão longe: o contacto pessoal, cara a cara.
A solidão tem efeitos realmente negativos. É isso que comprova um estudo, publicado em dezembro de 2018, no jornal "Cambridge University", que analisou os níveis de solidão ao longo da vida adulta: partindo da análise de dados de 340 adultos, os resultados revelam que "a solidão correlacionou-se com uma pior saúde mental" — e mesmo numa situação de isolamento moderado, as conclusões apontam um pior funcionamento físico e mental.
Estamos mais sós, apesar de nunca estarmos sozinhos. Estamos mais carentes, apesar de estarmos sempre rodeados de pessoas, presencial ou virtualmente. O carinho das vivências interpessoais e reais é uma nova necessidade. Como colmatá-la? Ironias da vida: através daquilo que nos isolou — ou seja, através de aplicações online que permitem a "compra" ou o aluguer de amigos.
A ideia tornou-se popular no Japão, país onde o aluguer de amigos — e de afetos — é uma prática relativamente comum. A ideia é que a pessoa que solicita o serviço se sinta menos só. E o espectro de requisitos é largo. Por exemplo: pode pagar a uma pessoa para ir com o utilizador da aplicação a um casamento, a um funeral, a dar um passeio ou a aventurar-se numa experiência.
As apps para alugar amigos já não estão só no Japão
Do Japão, o conceito desta espécie de compra de amigos — sem cariz sexual — seguiu viagem rumo à América e ganhou forma em diferentes aplicações. Uma delas é a The People Walker, criada pelo ator Chuck McCarthy em 2016, em Los Angeles, na Califórnia. Chuck percebeu que o seu negócio era uma resposta às empresas que ganham milhares de euros a tornar as pessoas mais solitárias — é o caso das redes sociais, dos videojogos, das compras online e dos serviços de streaming, como a Netflix ou o Spotify.
Com esta app, basta gastar entre 7€ a 19€ para ter a companhia de um dos membros da equipa num passeio, cujo objetivo pode ir além de uma simples conversa: o "caminhante" pode também dar conselhos ou motivação e, juntos, podem ainda explorar novos sítios, transformando o passeio num momento de turismo. No fundo, seja qual for a necessidade, para qualquer utilizador que se aventure a "comprar" um amigo na aplicação, o passeio vai ser uma nova experiência.
Há muitas pessoas disponíveis para umas horas de conversa ou para dar abraços de conforto. No caso da The People Walker, o processo começa com uma solicitação dos utilizadores e posteriormente pela verificação dos registos criminais. Os requisitos para garantir a segurança do encontro passam ainda pelo controlo do local onde decorre o passeio.
Além de comprar, é possível alugar amigos. A Rent a Friend é uma espécie de Tinder para amigos. Surgiu há dez anos nos Estados Unidos e foi fundada por Scott Rosenbaum, que se inspirou nos serviços do género japoneses. O objetivo é semelhante ao da aplicação anterior. Por um valor que varia entre 9€ a 45€ por hora, tem vários serviços disponíveis. Pode, por exemplo, alugar um amigo para ir consigo ao ginásio — já que sozinho não tem motivação e contratar um treinador pessoal fica fora do seu orçamento. Se treinar durante uma hora for suficiente, só tem de pagar esse valor ao membro da equipa da Rent a Friend e a sessão de ginásio torna-se num dois em um: tem companhia e fica em forma porque o treino foi mais eficaz.
Mas não é só para o bem que os amigos estão lá. Há quem solicite companhia para ir a um funeral, por exemplo. Nesta aplicação, o processo começa com uma conversa: depois de se tornar membro, pode mandar uma mensagem em anónimo a qualquer amigo da plataforma para discutir o seu plano. Depois, há regras a seguir. O encontro tem de ser feito num local público, não pode haver contacto físico, tem de ter o telemóvel na mão, contar a um desconhecido onde estará com o amigo da aplicação e tem de dizer a que horas prevê que acabe o encontro.
Em Portugal, está disponível um serviço semelhante, mas com algumas nuances, viradas para o turismo. Chama-se Rent a Local Friend e o processo envolve quatro passos: escolher um destino, conversar com pessoas locais para encontrar alguém que tenha os mesmos interesses, fazer uma reserva do "amigo" na aplicação e esperar que este confirme a companhia durante o passeio num determinado local. Apesar de a reserva poder ser feita com o objetivo de receber dicas virtuais durante uma hora sobre a localidade onde se encontra, a melhor forma de evitar a solidão é alugar o amigo da aplicação durante um dia, evitando que se sinta sozinho durante o passeio.