Procrastinar é aquele sentimento perverso que nos faz adiar as nossas obrigações, sem qualquer tipo de proveito ou de prazer. Mais que relacionado com preguiça, a procrastinação é fruto de um "deixa para depois" sucessivo, que nos faz viver no limite do deadline e que acontece porque estamos a fugir às sensações negativas que, na nossa cabeça, determinada tarefa nos vai fazer sentir.
Mas isto é uma armadilha da mente: quando adiamos, não só ficamos com o trabalho por fazer, como sabemos que estamos a cometer um erro. Ou seja, é uma pescadinha de rabo na boca: não cumprimos porque não queremos ficar ansiosos, ficamos ansiosos porque não cumprimos e ficamos stressados porque, com isto tudo, restou pouco tempo para as executarmos.
Enquanto no escritório estamos inseridos num ambiente de trabalho, em que conversamos com os colegas sobre as tarefas que temos para cumprir e em que estamos próximos dos nossos superiores, em casa não temos nenhum destes estímulos. Estamos rodeados dos nossos bens, temos a televisão, temos o sofá, a cama, o frigorífico, a despensa. Este será o contexto em que a maioria dos portugueses vai trabalhar nos próximos tempos: como medida preventiva para combater a COVID-19, o Governo pediu à população que optasse pelo isolamento voluntário e, consequentemente, decretou às empresas que enviassem os seus funcionários para casa em regime de teletrabalho.
Como combater a procrastinação nestas circunstâncias em que trabalhar de pijama e com o cabelo desgrenhado passa a ser uma possibilidade? A coach Maggie João falou com a MAGG e deixa oito regras fundamentais.
1. Arranje-se como se fosse para o escritório
Isto depende de pessoa para pessoa. Há quem trabalhe lindamente de pijama e de cabelo despenteado, mas para quem tendencialmente procrastina, e associa a roupa de casa ao sofá, o ideal é acordar, tomar banho e arranjar-se como se fosse para o escritório — excluindo saltos altos e outros elementos desconfortáveis, óbvio, há que tirar proveito.
É que isto deixa fazer a ponte da vida pessoal para a laboral: "Psicologicamente, tomar banho, vestir, pôr uma maquilhagem, funciona como transição de casa para o trabalho."
2. Crie uma espécie de escritório
Novamente, isto depende dos hábitos de cada um. Mas, para um caloiro do trabalho em casa, numa primeira fase vai ser tentador andar a trocar de poiso de trabalho por casa. Num momento está sentado no escritório, noutro está na mesa do jantar, depois vai para o sofá e, no final, dá por si sentado no chão com dores no cóccix.
Cautela com isto. O ideal é criar um ambiente exclusivo de trabalho numa zona específica da casa e não andar a saltar de divisão em divisão. Vai concentrar-se melhor e, às tantas, vai associar aquela zona a obrigações laborais, acabando por transformá-lo no seu novo escritório.
3. Estabeleça horas de trabalho e de lazer
Esta tarefa é fundamental quando trabalhamos a partir de casa (e dela não podemos sair), porque a vida laboral e pessoal enrolam-se uma com a outra.
"É importante definir uma espécie de horário, ter tudo programado", diz a coach. "Por exemplo: se uma pessoa quer parar para ver o telejornal, isso é um momento de lazer. Quando faz a pausa do almoço, também."
Segundo Maggie João, "há pessoas regradas para quem esta organização não é tão essencial, mas há muitas pessoas que pensam que vão fazer uma pausa para beber um café e, estando em casa, acabam por prolongá-la no sofá."
Por isso, lembre-se: depois da rotina de beleza, pense no seu dia e organize-o de forma a que o trabalho fique feito e sobre tempo para a vida pessoal.
4. Os telefonemas agora também são um momento de lazer
Esta dica tem que ver com a anterior, mas damos-lhe um destaque especial, porque estamos afastados uns dos outros, o que significa que as conversas por telefone ou videochamada são a nova forma de convívio social — e, por isso, são momentos mais prolongados e repetidos.
"É muito fácil dizermos que vamos ligar a alguém e, depois, o telefonema passa a ser um encontro virtual demorado", explica a coach. "Em momentos de calamidade, as pessoas têm uma tendência para falar mais. Os cinco minutos passam para 15 e depois repete-se outra vez, com outra pessoa."
Faça assim: calendarize uma hora para os telefonemas — ou logo na parte da manhã, ou a meio do trabalho ou ao final da tarde, quando este já está terminado.
5. Crie momentos de lazer que realmente o motivem
Ao 15.º dia, pensar que o momento de lazer vai ser mais uma série da Netflix (será que ainda resta alguma) pode não ser suficiente para lhe dar o foco necessário para querer cumprir tudo aquilo que tem para fazer na esfera profissional.
Nos próximos tempos, temos de ser criativos: pense em receitas novas que quer testar para o jantar, pense num treino que quer mesmo fazer ao final do dia.
"Para muitas pessoas o momento de lazer é uma recompensa do trabalho feito. Cada um tem de fazer uma reflexão sobre quando é que se vai sentir mais motivado."
6. Faça listas — e seja realista
Pense nas tarefas profissionais que, remotamente, deve cumprir e faça listas. "Há muitas pessoas visuais que gostam de esquemas em check list. O que é que vou fazer hoje? O que é que vou fazer amanhã?".
Este método é importante no escritório e ainda é mais essencial quando estamos só por nós. Agarre num papel e escreva: os emails que tem de enviar, a apresentação que tem de montar, o texto que tem de escrever. E coloque-os por ordem de execução para ir riscando.
"Na procrastinação, as coisas mais complicadas são alvo de procrastinação", diz a coach. Segundo Maggie João, nem sempre devemos começar pelo mais complexo. "Eu acho que é importante fazer um mix. Se eu faço uma fácil e risco-a, sinto-bem bem e tenho um boost para me dedicar à mais difícil. Se começo por uma complicada e chego ao final do dia e não risquei nada, não me vou sentir motivada."
Na elaboração desta lista, é crucial que seja realista consigo mesmo. É que se colocar demasiadas tarefas no mesmo dia, vai ficar ansioso — o que é um enorme gatilho à procrastinação.
"Não podemos querer fazer tudo no mesmo dia. Quanto mais realistas formos, mais bem sucedidos seremos — concretizamos e estamos prontos para o dia seguinte."
7. Saiba dar o dia de trabalho por terminado
Uma das dificuldades do teletrabalho passa por não saber bem quando é que a componente laboral começa a acaba. É que está tudo misturado: estamos a trabalhar, mas a meio vamos lavar roupa e estendê-la, enviamos emails e depois mudamos os lençóis da cama, fazemos chamadas em conferência e, de repente, já estamos a limpar o pó.
Tenha cuidado com isto, porque a ideia de que o trabalho se pode prolongar pela noite a dentro potencia muito a procrastinação. Como contornar? Já vimos que, para dar início ao dia de trabalho, o melhor é arranjar-se e estabelecer o seu horário.
Depois, novamente, são as tais listas. "Se nós tivermos as listas, com objetivos bem definidos para aquele dia, terminamos e fechamos."
Maggie João ressalva, novamente, que a receita não é igual para toda a gente. "Eu trabalho em casa, faço uma mistura e sou super produtiva. Posso fazer uma pausa de 15 minutos para estender a roupa e volto ao trabalho", conta.
Lá está, depende de cada indivíduo. "Se a pessoa não for muito disciplinada, talvez tenha de impor mais regras. Mas se for disciplinada, pode misturar o profissional e pessoal."