Todos nos lembramos dos simulacros organizados na escola e de quão imaturos éramos para os perceber. Debaixo das mesas era uma risada e as filas no exterior rapidamente passavam a círculos de conversa. O esforço para a consciencialização é inquestionável, mas agora o simulacro é feito de forma mais realista, devidamente informada e divertida no Quake. É o novo Centro do Terramoto de Lisboa, em Belém, inaugurado esta quarta-feira, 20 de abril, com a presença do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas.
1 de novembro de 1755 ficou para sempre na história de Lisboa como o dia em que a cidade foi devastada por um terramoto, seguido de um tsunami e depois incêndios. Na experiência do museu — que nas palavras de Carlos Moedas, é um conceito diferente porque "hoje um museu tem de ser mais do que isso. Tem de ser um lugar para sentir a história" — sentimos precisamente o passado através da tecnologia que pôs em ação quase todos os nossos sentidos, ficando a apenas a faltar o paladar (algo que está para breve e de que já vamos falar).
"Tudo começou com a ideia de um simulador, mas a partir daí desenvolvemos algo maior. Mas sempre quisemos recorrer a tecnologias avançadas, que provocassem emoções. Houve uma fase determinante em que tivemos de escolher óculos 3D, realidade virtual, e chegámos rapidamente à conclusão que era uma experiência isolada. Ou seja, a pessoa acaba por ter as sensações de uma forma isolada e não era esse o nosso propósito", explicou uma das responsáveis do projeto, Maria Marques, à MAGG.
O propósito do Quake é permitir partilhar as emoções em conjunto, daí que seja um museu ideal para explorar em família de modo a passar os conhecimentos entre gerações. As crianças ficarão mais fascinadas com os efeitos e os adultos com o acontecimento de que ouviram falar durante toda a vida e aqui podem viver de forma realista.
"As pessoas vão percorrendo esta viagem histórica e muitas das vezes a tecnologia está presente e a pessoa não percebe. Porque a experiência é tão imersiva, que parece que estamos perante uma realidade", continuou Ricardo Clemente, que também liderou a equipa que trabalhou ao longo de sete anos na construção do Quake.
Durante todos estes anos reuniram-se ideias e conhecimento cientifico e histórico — do professor Luís Matias e Susana Custódio, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, na área da sismologia, e do historiador André Canhoto Costa —, que foi alinhado com o processo criativo da produtora de teatro, Marta Pisco.
Assim, foi-se criando um centro à semelhança da Lisboa pré terramoto, que entre as dez salas sobre a forma de passagem no tempo, tem um destaque: a igreja onde se celebrava o 1 de novembro, Dia de Todos os Santos, criada fielmente ao que era a Igreja Patriarcal da altura.
O momento em que Lisboa volta a tremer (de forma segura)
Na inauguração do Quake, duas frases marcaram o discurso de Ricardo Clemente e são levadas para toda a experiência: “Não é uma questão de se, é uma questão de quando" e "espere o inesperado". Isto porque está cientificamente provado que Portugal continental e Lisboa estão numa zona de risco sísmico e que no futuro um evento semelhante ao de 1755 vai acontecer.
“Se estivermos preparados, tudo correra melhor", disse ainda Ricardo na apresentação, e o novo Centro do Terramoto de Lisboa tem como missão fazer uma ponte entre o passado e o futuro ao mostrar no presente como podemos protegermo-nos. "A missão do Quake é preparar a população para, na eventualidade de um evento sísmico destes, enfrentarmos melhor uma catástrofe", disse-nos Ricardo.
Essa missão é feita ao mostrar a história e ciência através da tecnologia que está presente desde o início ao fim da experiência (disponível em quatro línguas: português, inglês, espanhol e francês) do Quake: máquinas de cheiros, maquinas de calor, video mapping, simuladores, projetores de vídeo e ecrãs interativos (incluindo quizzes) — interações que funcionam com recurso a uma pulseira cedida à chegada.
No que toca a simuladores, aquele em que Lisboa treme durante a missa é bastante real, mas não deve ser temido. Se assim fosse, não teríamos sentado mesmo na primeira fila e haveria um cinto de segurança para colocar (ainda procurámos por um, mas percebemos que não ia ser necessário). Isto porque o tremor terra que acontece em todas as visitas é seguro, ao contrário do que aconteceu há mais de 250 anos.
Após a simulação do sismo que, estima-se, terá atingido os 8,5 na escala de Richter, o Quake encaminha-nos para debaixo de água, dado que um tsunami invadiu a cidade horas depois do terramoto, e só depois começamos a perceber o impacto da devastação: habitações incendiadas, estruturas emblemáticas destruídas, como a Ópera do Tejo e o Cais da Pedra, e crianças perdidas. A aproximar-se o fim da visita, percebemos como foi planeada a reconstrução da Lisboa como a vemos hoje, com especial papel de Sebastião José de Carvalho e Melo, mais tarde Marquês de Pombal.
Ao longo da experiência, várias vezes somos colocados no passado e a pensar se fosse hoje: “Imagine que era um dos sobreviventes, o que faria?”; “imagine que via uma onda enorme a aproximar-se da costa. O que faria?”. Em nenhum dos momentos conseguimos uma resposta imediata, mas voltámos para casa a pensar nelas e também no painel à saída do Quake.
Este encaminha-nos de novo ao presente e às formas como podemos proteger-nos de um eventual terramoto. "Queremos que estas novas gerações saiam daqui e de alguma forma possam alertar também os pais do que podem fazer. Como ter um kit de emergência em casa, marcar um ponto de encontro em caso de uma catástrofe", exemplifica Maria Marques.
O quinto sentido que vem adoçar a experiência
Se o novo museu de Lisboa já é algo inédito e inovador, o que está para chegar de modo a completar o percurso imersivo promete interagir com a nossa gula e é inspirado no quotidiano dos conventos.
"Através da pesquisa que o historiador fez percebemos que as freiras vendiam doces conventuais nos conventos para fazer negócio e nós queremos recriar um doce aqui e ser a nossa bandeira", avança Maria Marques. Esses doces conventuais chamar-se-ão Tremores de Freira e serão criados pelo Quake e lançados em breve.
A entrada no Centro do Terramoto de Lisboa tem um custo desde 21€ por pessoa (14,50€ para crianças dos 6 aos 12 anos) e 19€ para grupos de dez pessoas. Em período de lançamento, o valor da entrada tem um desconto de 50% até 25 de abril. Pode reservar online.