É já neste sábado, 24 de maio, que o Estádio José Alvalade se vai voltar a encher de adeptos de futebol – mas não é do Sporting. Sendo este o palco escolhido para a derradeira final da Liga dos Campeões feminina, são as equipas do Arsenal e do Barcelona que vão entrar no relvado dos leões para decidir quem será a próxima campeã da Europa, e a verdade é que esta é uma final bem esperançosa.

Final da Liga dos Campeões Feminina acontece já este sábado em Portugal. Veja as fotos descontraídas das jogadoras
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Isto porque podemos ter pela segunda vez na história uma equipa tricampeã ou que volta a segurar no troféu 18 anos depois. O Barcelona, casa da portuguesa Kika Nazareth (que não vai jogar por estar lesionada), pode vir a sagrar-se pela terceira vez consecutiva campeão da Europa, depois de ter conquistado o troféu em 2023 e em 2024, e o Arsenal pode voltar ao triunfo que viu acontecer em 2007 depois de derrotar o Umea. Por isso, tudo indica que teremos um grande jogo em Alvalade.

Na verdade, estarão em competição duas equipas que lutaram dentro e fora do campo para isso. "O futebol feminino europeu tem crescido muito nos últimos anos e é muito evidente que neste momento a liga inglesa é a melhor da Europa, porque tem equipas de alta competitividade e que investem muito", explicou Mariana Cabral, ex-treinadora do Sporting e agora treinadora adjunta no Utah Royals, dos EUA, à MAGG. Sobre Espanha, acrescentou que, apesar de a liga ainda não ser tão competitiva, é profissional, e o Barcelona, que investe há largos anos no futebol feminino, tem colhido os frutos desse compromisso.

Ainda assim, Mariana Cabral alerta que, em Portugal, não basta acolher uma final da Liga dos Campeões para que o futebol feminino colha frutos em termos de visibilidade para os adeptos portugueses. "Acho que não será um ponto de viragem. O que devíamos estar a fazer era pegar em eventos que pudessem relacionar as duas coisas", disse, sugerindo que a final da Taça de Portugal feminina, disputada recentemente no Jamor com pouca assistência, poderia ter sido agendada para coincidir com a presença de tantos adeptos em Lisboa. "Há uma série de coisas que ainda se podem fazer e que ainda não temos feito", lamenta.

Aliás, não é surpresa para ninguém aquilo que se passa: o futebol feminino é olhado de lado. A conversa de que as ligas femininas precisam de ter mais investimento e condições é algo que já tem vindo a ser falado há vários anos, e é normal que quem saiba apostar neste tipo de mercado consiga ter mais condições. Sendo este o caso de Inglaterra e Espanha, que dão mais visibilidade à modalidade, acaba por ser normal serem equipas destes dois países a chegarem à final da Liga dos Campeões. No entanto, isto está muito longe de acontecer por cá.

"Em Portugal [o futebol feminino] não é tratado sequer como um negócio porque é visto como um desporto amador, e portanto para que possa crescer tem de ser visto como mais do que isso. Temos de querer não só que a competitividade cresça mas também temos que o ver como um negócio, no sentido em que é algo para o qual nós queremos chamar mais pessoas", explicou. "Isso é feito através do envolvimento da comunidade, de muito marketing, de iniciativas de ligação dos adeptos", disse, ressaltando que essa é, por exemplo, uma das grandes diferenças que sentiu entre Portugal e os EUA.

No entanto, estas diferenças vão muito além do que uma intensa conexão entre o desporto e os adeptos. Vai até ao ponto de, em Portugal, não existirem infraestruturas para equipas femininas, relvados onde possam treinar ou todas as condições existentes no que diz respeito ao futebol masculino – até de uma simples refeição. "Muitas vezes, quando pedimos mais condições, não falamos só de dinheiro. Em Portugal as desigualdades são gritantes, há equipas que não têm um próprio balneário, que não têm relevado para treinar. Muitas vezes nem existem bolas suficientes", explicou Mariana Cabral.

"Há uma série de coisas do dia-a-dia que não permitem ter condições", continuou. "Tudo o que já é condição de base normal no futebol masculino, como por exemplo chegar, ter o pequeno almoço, ter o almoço, ter o balneário, ter tudo disponível em termos de departamento médico, isso é tudo base no futebol masculino. No feminino não, e é isso que ainda precisa de mudar para que haja crescimento. As jogadoras portuguesas têm muito talento e, se as condições melhorarem, não há dúvidas de que podem ser as melhores do mundo", acrescentou a treinadora. 

Sobre isto, Mariana Cabral afirma que o trabalho fora de campo também tem de ser feito pelos meios de comunicação e não só pelas infraestruturas, uma vez que, para se gostar de algo, tem de se apelar a isso primeiro. "Foi muito importante que o canal 11 transmitisse muitos dos jogos [femininos], porque as pessoas só gostam daquilo que veem. Se não veem, se algo não existe as pessoas não sabem o que é, não vão gostar, porque não sentem falta daquilo que desconhecem. A comunicação tem aqui um papel essencial e era preciso que houvesse uma entidade que tomasse conta da liga feminina enquanto liga profissional", reiterou.

E o que é que pode, assim, o futebol feminino ensinar ao masculino? "Eu acho que essencialmente o respeito. O respeito por tudo, pela diferença, pela diversidade, pelo nosso adversário. No futebol masculino muitas vezes os rivais são levados a um extremo que parece que estamos numa guerra, e não é uma guerra. É suposto divertir-nos", disse. "E acho que o futebol feminino nisso tem uma parte muito importante de fair play", rematou a treinadora.