O homem que proferiu a mediática frase “grab them by the pussy” (agarrem-nas pela vagina, em tradução livre) no decorrer da campanha que o levaria a tornar-se no 45.º presidente dos Estados Unidos, foi o mesmo que a 15 de outubro publicou um tweet em que se lê: “Nunca nada aconteceu com nenhuma dessas mulheres. Completos absurdos inventados para boicotar as eleições. Ninguém tem mais respeito pelas mulheres do que eu.”
Falamos, claro, de Donald Trump que, novamente (e é esse o motivo do tweet), está no centro de uma polémica que envolve atos de má conduta sexual contra mulheres (até agora, já foram 25 a acusá-lo do mesmo), relatados no livro “All The President’s Women: Donald Trump and the Making of a Predator”, assinado por Barry Levine e Monique El-Faizy.
Através de vários depoimentos, os dois jornalistas mostram como é que o atual presidente dos Estados Unidos, na década de 90, se dirigia e tratava mulheres que estavam a tentar vingar no universo da moda. Apalpões, beijos na boca sem consentimento, invasão de vestiários onde modelos adolescentes trocavam de roupa e invasão de quartos de hotel são relatados por diferentes pessoas.
Aqui ficam três excertos, destacados pela "Cosmopolitan".
“Quando ele ia beijar alguém, a mão dele ia sempre parar ao quadril ou rabo”
"As mãos de Trump, cujo tamanho mais tarde se tornaria objeto de uma curiosidade significativa do público, eram famosas por outros motivos na época, segundo fontes. 'Ele apalpava-as… estava sempre com as mãos nos lugares mais desadequados', disse [NaKina] Carr. [Nota do editor: NaKina Carr estava a trabalhar como modelo de passarela para Oscar de la Renta.] 'Quando ele ia beijar alguém, a mão dele ia sempre parar ao quadril ou rabo [da pessoa]. Também era muito bom quando tirava fotografias ou abraçava alguém. Ele colocava sempre a mão no peito. Sempre.”
Histórias sobre Trump e as suas mãos circulavam na comunidade de modelos. Num evento de moda, Trump passou supostamente por uma fila de mulheres a sentir os seus corpos para adivinhar o tamanho dos vestidos. Nos bastidores de um evento de lingerie, ela disse ter andado com as mãos pelas mamas de uma modelo sob o pretexto de inspecionar o tecido do sutiã.
Outra imagem de marca de Trump foi aprimorada no início dos anos 80. 'Vi isto várias vezes: quando ele conhecia uma miúda, ele imediatamente se aproximava para beijá-la — não apertava a mão dela ou dizia ‘olá, tudo bem?’. Ele ia imediatamente à boca', disse Carr. 'Eu vi-o ir muitas vezes direto à boca, [vi-o] beijá-las na boca e elas viravam a bochecha. Mas muitas não o faziam porque sabiam que ele era o homem do dinheiro e que [representava] era um caminho ascendente.'
Entre a comunidade de modelos, Trump tinha na época reputação por preferir as meninas mais novas. 'Se tens mais de 21 anos, não precisas de te preocupar', disse Carr."
"Esses homens eram mais velhos do que o meu pai na época, olhavam para as meninas de cima a baixo e objetificavam-nas"
“Stacy Wilkes competiu no concurso [Look of the Year] de 1991 aos 16 anos, representando os Estados Unidos. Ela lembra-se de Trump a entrar na zona dos vestiários durante o concurso, mais de uma vez. ‘Eu sentia-me muito desconfortável, porque todas as vezes que mudávamos [de roupa], era como se Trump encontrasse um motivo para voltar aos bastidores para ver todas as adolescentes', disse. 'Quando estás a fazer um desfile, eles [estilistas e equipa] têm que te despir e vestir para mudar de roupa... Não havia necessidade de ele voltar para lá.’
Trump nunca tentou justificar a sua presença nos bastidores. Apenas entrava e começava a fazer piadas. As meninas não se sentiam livres para reclamar. ‘Tínhamos medo de dizer alguma coisa negativa quando ele estava por perto, porque não queríamos que nada prejudicasse as nossas hipóteses de ganhar", disse Wilkes. ‘Éramos todas jovens adolescentes’. A colega de quarto de Wilkes acabou por passar a noite com um dos juízes de celebridades, disse Wilkes, e depois ganhou um dos prémios.
Modelos relatam episódios semelhantes durante a competição do ano seguinte. Shawna Lee tinha apenas 14 anos quando concorreu pelo Canadá no concurso Look of the Year, de 1992. Ela também participou num evento num iate. Dessa vez, as meninas foram convidadas a descer uma escada, uma a uma, e a dançar à frente de Trump e [John] Casablancas [da agência Elite], que estavam sentados em cadeiras na parte inferior.
‘Era uma área muito pequena e eu podia vê-los a rir e a gozar com as meninas', a maioria com 15 e 16 anos, disse ela [Shawna] numa entrevista para este livro. ‘Sabe, esses homens eram mais velhos do que o meu pai na época, olhavam para as meninas de cima a baixo e objetificavam-nas. Foi um bocado nojento. Não acho que isso tenha que ver com ser uma modelo profissional. "
Lee disse-nos que Trump também passeava pelo camarim antes do desfile. ‘Eu pensava, o que esse velho está a fazer aqui', disse ela. ’Eu estava a mudar [de roupa] e olhei para cima e ele estava a olhar e a dar um passeio lento, a observar as meninas.'
“Pensando que era serviço de limpeza, os dois sentaram-se na cama e gritaram que não precisavam de nada. Alguns segundos depois, a porta do quarto abriu-se. ‘Era o Donald lá parado’”
“As salas de espera não eram os únicos lugares em que Trump se interessava por mulheres. No início dos anos 90, uma supermodelo mundialmente famosa voou para Nova Iorque para participar num evento de moda e estava hospedada numa suite no hotel Plaza.
Ela tinha uma relação com outro membro da indústria e eles foram para o quarto dela. Os dois estavam na cama quando ouviram a porta a abrir, de acordo com o homem, que deu uma entrevista para este livro solicitando o anonimato — porque ele e a supermodelo ainda trabalham na indústria e temem retaliação.
Pensando que era o serviço de limpeza, os dois sentaram-se na cama e gritaram que não precisavam de nada. Alguns segundos depois, a porta do quarto abriu-se. “Era o Donald lá parado", contou o homem. Trump tinha entrado. A supermodelo e seu companheiro ficaram atordoados.
‘Eu disse: ‘Que diabo é que estás a fazer?’”, contou o homem. “Estávamos nus, portanto ela puxou os cobertores e ficámos assustados. Eu não podia acreditar. Ele olhou para a sala e deu uma boa olhada em nós e bateu com a porta com muita força, como se estivesse com raiva. E isso realmente irritou-me, que ele entrasse e batesse com a porta com aquela atitude arrogante.”
Os dois vestiram-se e saíram a correr atrás de Trump, chegando no momento em que o elevador começou a descer. Eles entraram no elevador seguinte e correram para o hall. Trump já estava no meio da multidão a conversar com as pessoas. ‘Eu estava lívido’, disse o homem. ‘Ela estava histérica, a chorar... E eu fui ter com ele, e quando estava prestes a agarrá-lo, o guarda-costas dele saltou para o meio de nós e empurrou-me para trás. Eu estava a gritar com ele: 'Que porra é que estás a fazer, a entrar no meu quarto? Era uma cena.’
Enquanto o guarda-costas tentava afastar o homem, Trump aproximou-se. ‘Odeio segundos lugares’, disse. ‘Foi alto o suficiente para ela ouvir’, disse o homem. ‘Tipo, ela está a segurar o meu braço e a tentar afastar-me também, e ela ouviu-o... e ela teve a coragem de dizer-lhe: 'Seu filho da puta'. Então fomos embora. Fomos empurrados de volta para o elevador.'
Mais tarde, de volta ao quarto, a supermodelo revelou ao seu companheiro que Trump havia conseguido o número de telefone do seu agente e que andava a ligar há semanas. Ela rejeitou-o, repetidamente. ‘E então percebemos que... se eu não estivesse no quarto, teria havido uma cena’, disse o homem. ‘Ela não queria nada com ele.’”