O aumento do número de infetados por COVID-19 e consequentes internamentos estão a deixar os hospitais à beira do cenário que há muito se tentava evitar: o da rutura. Tanto assim é que, nos últimos dias, os administradores dos hospitais Beatriz Ângelo, Santa Maria, Torres Vedras e Garcia de Horta já vieram relatar estados semelhantes, sendo coincidente a falta de camas, recursos humanos, especialmente enfermeiros, e especialistas em cuidados intensivos.
“Já é um cenário de catástrofe", disse ao "Público" o presidente do conselho de administração do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures. Aqui a taxa de ocupação está há já vários dias acima dos 240%, tendo havido neste sábado pacientes “com ventiladores no serviço de urgência a aguardar vaga” em cuidados intensivos. “Estamos a esticar os recursos até rebentarem. E estamos muito perto disso”.
Neste hospital, em que há 187 doentes internados com o novo coronavírus, dos quais 17 em cuidados intensivos, a unidade de pediatria passou a ser reservada para doentes não COVID e já se deu a transferência de doentes ora para norte, ora para sul, ora para privados.
“Passamos de 16 para 18 camas nos cuidados intensivos e, eventualmente, vamos aumentar para 19 ou 20; a unidade de pediatria foi ocupada com doentes não covid adultos; transferimos doentes para o Porto, para o Algarve e para hospitais privados. Isto já não é uma situação de pré-catástrofe, é de catástrofe”
Hospitais em "máxima sobrecarga"
Daniel Ferro, administrador de Santa Maria, fala em "máxima sobrecarga", com serviço "acima dos limites". Elsa Baião, administradora de Torres Vedras, descreve uma situação "muito complicada". E um comunicado do Garcia de Orta fala num "cenário de pré-catástrofe".
"O HGO [Hospital Garcia de Orta] permanece no nível III do seu Plano de Contingência, apresentando à data de hoje uma taxa de ocupação superior a 250%, relativamente ao que previa o Plano de Contingência, nomeadamente de 66 camas em enfermaria e nove de cuidados intensivos, destinadas a doentes positivos para SARS-CoV-2", disse em comunicado o hospital em Almada, relatando uma "enorme pressão assistencial".
Na noite de sexta-feira, 15 de janeiro, imagens que circularam nas redes sociais davam conta do estado das urgências do Santa Maria e hospital de Torres Vedras, com filas de ambulâncias em espera, que tiveram de aguardar horas para poderem deixar os seus pacientes nestas unidades de saúde, com falta de macas e de camas disponíveis.
Muitos doentes, sobretudo idosos, tiveram de receber oxigénio dentro das ambulâncias, sendo que no Santa Maria médicos e enfermeiros foram forçados a monitorizar os doentes dentro das próprias viaturas.
“Há mais doentes a chegar, que precisam ser estabilizados, e o processo de diagnóstico destes doentes também é mais demorado porque implica mais meios de diagnóstico”, explicou fonte do Santa Maria, que tinha à data 201 pacientes internados COVID, dos quais 44 em UCI, ao "Público".
Na mesma sexta-feira, o hospital avançou, em comunicado, que "perante a grande pressão na urgência dedicada a doentes respiratórios e nos internamentos, o CHULN [Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte] vai alargar de imediato o seu plano de contingência covid", prevendo-se um total de 250 camas dedicadas á pandemia já no início da próxima semana. O valor representa mais 40 camas, que se juntam às 210 que já estavam dedicadas à pandemia.
“O Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Oeste informa que na sequência da elevada afluência de doentes à Área Dedicada para Doentes Respiratórios (ADR-SU) da Unidade de Torres Vedras nos últimos dias, verificaram-se constrangimentos no tempo de espera para atendimento”, explico ao mesmo jornal Fonte do Centro Hospitalar do Oeste (CHO), que adiantou que foi necessário transferir doentes para outros hospitais. As filas de espera já não se verificam.
Casos não param de aumentar
Este sábado, 16 de janeiro, foi o pior de sempre desde o início da pandemia: além do maior aumento de infetados em 24 horas (10.947), registou-se também o maior número de mortes num só dia: 166. Mas os dados divulgados no boletim epidemiológico da Direcção-Geral da Saúde dão conta de outro cenário: agora é em Lisboa e Vale do Tejo que se morre mais, comparativamente ao resto do país.
Ao todo, na semana entre 10 a 16 de janeiro, morreram 426 pessoas na região de Lisboa e Vale do Tejo e 249 na região do Norte — ou seja quase quase metade. Esta diferença não é, no entanto, coincidente com o número de infetados, uma vez que as duas regiões apresentam valores semelhantes, com a média de Lisboa apenas ligeiramente superior, diz o "Diário de Notícias".