“O mais importante para mim [no trabalho] será sempre a estrutura da unha. Porque às vezes podemos fazer uma nail art bonita, mas se a estrutura da unha não ficar bem feita, a própria nail art não vai ter a mesma vida. Se a estrutura ficar bem feita nem sequer precisamos de uma nail art para as unhas ficarem bonitas.” Quem o diz é Bruno Rosado, responsável e formador de unhas e pestanas na HN Portugal, à MAGG.

Foi há dez anos que Bruno e a mulher Cila Santos iniciaram a empresa que, para além de dar formação na área, também possui uma linha própria de produtos de unhas e pestanas. Até então, Bruno Rosado tinha um negócio de produtos de manutenção industrial.

O lisboeta de 36 anos admite que a entrada para a área do nail art começou um pouco por causa da mulher. “Estávamos à procura de um negócio diferente, que não existisse muito em Portugal e na altura fomos a uma feira na Alemanha. A Cila gostou da parte das unhas e decidimos trazer esse negócio para Portugal. Não é que não houvesse em Portugal, mas existia muito pouco”, recorda.

A parte da criação e da arte é o que Bruno Rosado mais gosta no seu trabalho

No entanto, durante muitos anos Bruno ficou com o trabalho de gestão da empresa. Ainda assim, sempre teve consciência de que deveria conhecer e saber mais acerca do produto que estava a comercializar. “Meti na cabeça que tinha pelo menos de aprender a fazer unhas e pestanas, nem que fosse para essa parte da gestão. Entretanto, alguém me disse que eu até tinha algum jeitinho para fazer aquilo.” Foi praticando e há cerca de quatro anos acabou mesmo por ficar com a pasta da formação em unhas e pestanas — atualmente dedica-se principalmente à formação em unhas —, delegando a parte da gerência para a mulher.

“Faço verniz gel, gel e acrílico. Existem outras técnicas no mercado, mas que, enquanto empresa, não concordamos com elas. Dentro do gel e do acrílico faço basicamente tudo aquilo que é possível fazer, desde as unhas mais simples — que são essas que ensinamos na HN Portugal a quem quer entrar na área — até às unhas mais complexas, mais artísticas e até com um tamanho bastante grande que, normalmente, são unhas para fotografia, para exposições”, explica. “É um tipo de trabalho que ainda muita gente não entende”.

A parte da criação e da arte é o que Bruno Rosado mais gosta no seu trabalho. O formador de unhas não concorda com a denominação de “manicure” em relação às pessoas que trabalham na área. “Quando trabalhamos o gel ou o acrílico é completamente errado dizer-se que somos manicures porque era uma profissão que existia antigamente. Continua a existir sim, mas cada vez menos. Considero que aquilo que fazemos é uma escultura em cima das unhas, que tem de ficar esculpida numa forma perfeita para posteriormente ser decorada.”

Atualmente, Bruno Rosado é o responsável pela pasta da formação em unhas na HN Portugal

Bruno Rosado não se recorda de “nenhum tipo de reação” por parte da família e dos amigos quando contou o percurso que decidira fazer. “Creio que foi uma situação natural, foi algo que aos poucos foi acontecendo.” E são cada vez mais os homens que apostam nesta profissão muito associada ao sexo feminino, que veem em Bruno uma inspiração e um exemplo no mercado.

“Neste momento, o Bruno é o motivador para muitos homens começarem a fazer unhas. Há uns dois anos olhavam para os homens que o faziam como sendo gays, como sendo menos homens. Então muitos homens não o faziam por causa desse pensamento. Mas quando começaram a ver o trabalho do Bruno e viram que ele era casado, que tinha uma família e tudo mais, começaram a perder o medo. Neste momento temos maridos de alunas nossas que estavam desempregados, que vieram tirar formação com o Bruno para depois irem trabalhar com as esposas”, conclui a mulher Cila, de 39 anos.

“Ainda não sou aceite a 100% como seria se fosse uma mulher”

Foi há cerca de oito anos que Jorge Cunha ficou desempregado. Depois de toda uma vida dedicada a trabalhar na área da hotelaria, como mordomo, em Portugal e um pouco por toda a Europa, decidiu que não queria ficar parado. “Naquela altura — e hoje em dia também — só queriam pessoas novas nos hotéis e nos restaurantes para trabalhar. Quando fiquei desempregado pensei que não podia estar inativo e lembrei-me de fazer alguma coisa”, começa por contar, Jorge Cunha, de 57 anos, à MAGG.

Foi então que começou por colocar anúncios como homem-a-dias nos jornais e depois na internet, profissão que já exerce há mais de sete anos. O facto de ter trabalhado durante muito tempo como mordomo permitiu que Jorge já tivesse alguns conhecimentos e aptidões relacionadas com a área. “Acabei por ter algumas respostas [aos anúncios]. Tenho alguns clientes que o são desde essa altura e já tenho vários clientes que são fixos.”

Ainda não conseguimos quebrar essa barreira completamente. Por exemplo, tenho uma amiga que tem os dias todos ocupados e eu não, tenho algumas vagas e, portanto, ainda há uma diferença grande”

O homem natural dos Olivais garante que na época, apesar de não ter sido o primeiro homem a lançar-se na profissão, foi “dos primeiros a fazê-lo”. Depois dos anúncios decidiu também criar uma página de Facebook, bem como um site onde tem descritos todos os tipos de serviços que realiza, bem como os seus contactos.

Jorge Cunha sabe fazer de tudo: efetua a limpeza da casa, o tratamento da roupa — como passar a ferro — e, se for necessário, pode também confecionar pequenas refeições, algo que os clientes não pedem habitualmente.

Jorge Cunha é homem-a-dias há mais de sete anos

O homem-a-dias faz habitualmente serviços de quatro horas e sente-se realizado com o trabalho que tem. “Gosto de sentir que quando entro ao serviço as coisas estão de uma forma e que quando saio ficam de outro modo. Portanto, gosto de me sentir realizado e perceber que as coisas ficam bem feitas porque são feitas com gosto e não por fazer.”

Jorge não tem dúvidas em afirmar que, por ser homem, ainda não lhe é dada a mesma confiança como se dá a uma mulher com a mesma profissão. “Posso dizer que ainda não sou aceite a 100% como seria se fosse uma mulher. Infelizmente, ainda me dão menos confiança por ser homem. Ainda não conseguimos quebrar essa barreira completamente. Por exemplo, tenho uma amiga que tem os dias todos ocupados e eu não, tenho algumas vagas e, portanto, ainda há uma diferença grande.”

Enquanto tiver forças continuará a trabalhar como homem-a-dias porque gosta do que faz, tem “vontade de trabalhar” e gosta de se “sentir ativo”. “Toda a gente me apoiou e eu incentivo as pessoas a fazer o que saibam fazer, a saírem da seu conforto e procurarem, a não ficarem em casa sentadas num cadeirão, a ver televisão e agarradas ao Facebook ou então que façam do Facebook uma ferramenta de trabalho como eu fiz”, finaliza.

Ainda há quem reaja com ar de espanto quando vê Carlos

“Como é que as crianças iriam reagir? E os pais? As próprias colegas como se iriam sentir? E eu? Será que me ia adaptar? Iria conseguir responder às exigências de trabalhar com esta faixa etária? Como iria ser a minha relação num meio onde só existia mulheres? A verdade é que não poderia ter sido mais bem recebido”, recorda Carlos Pascoal, à MAGG. Quando surgiu a oportunidade de trabalhar como auxiliar de ação educativa foram estas as dúvidas que se instalaram.

Devo confessar que já nessa época de escola, eu era o único rapaz da turma”

O jovem de 28 anos, natural de Coimbra, é licenciado em Animação Socioeducativa. Acabou por realizar um estágio profissional no Centro de Solidariedade Social da Adémia, depois de “um longo período” à procura de trabalho na sua área de formação. “Quando terminei o estágio fui para o desemprego, mas uma funcionária da creche demitiu-se e ficou um lugar vago. Foi então que a direção da instituição me convidou para ocupar esse lugar”, conta. “Esta proposta foi muito pensada e preparada, pois eu era homem e nunca tinham tido homens a trabalhar com aquela faixa etária, até então tinham sido só mulheres.”

Carlos Pascoal trabalha no ensino pré-escolar com crianças de 4, 5 e 6 anos. Algumas das tarefas que realiza consistem em colaborar com a Educadora de Infância nas rotinas do dia a dia das crianças como, por exemplo, nas atividades dirigidas ou livres, na higiene pessoal ou nas refeições dos mais pequenos. “Na ausência da educadora sou eu que assumo a tarefa de dirigir as atividades e de orientar o grupo nas rotinas cumprindo as diretrizes deixadas pela educadora.” Faz dois horários diferentes: num deles, é ele quem logo de manhã recebe as crianças; no outro é também Carlos quem, ao final da tarde, entrega as crianças aos pais.

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“Eu não escolhi esta profissão, esta profissão é que me escolheu a mim”, admite. O auxiliar de ação educativa, que trabalha com o pré-escolar há cerca de quatro anos, confessa que durante o seu percurso académico tentou fugir a esta área. “Queria algo mais ligado às Ciências, à Psicologia ou à História.” No entanto, os testes de aptidão que fez antes de entrar para o ensino secundário apontavam para a área social ou comunicação, e Carlos acabaria mesmo por optar por um curso tecnológico de ação social. “Devo confessar que já nessa época de escola, eu era o único rapaz da turma.”

Ainda no outro dia uma avó foi com a filha buscar o neto e quando me viu ficou sem palavras e quase incrédula. Até chegou a perguntar à filha se eu é que cuidava do menino, a filha disse que sim e a senhora sorriu com um olhar de admiração"

Foi aos 18 anos que o auxiliar de ação educativa entrou no mercado de trabalho, tendo trabalhado noutras áreas. Enquanto tirava a licenciatura em Animação Socieducativa trabalhou numa fábrica de produtos alimentares durante três anos, onde esteve com o estatuto de trabalhador-estudante. Depois do curso esteve dois anos num café, no serviço ao balcão. Acabou por aceitar trabalhar no ensino pré-escolar, não apenas por questões financeiras, mas também pelo “desafio e pela aprendizagem”.

“Trabalhar com crianças é um desafio permanente, é uma descoberta diária, é um despertar constante para a vida e é dar importância ao que realmente importa. O que mais gosto é dos gestos de carinho, de amizade e de amor, dos gestos de gratuitidade de dar e de receber. É de ver a vida a acontecer a cada centímetro que crescem, a cada palavra nova que aprendem, a cada conquista realizada.”

Apesar de atualmente já ter um colega a trabalhar consigo, Carlos garante que não conhece nenhuma instituição que tenha homens a trabalhar nesta área do pré-escolar. Por vezes, há ainda quem reaja com um “ar de espanto” quando, por exemplo, são os avós a ir buscar os netos à escola e o veem pela primeira vez. “Ainda no outro dia uma avó foi com a filha buscar o neto e quando me viu ficou sem palavras e quase incrédula. Até chegou a perguntar à filha se eu é que cuidava do menino, a filha disse que sim e a senhora sorriu com um olhar de admiração”, conta.

Todavia, o auxiliar de ação educativa menciona que nunca sentiu que lhe era dada menos confiança por ser um homem a exercer esta profissão — que é maioritariamente associada e realizada pelo sexo feminino — e assegura mesmo que o facto de existir uma “presença masculina” agrada aos pais, uma vez que pode acabar por “impor mais respeito”, conclui.