Como é que andam os hábitos de leitura dos portugueses? Foi uma das questões a que o inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses, realizado pelo Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa, respondeu e o resultado não é animador: 61% dos portugueses não leu qualquer livro impresso em 2020 e apenas 27% leu entre um e cinco livros. Os maiores leitores são os jovens entre os 15 e os 24 anos, mas o motivo não é o melhor: leem para estudar ou realizar trabalhos escolares (45%).
Os dados não surpreenderam os coordenadores do estudo — José Machado Pais e Pedro Magalhães, professores e investigadores do ICS, e Miguel Lobo Antunes, programador cultural —, quer no que diz respeito aos livros, quer nos restantes parâmetros analisados: a receção cultural, a prática artística e indicadores sobre o que conduz ou bloqueia o consumo cultural.
"Sabemos que existe uma correlação forte entre a leitura de livros e os restantes consumos culturais. Um leitor de livros tem uma forte propensão para se interessar por outras práticas culturais", afirmou investigador José Machado Pais na apresentação da investigação aos jornalistas, citado pela CNN Portugal.
E isso reflete-se nos restantes dados. Antes da pandemia, 41% dos inquiridos afirmou que foi ao cinema, 38% a festivais e festas locais, 24% a concertos de música ao vivo e somente 13% ao teatro. No que diz respeito ao cinema, os investigadores tenteram ainda perceber o porquê da forte resistência. Falta de tempo é uma das principais razões, que representa 25% das respostas, e o elevado preço dos bilhetes pesa na carteira e na decisão de 14% dos inquiridos (sendo que 59% dos que não foram ao cinema, uma boa parte tem rendimentos abaixo dos 800€ mensais).
A pandemia pode ter tido impacto negativo nas relações sociais, mas no que toca à cultura teve um contributo fundamental, ainda que online, principalmente nos mais jovens. Quase metade (40%) passou a ver mais filmes e séries, 21% a ler mais livros, jornais e revistas online e 16% a ver mais espetáculos de música.
O digital tem sido um excelente contributo para oferecer maior acesso à cultura, muitas vezes sem custos, todavia, o estudo vem clarificar que é necessário incentivar principalmente os hábitos de leitura, que são fracos em mais de metade da população (número que contraste com os 38% espanhóis que não leram um livro durante um ano).
"É importante conhecer a realidade para saber onde há constrangimentos. Agora, é preciso tentar perceber os motivos destes constrangimentos para sabermos onde podemos atuar", disse Miguel Lobo Antunes. As escolas poderão ter um forte papel, mas a família também deve estimular os hábitos culturais, já que a investigação às Práticas Culturais dos Portugueses revelou ainda que na infância e adolescência os inquiridos nunca foram levados por familiares a uma livraria (em 71% dos casos), a uma feira do livro (75%) ou a uma biblioteca (77%).