Num texto escrito em 2010, João Caupers, o recentemente eleito presidente do Tribunal Constitucional, assume-se contra o "lobby gay", e considera fazer parte de uma "maioria heterossexual", não estando, à época do artigo, "disposto, nem disponível para ser 'tolerado' por eles".

"Uma coisa é a tolerância para com as minorias e outra, bem diferente, a promoção das respetivas ideias: os homossexuais não são nenhuma vanguarda iluminada, nenhuma elite. Não estão destinados a crescer e a expandir-se até os heterossexuais serem, eles próprios, uma minoria. E nas sociedades democráticas são as minorias que são toleradas pela maioria — não o contrário", escreveu o especialista em Direito Administrativo num texto publicado a 17 de maio de 2010.

Local de trabalho é o "último grande armário" para a comunidade LGBTI+, diz relatório da ILGA
Local de trabalho é o "último grande armário" para a comunidade LGBTI+, diz relatório da ILGA
Ver artigo

"A verdade - que o chamado lobby gay gosta de ignorar — é que os homossexuais não passam de uma inexpressiva minoria, cuja voz é enorme e despropositadamente ampliada pelos media", continuou João Caupers no documento publicado no mesmo dia em que Cavaco Silva, presidente na época, promulgou a lei que alterou o Código Civil, retirando deste a proibição do casamentos de pessoas do mesmo sexo.

No texto, que ainda se encontra disponível numa plataforma da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, onde também constam outros artigos de opinião elaborados pelos professores da instituição, João Caupers abordou também uma campanha da Associação Ilga-Portugal a decorrer na mesma época. Nos cartazes espalhados pela cidade, com a imagem de uma mulher e uma criança, podia ler-se a pergunta: "Se a tua mãe fosse lésbica, mudava alguma coisa?".

O agora presidente do TC mostrou-se revoltado com a realização da campanha. "Os cartazes que a Câmara de Lisboa espalhou pela cidade, a pretexto da luta contra a discriminação, promovendo a homossexualidade", salientou no documento assinado por si, como escreve o "Diário de Notícias", e frisava a "falta de indignação mediática" para com a iniciativa da Ilga-Portugal.

João Caupers salientou não ser "adepto" de "nenhuma forma de discriminação, contra quem quer que seja", e ser-lhe "indiferente" que os amigos "sejam homossexuais, heterossexuais, católicos, agnósticos, republicanos ou monárquicos". O especialista em Direito Constitucional, que considera a população homossexual uma minoria no texto que escreveu há 11 anos, disse que estes cidadãos lhe mereciam "o mesmo respeito que os vegetarianos ou os adeptos do Dalai Lama". "São minorias que, como tais, devem ser tratadas com dignidade e sem preconceito, tanto pelo Estado, como pelos outros cidadãos."

No entanto, o presidente do TC afirmava, em 2010, estar convencido "de que existem mais vegetarianos do que homossexuais em Portugal - e, porventura, até mais adeptos do Dalai Lama", salientado que, ao contrário dos homossexuais, os vegetarianos e adeptos do monge budista "não beneficiam, porém, do mesmo nível de acesso aos jornais, aos microfones das rádios e às objetivas das televisões."

João Caupers acrescentou: "A minha tolerância para com os homossexuais não me faria aceitar, por exemplo, que a um filho meu adolescente fosse "ensinado" na escola que desejar raparigas ou rapazes era uma mera questão de gosto, assim como preferir jeans Wrangler aos Lewis [sic] ou a Sagres à Superbock."

Em breve, João Caupers deverá tomar uma decisão, em conjunto com outros juízes conselheiros, sobre o pedido de apreciação da constitucionalidade de normas constantes da Lei 38/2018, que consagra o "direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa", apresentado em julho de 2019.

A lei em causa, salienta o "Diário de Notícias", pretende a proteção das pessoas transgénero, e fá-lo através da "proibição da discriminação, direta ou indireta, em função do exercício do direito à identidade de género e expressão de género e do direito à proteção das características sexuais", obrigando as entidades privadas e fazendo competir às públicas a promoção " no âmbito das suas competências", das "condições necessárias para o exercício efetivo do direito".

Até à data, João Caupers ainda não emitiu qualquer esclarecimento sobre o tema, ou respondeu a questões do "DN" sobre se mantém a mesma posição atualmente do que em 2010, quando escreveu o texto que agora ressurge publicamente.