Em março de 2020 fomos confrontados com uma pandemia que mudou as nossas vidas. Uns perderam os empregos, outros os familiares, mas, sem dúvida, a parte da população mais afetada foram os profissionais de saúde. Médicos, enfermeiros, auxiliares, fisioterapeutas, técnicos de saúde, e muitos outros, passaram a ter de trabalhar o dobro para conseguir cuidar de toda a população.

Cláudia Santos tem 32 anos e trabalha deste 2016 numa unidade de queimados do Serviço Nacional de Saúde. Com a pandemia, o hospital onde exerce funções passou a ter uma unidade maior direcionada a doentes COVID-19 na qual Cláudia passou a fazer horas extra. Apesar do cansaço ser bastante, conta à MAGG que, muitas vezes, o trabalho acabava por ser uma mais valia já que durante o tempo em que estava ocupada com os doentes não pensava nas incertezas quanto ao futuro.

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"Fui para esse serviço porque há uma grande carência de profissionais com conhecimento em cuidados intensivos e como a unidade de queimados são habitualmente doentes de cuidados intensivos, eu tinha experiência. Quando me questionaram se estaria disponível não hesitei, porque, na altura, senti que o hospital estava a precisar de mim", começa por contar.

Os meses foram passando e a ansiedade de Cláudia tornou-se cada vez maior. "Toda esta situação da pandemia gerou em mim alguma ansiedade que já vinha desde março do ano passado. O medo do desconhecido passou a estar sempre presente. Eu nunca na minha vida pensei passar por uma pandemia. Quando me licenciei sabia que poderia acontecer, mas é daquelas coisas que vemos sempre ao longe", confessa.

Contudo, não era só o trabalho que preocupada Cláudia já que, em casa, também não se viviam tempos fáceis. O pai e a madrasta ficaram desempregados e a enfermeira passou a ter de assumir algumas despesas da família. "Nessa altura, foi quando me tentei refugiar noutras coisas — e uma delas foi a costura. Comecei a costurar algumas coisas em casa e foi assim que surgiu o projeto. Pensei 'eu tenho de fazer alguma coisa que me possa ajudar a mim, à minha família e até aos outros'."

Almofadas terapêuticas como alternativa aos sacos de água quente

Trabalhando na unidade de queimados, Cláudia refere que, todos os anos, são vários os doentes que recebe com queimaduras muito graves provocadas pelo rebentamento de sacos de água quente ou até dos sacos elétricos — algo que a maioria da população desconhece como sendo um perigo. 

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Numa conversa casual com uma amiga, que lhe disse que ia recorrer a esses mesmos sacos, Cláudia sentiu um "click" e percebeu que o novo projeto poderia passar por soluções nesse sentido. "É um hábito bastante enraizado na população. É seguro se o colocarmos para aquecer a cama, mas não se dormirmos com ele", explica a enfermeira, referendo que o maior problema é que grande parte das pessoas utiliza ainda este objeto como terapia para algumas mazelas.

É verdade que um saco de água quente pode ajudar nas cólicas, em algumas dores musculares, menstruais ou até simplesmente a manter um estado de espírito mais tranquilo, mas o facto de não ser seguro faz com que seja totalmente desaconselhado.

"Comecei a fazer pesquisas sobre o que podia fazer e vi que podia aliar a aromoterapia a estes sacos que eu tinha idealizado para evitar as queimaduras. Comecei a aprofundar conhecimento, a encontrar estudos com bases científicas para o fazer e saber que pode ser utilizado como uma terapia alternativa."

Depois de muita pesquisa, Cláudia pôs mãos à obra, neste caso à costura, e começou a elaborar as primeiras almofadas terapêuticas que são feitas à base de óleos essenciais escolhidos de acordo com o que a pessoa precisa. Estas almofadas terapêuticas ajudam a superar vários problemas e servem ainda para aquecer, mas são mais seguras do que os sacos de água quente, uma vez que não rebentam. Para os bebés, o beneficio está, sem dúvida, no alívio das cólicas, mas ajuda ainda a manter um sono mais tranquilo. Para as crianças e adolescentes, auxilia também na redução dos níveis de ansiedade.

No caso dos adultos, estas almofadas podem aliviar as dores por traumatismo, enxaqueca, dores cervicais, dores nas costas, dor menstrual, entre muitas outras situações. "Se a pessoa me diz que é uma cefaleia, eu vou usar o óleo de lavanda porque sei que o óleo de lavanda é mais eficaz para as cefaleias, tal como também é eficaz para a ansiedade. Tento adequar ao que a pessoa procura e, por isso, é que prefiro sempre que me contactem por mensagem privada e que me falem do problema para que consiga perceber como posso ajudar. O tratamento com almofada pode não ser eficaz e aí tento logo encaminhar para especialistas."

Página tornou-se também um espaço de partilha

A página de Instagram da Q. Acalma foi lançada em janeiro, mas, rapidamente, passou de um sítio onde se divulgam produtos, para um espaço de partilha, onde Cláudia conversa com todos os que a procuram e tenta ajudar em tudo o que pode.

"Eu não pretendo só que as pessoas comprem as minhas almofadas, eu tento fazer publicações com ensinos para a saúde e estou sempre ao dispor. Já recebi centenas de mensagens de pessoas a colocarem-me dúvidas, não relacionadas com as almofadas, e que eu sei perfeitamente que aquela pessoa não vai adquirir as almofadas", revela referindo que, devido ao medo de ir aos centros de saúde ou hospitais, muitos procuram ajuda fora disso.

"Eu quero que as pessoas vejam a página como um sítio de confiança onde está uma profissional do outro lado a responder às mensagens. Tento sempre ajudar quem consigo e, se não souber responder a alguma coisa, sei sempre para quem posso reencaminhar", salienta.

Cláudia começou devagarinho, mas não podia estar mais satisfeita com o feedback que tem recebido. Nos dias mais cansativos, é às mensagens dos clientes que se agarrada. "Em todas as vendas que fiz não houve uma mensagem que me dissesse 'não gostei ou não resultou'. Houve um dia em que recebi uma mensagem de uma mãe que me marcou. Ela dizia: 'por favor, diga-me o que está dentro desta almofada porque a bebé não acorda e ela já não tinha uma noite assim desde que iniciou a alimentação com suplemento'. Eu aí percebi que estava no caminho certo."

O preço das almofadas terapêuticas de Cláudia varia entre os 12 e os 25€. O objetivo é que seja acessível a todos para que as pessoas "deixem de usar a alternativa dos sacos elétricos e de água quente". Neste momento, a enfermeira encontra-se já a pensar em novos produtos e, em breve, deverá lançar uma mantas próprias para crianças com distúrbios de autismo. "Basicamente [as mantas] funcionam pelo peso da criança. Há estudos sobre isto, que provam que, quando as crianças estão com uma crise, se lhes for colocada uma manta em cima, ela sente quase como se estivesse a ser abraçada, e isso traz-lhe conforto e tranquilidade e ajuda a ultrapassar a crise", explica à MAGG.

Esta manta será feita nos mesmos moldes, já que dentro dela vão existir várias almofadas. Ao contrário destas, as mantas terão de ser feitas por encomenda uma vez que têm de respeitar o peso do corpo da pessoa a que se destinam.

Na opinião de Cláudia, todas as estratégias são bem vindas para combater a ansiedade que tanto se tem apoderado da população. "Há muitas pessoas que sofrem de ansiedade e que não está diagnosticada. Eu própria não sabia que tinha, mas a verdade é que passei por estados de ansiedade que nunca senti e comecei a notar o mesmo noutras pessoas."