Está oficialmente aberta a maior feira de tecnologia e de empreendorismo da Europa: a 10.ª edição da Web Summit arrancou esta segunda-feira, 4 de novembro, no Parque das Nações, em Lisboa. Apesar de ainda não termos um pavilhão repleto de startups e de as conferências só terem começado pelas 17 horas, não será justo dizer que o evento ainda está em modo warm up. Afinal, o nome mais esperado já falou.

Referimo-nos, claro, a Edward Snowden. O ex-administrador de sistemas da CIA e ex-membro da NSA, que em 2013 divulgou detalhes sobre programas americanos que constituíam sistemas de vigilância global, esteve cerca de 20 minutos no ecrã, a partir da Rússia, a responder a questões relacionadas com a sua história e com os perigos que se enfrentam no universo do digital e dos dados.

Para a mesma plateia falou o ator Jaden Smith, filho de Will Smith, àcerca da água, o recurso planetário que mais riscos corre de desaparecer. Entre os grandes nomes, ficámos também a conhecer startups e serviços que querem revolucionar (e melhorar) a vida das pessoas. Uma delas promete prestar um apoio total (e sustentável) às mulheres, face às consequenciais aborrecidas e dolorosas inerentes ao ciclo menstrual.

A MAGG reuniu os três momentos altos do primeiro dia da Web Summit, onde se estima que passem pelo recinto cerca de 70 mil pessoas, até ao encerramento, na quinta-feira, 7 de novembro.

Ohne, a startup que quer dar às mulheres tudo o que elas precisam para lidar com o ciclo menstrual

Nikki Michelsen e Leah Remfry-Peploe fazem questão de frisar: na filosofia da Ohne, o serviço de entrega de kits completos para o ciclo menstrual, garante-se uma “no bullshit aproach”.

Bem-dispostas e absolutamente à vontade perante a plateia de milhares que tinham à frente, a dupla pisou o palco principal da Web Summit para, em cerca de 15 minutos, apresentarem o seu produto. Apesar de uma falha tecnológica, que impediu que os slides de apresentação da marca passassem nos enormes ecrãs dispostos no Altice Arena, fizeram o que tinham a fazer. E correu bem: foi explosiva a onda de aplausos que irrompeu no momento em que terminaram.

Curiosos com este serviço, fomos pesquisar mais pormenores sobre como tudo funciona na Ohne. Um perfil rápido: o produto está disponível numa loja online onde o utilizador tem a oportunidade de montar um kit ciclo menstrual, de acordo com as suas necessidades. Tudo isto partindo apenas de três elementos: tampões simples, tampões com aplicador e o curioso anti teardrops cramp oil (óleo anti lágrimas de cólicas).

Rumamos aos pormenores. Comecemos pelos tampões: nas duas tipologias, existem em três tamanhos (regular, super, super +), disponíveis em quatro pacotes (12, 16, 20 e 24).

O material com que são produzidos pretende promover o bem-estar das mulheres e do ambiente. Por isso, de forma a poluir menos, os tampões são feitos de algodão 100% orgânico —  portanto, não têm fibras sintéticas, aditivos químicos, fragrâncias, corantes, resíduos de pesticidas ou herbicidas.  Sendo produzidos só com um ingrediente, prometem responder a todas as necessidades, como frisa a marca: “Temos muito orgulho de fornecer tampões 100% algodão orgânico com proteção superior contra vazamentos, são hipoalergénicos, sem cheiro e biodegradáveis.

Está a questionar-se sobre o material com que é feito o aplicador? “Ohne tem tampões com aplicadores de papelão 100% biodegradáveis (sim, até o invólucro)”, explicam no site.

Vamos então ao anti-teardrops cramp oil, a tal arma que combate as dores menstruais (físicas e mentais). O óleo mágico conjuga vários óleos essenciais naturais com óleo de Cannabidiol, vulgarmente conhecido como CDB. De que se trata? É um dos compostos ativos da cannabis (não se preocupe, está livre da componente alucinogénia), que, alegadamente, influencia várias funções do corpo, como a dor, humor, apetite ou sono, sendo-lhe apontado o efeito analgésico e relaxante.

O serviço ainda só entrega no Reino Unido. Mas no site o alerta já foi dado: aos interessados, é estarem atentos, porque a marca promete expandir em breve e chegar a outros sítios do mundo.

Da Rússia para Portugal, não houve distância entre Edward Snowden e o público

Uma app para o ciclo menstrual, Edward Snowden e o filho de Will Smith. 3 coisas incríveis do 1.º dia da Web Summit

Depois de um problema técnico que atrasou o arranque da conferência, Edward Snowden surgiu sorridente, próximo da câmara que transmitia a videoconferência em direto e sobre um fundo cinzento, pronto para reforçar os motivos que fizeram dele o inimigo número um do governo dos Estados Unidos da América. É fácil perder a noção do tempo, mas já passaram seis anos desde que Snowden expôs o Prism, um programa intrusivo de vigilância em massa sobre todos os cidadãos dos EUA e do mundo.

E se há experiências incríveis que a Web Summit é capaz de proporcionar, esta é sem dúvida uma delas. É que embora a transmissão tenha acontecido desde a Rússia, onde Snowden está exilado, a distância só se notou porque o ex-analista da CIA não esteve fisicamente presente em palco. O seu discurso aproximou mais do que afastou e alertou mais do que alarmou para os perigos de um sistema de vigilância em que todos são potenciais alvos — independentemente de estarem (ou ponderarem sequer) fazer alguma coisa de errado.

“Começámos a observar toda a gente em todo o lado e a qualquer hora. Até mesmo aquelas pessoas que não tinham feito nada de errado. Começámos a observar e a vigiar pessoas antes de elas infringirem a lei ou mostrarem tendência para tal”, explica para as mais de 70 mil pessoas presentes na Web Summit para o ouvir.

Foi isso, conta, que o fez violar o juramento que tinha feito à Constituição dos EUA. Porque achava importante e necessário que o público soubesse o que estava a acontecer. “Imaginem que trabalham na CIA e seguem todas as regras de boa conduta. Nunca me embebedei ou fumei uma ganza. Além disso, tinha membros da minha família que já tinham sido funcionários do governo”, conta.

E continua: “Quando tens esse background, é-te difícil não seres esse tipo de pessoa.” Foi quando começou a ver que as coisas se faziam de maneira muito diferente do que esperava, que decidiu que as pessoas precisavam de saber o que se estava a passar.

Mas embora as suas denúncias tenham levado a que se pensem em cada vez mais soluções para a proteção dos dados pessoais dos utilizadores, o problema está no constante armazenamento dessa informação. “A proteção de informação não é o problema. Porque continuamos a aceitar que o armazenamento desses dados possa continuar de forma tão omnipresente como acontece? Eventualmente, tudo é exposto”, alerta.

O discurso, até aqui pausado de Snowden, acelerou no momento em que James Ball, o jornalista vencedor de um Pulitzer que conduzia a entrevista, o interrompeu para avisar que era altura de avançar para a próxima conferência. O ex-analista disse que tinha mais uma coisa para dizer e disse-o depressa, embora com a mesma assertividade com que pautou toda a conferência na Web Summit.

“Temos de ter consciência de que não é apenas informação que está a ser acedida e invadida desta forma. São pessoas. A informação é das pessoas e, por isso, são as pessoas que estão a ser exploradas.”

E conclui: “A internet é global. A lei não é a única coisa que vos pode proteger. A única maneira de o fazer é protegendo toda a gente.” A sala, até então em silêncio total, acorda num alvoroço de palmas. Edward Snowden agradece, acena e despede-se com a mesma simpatia e proximidade com que se apresentou a Lisboa.

Jaden Smith e a sua caixa de água gigante

Jaden Smith, filho de Will Smith e um dos Karate Kids mais recentes, apresentou-se em Lisboa juntamente com Gary White e Paul O’Callaghan, dois empreendedores, com quem participou no documentário “Brave Blue Word” — sobre a crise da água no mundo do século XXI.

Embora os três tenham percursos diferentes, houve um ponto de contacto e de união: a preocupação sobre as consequências que a falta de água pode trazer às novas gerações. Segundo contou Jaden Smith para as mais de 70 mil pessoas que o quiseram ouvir, a preocupação ambiental surgiu logo aos 11 anos.

“Foi aí que comecei a querer aprender mais sobre o ambiente. Queria fazer a diferença.” Até porque, acredita, “somos todos água e viemos todos da água” — e não esconde a influência que a prática de surf, enquanto desporto, teve na consciencialização ambiental.

“Sempre tive uma ligação espiritual com a água. Desde que comecei a fazer surf e vi uma garrafa de água a boiar no oceano, isso teve um grande impacto em mim.”

Talvez por isso, Jaden tenha criado um projeto ambicioso a pensar nas gerações futuras. Chama-se The Water Box que, como o nome indica, pretende criar uma caixa gigante de água para a filtrar e disponibilizar à população — livre de químicos e bactérias.

Ao final do dia, o objetivo de Jaden Smith é que as pessoas de Flint (a cidade no estado do Michigan, EUA, que sofreu com a contaminação de água e que inspirou esta ideia) “possam ter água limpa”. Mas não esconde a ambição de que um dia fornecer água de qualidade “para o mundo inteiro”.

“Estamos a tentar fazer algo que os miúdos estejam interessados em fazer e tenham interesse em construir. Esta não tem de ser a única caixa de água. A ideia é que eles se sintam inspirados para que, um dia, possam ser engenheiros e criar uma outra caixa de água”, conta.