Batatas fritas e salada. No final, 9€. Este já chegou a ser o almoço de Rita Teixeira, num dos restaurantes tipicamente portugueses a que foi recentemente. Mas garante que é caso raro.
Esta nutricionista tornou-se vegetariana há cerca de um ano e, ainda que prefira ir a restaurantes que sirvam comida de base vegetal, não diz que não a planos com família e amigos que envolvam uma ida a um espaço tipicamente português. "Para quem é vegan a coisa complica, agora para quem, como eu, come ovos, há sempre salvação", diz-nos ao telefone, diretamente do Algarve, onde tinha parado para almoçar num restaurante onde o peixe é rei. "Acabei de pedir uns ovos com cogumelos", refere. A isto junta os acompanhamentos comuns a todos os pratos, e tem uma refeição equilibrada.
Já para Francisca Assunção (autora da página Meaningful Flavours), que é vegetariana estrita — ou seja, não come qualquer tipo de produto de origem animal, incluindo, lacticínios e ovos — uma omelete já não é a solução.
"Mas eu não preciso de ir obrigatoriamente a restaurantes vegetarianos, nem tem de ter um prato vegetariano no menu. Basta sim que tenha abertura para mudar", explica à MAGG.
O truque é ir com calma e, se possível, preparar a ida ao restaurante. "Costumo telefonar sempre e a primeira pergunta que faço é se existe algum prato vegan". Se não houver, passa para a outra linha de ataque. "Tento perceber se no menu existem pratos com grão ou feijão e pergunto se não podem juntar isso ao meu prato. Assim, com um arroz ou uma massa e uns legumes, fico muito bem servida", garante.
Outra dica importante? Explicar tudo muito direitinho. "Termos como vegetariano, vegan ou ovolactovegetariano podem ser comuns para nós mas não são para todos. Mais vale dizer que não comes nada de origem animal", salienta, sem esquecer os ingredientes ocultos. "Muitas vezes o arroz é feito com manteiga, os molhos levam banha de porco e os caldos são feitos com carne. É preciso confirmar isso, sem vergonha".
Apesar de não ser tão imediato para Francisca comer num restaurante português como o é para uma pessoa com uma dieta omnívora, encontra sempre solução. "Há sempre sopa de entrada, fruta para sobremesa e depois é jogar com os ingredientes", explica. Já comeu bons arrozes de legumes ou feijoadas de cogumelos em sítios onde não esperava que isso acontecesse. "Se é um bom restaurante no geral, também vão ser bons a cozinhar comida vegetariana.
Ainda assim, lembra um episódio pouco feliz. "No ano passado fui a um restaurante no Algarve que se recusou a fazer adaptações e acabei a comer salada com batatas", conta. Quando este ano teve que lá voltar num jantar de aniversário, precaveu-se e ligou com antecedência. "Continuaram relutantes e então perguntei se podia levar a minha comida. Não e o cenário ideal, mas aceitaram e eu garanti uma boa refeição". Levou um salteado de tofu e cogumelos, ao qual juntou a salada e as batatas que todos estavam a comer.
Há quem esteja a ensinar os restaurantes típicos a cozinhar pratos vegetarianos
Isso mesmo, há quem esteja a ensinar os restaurantes típicos a cozinhar pratos vegetarianos. Maria Aragão é mentora do projeto "E o seu restaurante já tem?", que a Aliança Animal — entidade independente dedicada à defesa dos animais — criou para incentivar os restaurantes a ter opções para todos.
Na prática, Maria, na zona norte e Ana Castro, em Lisboa, fazem consultoria a restaurantes que as contactem com vontade de terem pelo menos uma opção vegetariana no menu.
"E se no início éramos nós que tínhamos que andar atrás dos espaços, agora temos dezenas em fila de espera", garante à MAGG, acrescentando que já fizeram esse trabalho em mais de 50 espaços.
No primeiro ano, todo o trabalho foi feito de forma gratuita. Agora, três anos depois desse início, oferecem duas hipóteses: por 20€ as consultoras fazem uma vistoria na cozinha para que o restaurante tenha noção quais os ingredientes de origem animal e uma formação de quatro horas. Mas se pagar 60€, o pacote mais completo inclui uma formação de oito horas, a mesma vistoria à cozinha e criação de seis receitas (no máximo).
Maria garante que a mudança não é assim tão difícil, uma vez que, se pensarmos bem, temos muitos ingredientes usados a cozinha tradicional que não são carne nem peixe. "Os legumes, as leguminosas, são muitas as possibilidades", garante, até porque a ideia aqui não é fazer um prato cheio de nomes estranhos que em nada tenha que ver com o restaurante. "Se é um restaurante de cozinha tradicional portuguesa, sugerimos pratos como feijoada de cogumelos, alheiras vegetarianas, tripas à moda do Porto feitas com pleurotus e couve, por exemplo".
A adesão dos restaurantes tem superado as suas expetativas e fala-nos daquele que considera ser o maior caso de sucesso. É que o restaurante de francesinhas Al Forno, na baixa do Porto, contactou-a inicialmente para ter uma opção de base vegetal. Atualmente já um terço da carta é feita sem produtos de origem animal, e nada foge à linha do restaurante. Há francesinhas, claro — de tofu, de seitan ou de tempeh — mas também cachorros, pica-pau, bifes de seitan, alheiras e cogumelos à Bulhão Pato. "E já estamos a preparar novidades", refere Maria, com entusiasmo.