Ninguém quer gastar dinheiro num sérum ou creme todo XPTO para depois descobrir que, afinal, anda a usá-lo de forma errada e a comprometer a sua eficácia, por poder estar a contaminá-lo aquando da utilização. Esta é uma dúvida que parece assombrar os amantes de skincare e as respostas variam entre o "não há crise" e o "está basicamente a criar um ecossistema de micróbios dentro da embalagem". Em que é que ficamos?

Para esclarecer de vez esta questão, falámos com Sara Fernandes, farmacêutica especializada em cosmetologia (a ciência que estuda os cosméticos, diga-se), que nos explicou tudo de forma direta e sem paninhos quentes. E isto resume-se a esta ideia: os cosméticos já vêm preparados "para enfrentar um certo nível de exposição a microorganismos", segundo conta à MAGG.

"Os produtos têm conservantes para que se mantenham estáveis e não tenham contaminação de microorganismos", diz a especialista. Ou seja, não é por um pequeno deslize que, de repente, aquilo que faz maravilhas à nossa pele se transforma numa poção do mal – mas convém perceber como funciona este equilíbrio, que é a palavra de ordem no que toca a assuntos de skincare.

A questão é simples de entender, especialmente se tivermos em conta estas duas palavras mágicas: uso expectável. "O que é isso?", deve estar a perguntar-se. Então, refere-se à forma como se espera que um determinado produto seja utilizado, tendo em conta o seu propósito e as normas estabelecidas. "Se é um boião de creme, nós vamos lá enfiar o dedo. É normal, é o seu uso expectável", exemplifica Sara Fernandes.

Por isso, se utilizarmos os produtos da forma para os quais foram testados, não há problema. Quando isso não acontece, a história pode ser diferente. "Quando um produto é usado de uma maneira que não fica contemplada pelos textos e pela estabilidade dos conservantes, podemos ter aqui uma contaminação mais cedo", frisa a especialista.

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Mas, afinal, é grave ou não é pousar a pipeta no rosto? "Ao fazê-lo, estamos a transportar os microorganismos [que existem na pele, a chamada microbiota] e eles podem-se reproduzir dentro da embalagem do produto", afirma Sara Fernandes. O sistema de conservação ajuda a evitar problemas imediatos, mas a longo prazo o risco existe, pelo que, se pudermos evitar, é a opção mais sensata a seguir – e que o deixará mais descansado.

Ainda assim, se tem este hábito, não desanime: não se trata de nenhum flagelo. Afinal, "há alguns laboratórios e alguns testes que contemplam este tipo de utilização", pelo que "não há propriamente uma resposta certa e uma errada". Mas porque mais vale prevenir do que remediar, a farmacêutica deixa uma dica de mestre: aplique o produto na mão previamente. "Acaba por ser mais prático e, por muito que não seja tão estético para mostrar às pessoas como é a textura, acaba por ser a forma mais fácil e intuitiva", insiste.

Do local de armazenamento à validade, outras coisas a ter em conta

O local de armazenamento e a validade dos produtos é uma questão que também suscita muitas dúvidas, especialmente quando queremos que estes durem o maior período de tempo possível – e no seu expoente máximo de eficácia, claro. Por isso, é importante estar atento a algumas regras simples para garantir o bom funcionamento do que temos na prateleira.

Se há produtos que até podem estar na casa de banho sem grande drama, como os de limpeza de rosto e cremes que usamos todos os dias e cuja validade não excede os seis meses, outros não deviam sequer aproximar-se da humidade a que esta divisão está fadada. "A maquilhagem, que nós queremos que dure mais tempo e até acabar, não é tão boa ideia guardar na casa de banho, porque estamos efetivamente a encurtar-lhe o tempo de vida", explica.

E por falar em tempo de vida: dá para esticar um bocadinho a validade ou é para respeitá-la à risca? Bem, "há vários níveis de risco", pelo que tudo depende de uma panóplia de fatores – nomeadamente a presença da água na fórmula dos produtos, por exemplo. Isto porque, para sermos o mais sucintos possível, o risco de contaminação é diretamente proporcional à quantidade deste elemento – quanto mais água tiver, maior é o perigo, diga-se.

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"Todos os microorganismos precisam de água para viver", afiança Sara Fernandes, ao esclarecer que produtos como batons, que são feitos com óleos, e pós duram mais tempo sem grandes riscos. Se falarmos de cremes e séruns, a margem para brincadeiras é menor, especialmente no que disser respeito ao contorno ocular – afinal, não queremos conjuntivites, não é?

"Muito cuidado com tudo o que seja para pôr nos olhos. Tem de se respeitar muito bem o prazo de validade, porque muitos destes produtos são aquosos", adverte a especialista, acrescentando que, mesmo nos casos em que são feitos de ceras, como a máscara de pestanas e os eyeliners em lápis, é algo que, "ao passarmos nas nossas pestanas e voltarmos a pôr dentro da embalagem, há uma contaminação constante".

Mas o grande campeão dos produtos que não devem mesmo ser usados depois da validade é o protetor solar, "não por contaminação microbiológica", mas porque deixa de fazer efeito. "Se nós usarmos aquele protetor solar que está no saco da praia o verão todo e o reutilizarmos para o verão a seguir, a embalagem já foi sujeita a choques térmicos no carro, na praia e, por isso, aqueles filtros já não nos vão proteger contra a radiação solar", alerta a farmacêutica.

E como se percebe se um produto ainda está bom? "Cheirando, vendo a cor ou se tem alguma alteração" desde que este foi aberto, afirma Sara Fernandes, dando a vitamina C como exemplo. "Assim que a cor muda, já percebemos que aquilo está oxidado", admite. O mesmo vale para cheiros estranhos ou texturas que se alteram. Bom, em caso de dúvidas, o melhor mesmo é não arriscar.

Respeitar as indicações do fabricante continua a ser o melhor caminho – seja no que diz respeito à utilização, como à conservação e ao prazo de validade. "Se um produto diz que dura 12 meses depois de aberto, esse é o período em que ele vai funcionar como deve ser. A partir daí, não há garantias", remata. Por isso, uma coisa é certa: estes cuidados extra podem ser a diferença entre uma skincare que funciona e uma surpresa indesejada ao espelho.