
Não precisamos consultar notas ou calendários para saber em que dia visitámos o Brisa do Mar, o mais recente restaurante do Belmond Reid’s Palace, no Funchal. Afinal, a data de 28 de abril de 2025 ficou marcada na memória de todos os portugueses como o dia do apagão, em que o País se dividiu entre as pessoas que tentavam saber dos seus familiares, torcer pelo melhor e fazer maravilhas com enlatados, e aqueles que viram no acontecimento a oportunidade perfeita para falar com vizinhos e brincar com os filhos ao ar livre, quase como se fosse necessário um território inteiro ficar sem eletricidade para nos lembrarmos que há vida além de um ecrã (#alerta,ironia).
Para além disto, existiu ainda um terceiro grupo, onde nos enquadramos: um trio de jornalistas que levantou voo de Lisboa literalmente cinco minutos depois de a luz ir abaixo, e ficou numa espécie de zona cinzenta ao aterrar num Funchal com sol para nos receber e eletricidade para dar e vender. E feitas as chamadas necessárias para assegurar que tudo estava ok no continente, se a vida te dá flutes de champanhe numa varanda e um restaurante tão lindo que entrou diretamente para o nosso top 3 dos mais bonitos, tu sentas-te e aproveitas as bolhinhas.
Mas vamos a contextos. A convite da unidade hoteleira, aproveitámos para ir conhecer o Brisa do Mar, o novo restaurante do Belmond Reid’s Palace. Depois de uma temporada de soft opening para testar as águas no ano passado, o espaço abriu em março de 2025 com um conceito totalmente diferente daquilo que já existe no hotel de cinco estrelas — que é um marco do Funchal, não fosse ter sido inaugurado há mais de 130 anos e o preferido de Winston Churchill.
Localizado no icónico terraço do hotel, com o vasto oceano à frente, este é um restaurante que abre apenas aos jantares e funciona totalmente ao ar livre. Aberto sazonalmente, não é possível fazer nada se estiver a chover a potes, é um facto, mas não nos podemos esquecer que estamos na Madeira, onde o tempo está quase sempre de feição. Por isso não se assuste com uma brisa a mais, até porque há mantas para o aconchegar.
Uma decoração saída do White Lotus e uma mulher aos comandos
É impossível não olhar para este espaço e fazer comparações com a estética das unidades da série "The White Lotus" (aliás, quiçá o Reid's possa ser o cenário de uma próxima temporada da famosa produção da HBO Max). É tudo lindo, instagramável e com uma localização de milhões. Mas será que a comida acompanha?
A mulher forte aos comandos da Brisa do Mar é Zélia Santos, chef natural da Madeira de 38 anos, que marca também uma viragem histórica no percurso do hotel. Isto porque a cozinheira é a primeira mulher a liderar um restaurante no Belmond Reid’s Palace.
Depois da formação na Escola de Hotelaria da Madeira, integrou a equipado hotel, especializando-se nas cozinhas francesa e mediterrânea do Les Faunes (entretanto já encerrado). Seguiu depois para o Villa Cipriani, o restaurante italiano da unidade e é agora a força criativa do novo Brisa do Mar, que aposta nos sabores portugueses, com espaço para as iguarias da ilha, mas onde o produto é rei.
Ainda antes do jantar, há espaço para ver o pôr do sol no lounge, com cocktails clássicos ou de assinatura na mão. Entre várias propostas disponíveis, renda-se a opções como o Maybe-Not-a-Poncha (16€), com uma base de rum, ou ao Seaside Fizz (26€), com champanhe, verbena-limão, agave e lima, sendo que, a pedido, todos os cocktails de assinatura podem ser elaborados sem álcool.
Precisamos de um voo até à Madeira para provar esta tarte outra vez
Conselho de amiga: cuidado com o ter mais olhos do que barriga, que mesmo falando das entradas, as doses são generosas e pode acabar a não ter espaço para tudo. No entanto, entendemos e estamos solidários com a problemática que é conseguir resistir à tentação de pedir a carta toda.
Nas entradas, há opções como salada de lulas confitada (26€), amêijoas à Bulhão Pato (22€), açorda de camarão (26€), ceviche da Madeira (26€) e salada de endívias (20€). No entanto, temos dois claros favoritos e que colocaram a fasquia logo alta para os restantes pratos que se seguiram.
Falamos da trilogia de croquetes, uma proposta da chef que junta croquetes de peixe (no dia em que visitámos o restaurante, eram de bacalhau), alheira e abóbora com queijo (18€). A fritura no ponto, a delicadeza do recheio — sim, mesmo quando falamos de algo tão intenso como alheira — e o sabor geral fizeram desta entrada uma das nossas favoritas, apenas ultrapassada pela maravilha que é a tarte portuguesa (22€).
Com uma massa irrepreensível, há pouca coisa que pode correr mal quando juntamos massa tenra com queijos e enchidos portugueses, e apesar de parecer uma proposta pesada, é perfeita para começar a refeição. Mas talvez seja ideal pedir um prato principal de peixe para compensar tudo.
O que vale é que não faltam propostas, como a sopa de peixe (28€), o bacalhau com broa (32€), o arroz de polvo (32€) ou a icónica e tão madeirense carne de porco em vinha d'alhos (28€).
No nosso caso, optámos pelos pratos para partilhar, indicados para duas pessoas, uma recheada cataplana (64€), com peixe, marisco e legumes estufados em caldo de peixe, e uma costela de vaca com manteiga de alho (66€), cuja carne se desfazia na boca e só pecou por ficar fria rapidamente.
Outra dica: se quiserem pedir um prato de peixe e carne para dividir, façam questão de reforçar para chegar primeiro a opção de peixe. Dado que estamos ao ar livre, a comida arrefece rapidamente, e a carne não vai aguentar a espera quentinha enquanto come a primeira opção.
Quanto aos acompanhamentos, pedidos à parte, pode escolher entre batata assada, milho frito, arroz branco, legumes grelhados e salada regional, todos com o valor de 8€ por dose.
Já estávamos quase a rebentar, mas como não provar as sobremesas, não é verdade? Há propostas como natas do céu, pudim Abade de Priscos, mousse de chocolate e framboesa, tarte de amêndoa e o delicioso pastel de nata desconstruído (todas as opções a 14€).
De reforçar que o restaurante valoriza produtos locais, de origem biológica sempre que possível, e práticas sustentáveis na confeção. E sim, a qualidade da comida igualou a beleza do espaço.
Para acompanhar a refeição, há dezenas de referências de vinhos, tanto portugueses como internacionais, mas estando na Madeira, que tal perceber que o único vinho que existe na ilha não é apenas o doce? Arrisque em propostas de brancos fresquinhos como o Terras do Avô (11€ ao copo, 48€ a garrafa) ou o Palmeiras e Voltas (49€ a garrafa), colheitas de 2018 e 2021, respetivamente.
O restaurante funciona apenas ao jantar, de quinta-feira a segunda-feira. Está aberto para hóspedes, mas também para clientes externos ao hotel, sendo as reservas aconselhadas.