Este texto contém spoilers sobre o primeiro episódio da sexta temporada de "The Crown".
Vamos ser francos. A série "The Crown" devia ter acabado na quarta temporada. A quinta, estreada em 2022, pouco tempo após a morte da rainha Isabel II, já tinha sido lenta, estranha e higienizada, e o primeiro episódio desta sexta (e última temporada) arrasta os pés pela narrativa. Como se, quanto mais nos aproximássemos da atualidade, mais pudor houvesse em dramatizar acontecimentos reais, que o Mundo inteiro conhece de trás para a frente.
Os 10 episódios desta sexta temporada retratam o período desde as últimas semanas de vida da princesa de Gales, ou seja, o verão de 1997, até 2010, o ano em que o príncipe William e Kate Middleton ficam noivos. O problema é que, ao longo de uma hora, a duração do episódio intitulado "Persona Non Grata", ficamos com a sensação de que estamos a fazer uma revisão da matéria dada, de tudo o que já vimos na quinta temporada.
A aproximação de Mohamed Al-Fayed a Diana, usando o filho Dodi como chamariz, a relação, agora às claras, de Carlos e Camilla. O entrelaçar da política com a história dramática, algo que foi soberbamente feito nas primeiras temporadas de "The Crown", limita-se ao surgimento de Tony e Cherie Blair, o primeiro-ministro britânico em exercício aquando a morte de Lady Di, e a mulher.
De Paris, onde se ouve o momento do fatal acidente no túnel da Ponte d'Alma até Inglaterra, andamos para trás no tempo. E há uma cena curiosa, em tudo semelhante ao filme de 2021 "Spencer", protagonizado por Kristen Stewart: Diana conduz o descapotável com os filhos na sua companhia, livre e despreocupada. Só muda a música. No filme de Pablo Larraín era "All I Need is a Miracle", de Mike and the Mechanics, em "The Crown" é "Tubthumping", dos Chumbawamba.
As primeiras temporadas de "The Crown" punham-nos a ir ao Google, à Wikipedia, faziam-nos perder tempo a revisitar ou a aprender a História. Nesta, com o domínio de Diana (Elizabeth Debicki), o papel da rainha Isabel II (Imelda Staunton) fica mais reduzido, e paira sempre aquela sombra soturna, da rainha que, naqueles tenebrosos anos 90 de divórcios, escândalos e incêndios, se fechou ao mundo e à modernidade. "Digo sempre que é difícil fazer as coisas pela metade. Ou é tudo ou não", diz Isabel II num dos encontros com Tony Blair, a propósito de Diana, já divorciada do príncipe Carlos (Dominic West), querer continuar a ter um papel público relevante. Disse-o sobre Diana mas poderá tê-lo dito sobre Harry e Meghan. Nunca saberemos (ou não).
Quando nos apercebemos de que este primeiro episódio é um vira o disco e toca o mesmo da aproximação de Diana a Dodi, que já tinhamos visto na quinta temporada, decidimos acelerar o visionamento na velocidade 1,5x. E é com muita pena que dizemos isto, porque somos fãs da série: não se perde nada.
Já legalmente divorciado de Diana, Carlos está assumidamente com Camilla Parker-Bowles (Olivia Williams). O 50º aniversário da então namorada do príncipe é todos os jornais, mas também é, no mesmo dia, Diana deslumbrante, em fato de banho, em Saint-Tropez. Quanto mais nos aproximamos do final de "The Crown", mais Diana é retratada como uma mulher frágil e sedenta de atenção (surreais, as cenas em que está em amena cavaqueira com os papparazzi ou a atirar cubos de gelo, feita tonta, a Dodi e William) e mais Carlos é representado como um homem sensato, apaixonado e sedento da aprovação da mãe (e, por conseguinte, do país).
Adorávamos dizer que se passa muito mais do que isto no primeiro episódio mas a verdade é que se pode resumir a:
- Camilla faz 50 anos mas a rainha falta à festa;
- Diana vai de férias para Saint-Tropez a convite de Mohamed Al-Fayd e este atira-lhe para o colo o filho, Dodi;
- Dodi, para agradar ao pai, marimba-se na noiva, Kelly Fisher (Erin Richards) e trata de seduzir Diana;
- próxima estação: Paris.
A primeira parte da sexta temporada de "The Crown" já está disponível na Netflix. A segunda será lançada a 14 de dezembro.