Sou daquelas pessoas que não sabe relaxar. Pronto, não sei. Há os preguiçosos, incapazes de acordar cedo para treinar ou cuja atividade preferida ao fim de semana é pousar o comando da televisão para pegar no telemóvel e chamar um UberEats. Eu não. Por muito que anseie pelo fim de semana, se ele não for preenchido, não fico bem. E quando não há planos, inventam-se. Há sempre mais um brunch para ir experimentar, uma exposição no MAAT ou um concerto ao ar livre a aproveitar os fins de tarde que já se querem de sol.
Aprecio uma boa massagem, atenção. Chego até a adormecer assim que alguém que sabe realmente da coisa me mexe nas costas. Mas são muitas as tentativas falhadas de relaxar sem ajuda. Basta lembrar todas as vezes em que peguei num livro e fui para o jardim à espera de um momento daqueles que vemos nos filmes e à segunda página, mentalmente já tinha feito a lista de compras, pensado nas marmitas da semana e na prenda de anos que tenho que comprar para o meu irmão.
Mas mesmo (e especialmente) pessoas como eu precisam de relaxar, até porque isto da vida a mil não é projeto a longo prazo.
Decidi aproveitar as redes sociais para mais do que saber como os outros ocupam os dias e atualizei a minha lista de pessoas a seguir. Troquei alguns guilty pleasures — todos temos aquelas contas que seguimos porque sim e ninguém precisa de saber — por páginas de quem se dedica a pratos cheios de verde, fotos de florestas, dicas de meditação e poses de ioga.
Foi nessa aventura pelo encantado mundo dos que sabem relaxar que me deparei com o mindfulness, a incrível arte de estar no aqui e no agora. Mas estar mesmo. Não é sentar no jardim com um livro e dez páginas depois não saber sequer qual o nome da personagem principal, porque, naquele momento, estou a pensar sim na historia do filme que vi ontem ou naquele que estou a pensar ir ver assim que o Monumental atualizar a página das estreias.
Mas vá, se no crossfit passei de não saber dar uma cambalhota para fazer flexões em pino, não é o exercício mental que me vai deixar ficar mal. Tudo é uma questão de prática, não é o que se costuma dizer? Pois é, talvez essas pessoas nunca tenham experimentado o mindfulness.
A primeira tentativa deu-se num brunch vegano, feito para ensinar a apreciar o momento da refeição, sem telemóveis, televisões ligadas e, principalmente, sem culpas por nem sempre comermos aquilo que é o mais saudável. Saí de lá confiante depois de um brownie comido com açúcar e sem remorsos e, a partir desse dia, esforço-me por fazer da refeição o meu momento, interrompido apenas por conversas cara a cara com as pessoas que realmente estão à mesa — e não aquelas que estão a postar a foto do leitão que estão a comer na Mealhada ou da mais recente tosta de abacate do Príncipe Real.
De tal forma saí imbuída do espírito que até uma aplicação de meditação instalei no telemóvel. Mas calma, não pensem que me passei para o lado de lá. De um programa de sete dias de meditação, cumpri apenas três e só no último senti que aqueles dez minutos matinais não eram tempo que podiam estar a ser tão mais bem aproveitados na cama.
Percebi que o universo estava a meu favor quando, nesta minha primeira semana a tentar alinhar os chakras, recebo um convite para dois dias dedicados ao mindfulness no Dolce Campo Real Hotel.
Receberam-me com uma massagem e, por aqueles breves trinta minutos pensei: ‘tenho isto do relaxamento no papo’. Mas logo a seguir passamos para o jantar, feito a pensar em quem precisa de dar mais atenção ao momento da refeição. Foi-nos sugerido que a entrada fosse comida com a mão não dominante e que saboreássemos o primeiro prato — um arroz de algas e côco — como se fosse a primeira vez que provávamos algo do género. Não foi preciso grande esforço, até porque, além de conseguir comer perfeitamente com as duas mãos, era de facto a primeira vez que provava arroz com algas e coco, e que espero sinceramente que não seja a última.
No segundo prato que na versão original era vitela baseada e na vegan — a minha — trocava-se o ingrediente principal por tofu é que todo o universo holístico tremeu. Pessoas alheias à alimentação vegetariana, aqui fica um aviso: não se cozinha tofu como se de um bife se tratasse. Sem molho ou temperos adequados, aquele bloco branco fica a saber exatamente a isso, a um bloco branco. Mas vá, tudo acabou por se salvar com um delicioso bolo de especiarias, ainda morno do forno, ideal para aquele aconchego antes de entrar numa das camas mais confortáveis onde tive o prazer de deitar este corpinho a pedir descanso.
No dia seguinte, o programa prometia três horas nas mãos de Vanille Siméon, especialista em ioga e mindfulness. O que ninguém me disse é que ia acabar a contar a minha vida a uma estranha. Mas aconteceu.
Começámos por usar o boletim meteorológico para descrever o estado de espírito de cada um e, tal como o tempo em Torres Vedras, também dentro da sala estava bastante nublado. Passámos aos exercícios de confiança durante os quais, em duplas feitas por pessoas acabadas de se conhecer, nos deixarmos guiar com os olhos vendados por uma sala cheia de estímulos sensoriais. De seguida, e como se não bastasse, tínhamos que contar à outra pessoa — desta vez ela vendada, para que não possamos ver no olhar do outro qualquer tipo de crítica — tudo aquilo que nos atormenta e que queremos ver melhorar. “Dez minutos”, avisou Vanille, o que nos pareceu uma eternidade. A verdade é que só me calei quando a professora disse que tínhamos mesmo que passar para o exercício seguinte.
Seguiram-se poses de ioga, respirações forçadas, pensamentos guiados e, no final, novo pedido de consulta ao boletim meteorológico do dia. No geral, apesar de ainda nublado, já se viam algumas abertas. “É mesmo como o tempo lá fora”, comenta alguém. E era mesmo. De repente o Oeste decidiu lembrar-se que estamos na primavera e deixou o sol entrar naquele sala. E para já, ainda não choveu.