Os leitores perguntam, a psicóloga Sara Ferreira responde. É assim todas as semanas. Saúde, amor, sexo, carreira, filhos — seja qual for o tema, a nossa especialista sabe como ajudar. Para enviar as suas perguntas, procure-nos nos Stories do Instagram da MAGG.
Olá, leitora!
A sua pergunta fala de um tipo de dor tão antiga quanto o próprio mundo: a dor da perda, da separação.
Obviamente, não faço ideia de como é que a sua rutura amorosa aconteceu, por quanto tempo a leitora e o seu ex estiveram juntos, do nível de envolvimento que existia entre os dois, etc., mas uma coisa parece-me evidente: ter terminado com o seu ex não correspondeu às suas expectativas. Talvez mesmo porque até tenha sido a leitora a ser abandonada. E a dor realmente doída é de ter sido despejada “daquele” mundo onde tudo parecia intacto…
Qualquer lugar é agora inóspito “neste” mundo, porque foi o mundo interno que se rompeu. Bem sei que, para voltar a adquirir o gosto pelo mundo, é preciso construir outro. A partir do nada, como no primeiro (e último) dia de vida.
Sim, a leitora sofre e tem bons motivos para tal. É que segundo alguns estudos, a experiência de separação só seria emocionalmente mais dolorosa que uma morte de um ente querido. Isso explica aquela sensação parecida com um pós-velório em que você sai completamente desnorteada e exausta de chorar.
Ashes to ashes… é assim que a leitora se sente?
Pois é, minha querida. A verdade é que nascemos nus, com frio, desprotegidos, vulneráveis, passivos e carentes. Dependendo de como a vida foi levada adiante esta é a fórmula perfeita para muitas desventuras a longo prazo. Ou seja, somos seres necessitados (por natureza)!
Desde o primeiro dia das nossas vidas, nós, seres humanos, sentimos que para viver as nossas necessidades deveriam ser atendidas. A condição de termos sido outrora crianças ou “pequenos” fez com que dentro de nós se instalasse a convicção de que precisaríamos de outras pessoas ou outras coisas, para além de nós mesmos, que nos dessem segurança. E é essencialmente isso – segurança – que procuramos quando buscamos amor. De alguma forma, está impresso no nosso ADN uma sensação “limite” que se traduz na dificuldade em responder à pergunta: consigo eu valer-me a mim mesmo(a), bastar-me ou sequer proteger-me?
Ok. A leitora, conforme me diz, não consegue esquecer o seu ex-namorado. E como se isso não bastasse, refere também que tal facto limita a sua vida. Vejamos. Talvez por a relação ter terminado cedo demais (pelo menos, para si), ou quem sabe abruptamente e sem grandes explicações, o sentimento que prevalece para si seja, neste momento, de alguma dúvida ou surpresa. Qualquer coisa que “paira” no ar e que, literalmente, faz de refém a sua mente, perseguindo-a com memórias de um passado (que por mais presente que seja, ainda assim é passado, e que acabou…).
A leitora não o esquece porque, dentro de si, este é um capítulo inacabado. E não tendo ainda selado essa sua história com um (alegre ou triste, não importa, mas acima de tudo um vigoroso e reparador) “The End”, a sua mente irá continuar a “torturá-la” até que decida (e consiga) fechar esta narrativa dentro da história da sua vida.
Porque é que a mente nos tortura assim? Neste vídeo que fiz, e que poderá ver em baixo, eu revelo-lhe um motivo importante pelo qual a nossa mente nos tortura com memórias que preferíamos esquecer de vez. Mas mais do que isso: proponho-lhe alguns exercícios práticos que a poderão ajudar a reverter essa sensação de sofrimento com as memórias dolorosas do passado e ainda a ressignificá-las, ou seja, a redireccioná-las para a construção de algo mais positivo e com mais sentido para si e para os outros. No final deste vídeo, vai descobrir como sofrer menos com memórias difíceis do passado e a superar os sentimentos de raiva, vergonha ou culpa de uma vez por todas.
Talvez a leitora ainda não tenha obtido todas as respostas que desejaria para justificar o que aconteceu ou deixou de acontecer na relação que terminou.
Ter uma resposta, todavia, devolve-nos à posição de segurança, ainda que meio torta e dolorosa, mas ficar sem resposta é dos piores infortúnios de que podemos padecer.
As perguntas que não têm resposta deixam a nossa mente paralisada porque queremos reforçar o nosso sentimento de controlo, permanentemente.
Mas e…porque é que “isso limita a sua vida”? Porque, na verdade, não é exatamente “isso” (o facto em si) que a limita, mas sim a relação que a leitora está a ter com “isso” (com o facto em si), na medida em que se a dor (da perda) é inevitável, já o sofrimento associado a “isso” é opcional. Eu explico esta questão melhor, tim-tim-por-tim-tim (inclusive, com uma demonstração prática do que é necessário fazer para reverter as situações negativas em superações positivas). aqui neste outro vídeo, que lhe disponibilizo em baixo.
A questão é: o que fazer com esse sentimento? Alimentá-lo ou administrá-lo? É facto que a aceitação ajuda a gerir, a administrar melhor. Até ao momento em que ela for substituída por outro sentimento (por exemplo, entendimento, serenidade, superação, etc.). A aceitação (que não é sinónimo de resignação passiva, não confunda!) é entender que, em muitas situações, nós não temos controlo algum sobre o que está fora de nós, mas sim, dentro de nós, na medida em que pode sempre controlar o seu foco. Só nos podemos controlar a nós mesmos, ou seja, ao nosso foco e estados emocionais internos, e olhe lá!
Será que a leitora começa a perceber que não é propriamente a situação por que passa que a limita, mas o facto de – à boleia dela – estar, isso sim, a (auto)limitar-se a si mesma? E isto porquê?
Porque, após o término, aquela história de amor que, pelos vistos, já não estava mais a acontecer (suponho que por isso é que o namoro tenha acabado) parece que de um momento para o outro começa a sorrir para si novamente. Talvez agora chegue a pensar: “Ah, como eu era feliz e não sabia!”, “Aposto que hoje seria diferente”, “Como seria se nós voltássemos?” e blablabla. Todas estas perguntas têm uma única razão: a mente vazia precisa encontrar um refúgio em memórias agradáveis. Numa palavra: idealização.
É provável que você “agora” esteja a idealizar demasiado o seu ex, ou seja, a focar-se unicamente nas suas virtudes (exagerando-as) e talvez agora – “apropriadamente” *agora* – tenha esquecido os seus defeitos e todas as coisas que você não gostava nele ou na relação, que de alguma forma ditaram este desfecho.
A sua obsessão com o seu ex pode dever-se à necessidade/compulsão de ter algo em que pensar (sim, por incrível que pareça, isto acontece, e poucas pessoas dão-se conta disso). Isso acontece porque, quando não temos outras prioridades e não são realizadas novas actividades para sair da rotina (e um término de relação é, antes de mais, um corte logístico em relação à vida que “antes” do final da relação tínhamos com aquela pessoa), é mais provável que passar muito tempo a pensar no ex se torne um hábito (ou vício), o que pode ser muito prejudicial psicológica e emocionalmente.
Limitada? Não sei, mas “auto-limitada”, seguramente. Porque a leitora tem sempre opções e poderá sempre agir e/ou influenciar uma situação mediante a sua escolha (consciente) relativamente ao foco com que escolhe olhar para a situação. Por outro lado, se não puder controlar ou influenciar o que lhe acontece, pode sempre controlar a forma como reage ao que acontece. Chama-se a isto em bom ‘psicologuês’ arcaico o “Locus de controlo interno” que nada mais é do que um belo assumir de responsabilidade.
Sim, a leitora pode ter controlo sobre os seus atos, pensamentos, sentimentos. E pode entender que pode otimizar as situações que acontecem e usar o que a vida lhe colocar pela frente como combustível e reforço para alcançar os seus objetivos e ter uma vida mais equilibrada, mais saudável e mais feliz. Simples? Sim. Fácil? Nem por isso!
E então, será possível acabar com o sofrimento emocional associado ao facto de “não conseguir esquecer o o seu ex”? Bom, embora a vida traga a dor por si mesma (e as perdas amorosas são, como vimos, do tipo de dor mais intenso e “cruel” que podemos sentir), não estamos condenados a sofrer passivamente. Também neste vídeo, em baixo, eu revelo-lhe o passo-a-passo para lidar com as adversidades e mesmo conseguir eliminar as causas do sofrimento emocional na sua vida. Duvida? Experimente ver para saber (e depois diga-me o que achou)!
Há muitas maneiras de sofrer uma perda amorosa, mas certamente a que abre caminhos futuros é respeitar o momento do luto. Exactamente. Luto.
Neste artigo que escrevia aqui na Rubrica “A Psicóloga Responde”, expliquei detalhadamente porque é que acabar uma relação é um processo equiparado ao do luto, quais são as etapas do luto, e de que forma podemos superar construtivamente esse processo de luto, absolutamente necessário para o restabelecimento do nosso bem-estar psicológico e emocional.
É curioso observar, em consultório, que na elaboração deste (inevitável quanto indispensável) processo de luto por um relacionamento que terminou, cada pessoa coloca o empenho da sua própria personalidade neste processo. Os apressados tentarão dançar pela noite fora, mesmo com a ferida mal cicatrizada. Os raivosos irão agarrar-se à própria mágoa e imaginar que as acusações irão apaziguar qualquer sentido de injustiça. Os metódicos e organizadinhos híper-racionalizarão tudo para não deixar que nenhuma faísca os afete (oh, tentativa inglória). Os passivos arrastarão a sua dor interminavelmente pois terão uma boa “justificação” social para atrasar ainda mais a (sua) vida.
Mas depois há os lúcidos. E os lúcidos seguirão em frente, trilhando sobre suas próprias cascas de dor, saudade, esperança, penúria, amor e integridade.
Respeitar-se a si mesma é não se atropelar, mas também não ceder aos próprios vícios emocionais ante da dor emocional. Sobreviver ao término de um relacionamento, seja por vontade própria ou não, tem as suas dores particulares. Em qualquer situação será sempre necessário recompor-se, recolher os cacos, repensar a logística da própria vida, pôr-se em “xeque” novamente e dar início a uma auto-cirurgia delicada de separação de bens emocionais.
Apesar de, neste momento, poder sentir-se meio que cambaleante na vida, a leitora estará também extremamente carente de apoio, acolhimento e proteção. Neste momento, deveriam ser bem-vindas apenas as pessoas e situações que tenham uma intenção positiva, ou seja, evite o que for mais desgastante ou tóxico para si do ponto de vista emocional. Retome os amigos fofinhos, aqueles que têm coração de ursinho de peluche a bater no peito e que não são ácidos ou sugadores. Qualquer sobrecarga nesta fase seria agressiva e desnecessária.
Imagine-se a leitora como um doente combalido que precisa de um tempo até convalescer e reerguer todas as suas forças, uma vez que ainda carece de cuidados. Não vale a pena estancar a vida, mas saiba que ao falarmos da possibilidade de superação de um término de relação, falamos necessariamente de termos de fazer um processo de luto (cujo passo-a-passo poderá, conforme referi antes, poderá perceber em maior detalhe neste meu texto aqui que lhe recomendei. Afinal, um luto é um luto.
Não é tão simples encontrar outra narrativa, outra história, outro passado/presente/futuro. E é também por este motivo que não é tão fácil esquecer a pessoa amada, pois na despedida dela uma parte sua também se vai…
Para parar de sofrer, vamos simplesmente aceitar aquilo que é. É simples? Sim. É fácil? Não, nem por isso! Aceitar aquilo que não pode ser mudado. E essa aceitação, essa condição, que não se confunde com submissão, resignação ou conformismo, ou sequer um baixar a cabeça diante de obstáculos que podem e devem ser superados.
Aqui entra o auto-conhecimento, a sabedoria de saber o que tem de ser mudado e aquilo que não tem como ser diferente. Entender o que está no passado e compreender aquilo que pode ser construído no futuro. É esta clareza que permite retomar para o momento presente e fazer agora o que tem que ser feito.
O presente é o único tempo onde podemos de facto realizar algo. O que poderia ter sido e não foi, no fundo, não poderia ter sido, exatamente porque não foi.
Mas “e se eu tivesse tentado?"... Se tivesse tentado tentaria, se não tentou, não tentou e por isso aquilo é inútil. O principal monstro do porão que se deve extirpar ao lidar com uma história mal acabada ou inacabada é perceber que se acabou foi acabada. Vida em frente!
Mas antes de bradar aos quatro ventos a racionalização de que “tudo é uma aprendizagem”, vá aprender de verdade e debater-se consigo mesma, afinal um término de relacionamento é muito mais do que um término. É também (e sobretudo) um recomeço de uma nova fase da vida.
Assim, não se limite. Antes, dê uma arejada na sua vida. Expanda-se, inclusive. Aproveite a oportunidade para rever conceitos, valores, comportamentos, atitudes, sentimentos, ações, omissões e analise se a sua vida realmente está a seguir na direcção do que quer ou se já não sabe por que caminho seguir.
Não fique a remoer o que aconteceu, concentre-se naquilo que você pode fazer no momento presente em relação a isso. Se precisar de ajuda, visite-me e dê os próximos passos.
Agora é hora de descobertas e renovações pessoais, por isso, aproveite.
Até para a semana!