Embora seja contra as generalizações, acho que é possível afirmar que todos nós já nos apaixonámos. A paixão é sinónimo daquela sensação de borboletas na barriga, que é também a culpada de muitas das coisas tontas que fazemos quando estamos nesse estado, quase semelhante ao efeito de uma droga.
A paixão faz vítimas e a primeira costumam ser os amigos. No tal estado de transe em que nos encontramos no início de um relacionamento, só temos olhos para a pessoa amada, queremos passar todos os minutos na sua companhia, apenas os programas a dois fazem sentido e, nas poucas vezes em que estamos com os amigos, a conversa acaba quase sempre por ir parar ao novo companheiro.
Os amigos, companheiros de noitadas, cafés, bons e maus momentos, são automaticamente postos de lado e, pior, são raros os que se queixam porque “é normal, já sabes como é, início de namoro”.
Discordo. Muito. Mesmo. E se este fenómeno era aceitável com 20 anos, devido à imaturidade da idade, na casa dos 30 em diante parece-me só ridículo, dado que quando o cenário se altera e o tal relacionamento acaba, essas mesmas pessoas que trataram os amigos como descartáveis, regressam automaticamente com o final da sua relação, qual filho pródigo.
São os convites para cafés depois de meses sem um sinal (às vezes até anos), a disponibilidade total para jantares quando antes estavam sempre ocupados com trabalho, as mensagens “só para saber como estás, tenho saudades tuas”.
E eu pergunto: onde estavam as saudades quando existia uma companhia constante para jantar, as mensagens de preocupação quando havia alguém à espera em casa?
Para mim, isto resume-se a uma palavra: egoísmo. Porque quando estamos a passar um mau bocado, quando não queremos regressar para uma casa vazia, quando queremos evitar recorrer ao ex-companheiro apenas para combater a solidão, é natural que queiramos preencher ao máximo o nosso horário.
Recorrer aos amigos é natural e, na minha singela opinião, até bastante saudável. Mas não é justo quando não tivemos qualquer respeito por aquela amizade durante o período em que não precisávamos, mas corremos para ela assim que queremos colo.
Não me interpretem mal, é óbvio que a vida muda e há acontecimentos que modelam tudo o que está à nossa volta. Um filho, um emprego e um novo relacionamento pode fazer-nos ter outras prioridades e afinar as já existentes.
No entanto, quando as amizades são verdadeiras e os amigos pessoas que estiveram sempre lá para nos apoiar, fosse para um copo na Rua Cor de Rosa ou para agarrar a nossa mão no funeral de um ente querido, devemos-lhe respeito, atenção e, acima de tudo, a nossa presença.
Costuma-se dizer que os amigos são a família que escolhemos. Então, se as amizades que têm à vossa volta são genuínas, não as tratem como aquele tio velhote, para o qual não temos paciência para manter uma conversa no domingo de Páscoa mas agradecemos o envelope com dinheiro no Natal.