A pandemia da COVID-19 já infetou 425 493 pessoas e causou 18 963 mortes. Com estes números, poderíamos dizer que este vírus que se espalha globalmente está tão vivo que ninguém o consegue combater. A verdade é que trata-se precisamente do contrário. De acordo com os cientistas, a COVID-19, fora de um organismo vivo, é como um "zombi" praticamente sem vida e é por isso que ainda que seja fácil de encontrar é muito difícil matar.

As revelações dos investigadores foram feitas ao jornal "The Washington Post" e a perspetiva é de que a luta para conter o vírus continue. Isto porque, de acordo com os cientistas, embora o SARS-CoV-2, que causa a COVID-19, se degrade em minutos fora do organismo de um indivíduo, pode permanecer em algumas superfícies durante horas ou dias (como é o caso do plástico onde permanece até três dias) e continuar o ciclo de propagação.

Um vez de volta ao organismo de um ser humano, o vírus usa proteínas da sua superfície para desbloquear e invadir as células inocentes, assumindo posteriormente o controlo molecular para reproduzir-se. "É alternar entre o vivo e o não vivo", explica Gary Whittaker, professor de virologia da Cornell University.

É assim que funciona um vírus no nosso corpo

Uma vez dentro de uma célula, um vírus pode fazer 10 mil cópias de si mesmo numa questão de horas, o que num dia significa que a pessoa carrega centenas de milhões de partículas virais.

Aqui tudo pode complicar-se: o vírus começa por replica-se no nariz e na garganta e ainda nos pulmões, onde apesar de o contágio ser mais difícil, uma vez infetado pode ser mortal. Dado que os sintomas da COVID-19 são semelhantes aos de uma gripe, o vírus fica alojado durante mais tempo sem ser tratado, o que significa que se transmite a outras pessoas antes de ser diagnosticado.

Além disso, de acordo com um estudo publicado a 11 de março pela da revista científica "Lancet", depois do início dos sintomas o vírus permanece no sistema respiratório durante 20 dias. Percebemos agora o porquê da dimensão da pandemia, uma vez que, tal como refere o "The Washington Post", "por outras palavras, [o vírus] é apenas sorrateiro o suficiente para causar o caos".

Esta não é a primeira vez que vemos isto a acontecer. Vírus parecidos foram os responsáveis por várias mortes nos últimos 100 anos, como é o caso da gripe de 1918, 1957 e 1968 e da SARS, MERS e Ébola. Nestes casos, bem como o do novo coronavírus (COVID-19), as doenças são causadas por vírus que codificam o seu material genético em ARN (o mesmo que ADN).

Os cientistas acreditam que a COVID-19, tal como o vírus da SARS, teve origem no vírus de um morcego que, no caso atual, terá alegadamente chegado aos humanos através de um pangolim.

“Acho que aquilo que a natureza nos tem vindo a dizer ao longo de 20 anos é que, ‘os coronavírus que vêm dos morcegos podem causar pandemias em humanos e temos de pensar neles como uma gripe com ameaças a longo prazo'”, diz Jeffery Taubenberger, virologista do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas.

O problema é que ao longo desses 20 e até milhares de milhões de anos, os vírus vão-se aperfeiçoando de forma a sobreviver sem viver — situação que está a causar a pandemia e a dificultar o trabalho dos cientistas em matar o vírus.

“A medicina moderna está constantemente um passo atrás dos novos vírus emergentes”, afirma a viróloga de Stanford Karla Kirkegaard ao jornal americano.

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O que é que é então preciso para acabar com o vírus?

Primeiro de tudo é preciso perceber que o vírus funciona através de nós: as proteínas deles são as nossas proteínas. As fraquezas deles são as nossas fraquezas e a maioria dos medicamentos que acabaria com eles, teria o mesmo efeito em nós. E uma vez que as proteínas produzidas pelo vírus no processo de replicação são exclusivas de cada tipo, os medicamentos que combatem uma doença geralmente não funcionam noutras doenças.

Por isso, de acordo com Alessandro Sette, chefe do Centro de Doenças Infecciosas do Instituto La Jolla de Imunologia, compreender as proteínas produzidas pelo vírus COVID-19 é a chave para desenvolver uma vacina eficaz.

Até ao momento os estudos apontam para o facto de que as proteínas da espícula da SARS, que desencadeiam uma resposta protetora ao sistema imunitário, podem ser eficazes para combater o SARS-CoV-2 (COVID-19), tornando-se assim um potencial componente para as vacinas.

E uma vez que o SARS mostrou comportamentos semelhantes ao SARS-CoV-2, significa que afinal o vírus pode não estar a evoluir assim tão rapidamente e os cientistas não estão tão atrás nas estratégias de combate.

Contudo, ainda que não haja para já uma forma de o combater, a viróloga Karla Kirkegaard refere que o vírus não quer realmente matar-nos e que a longo prazo, pode acabar por tornar-se num "hóspede atencioso".

Com isto, a viróloga quer dizer que, tal como por exemplo o vírus que causa herpes oral está com os humanos há 6 milhões de anos, o mesmo pode acontecer com o COVID-19 ou, por outro lado, pode extinguir-se tal como aconteceu com o SARS e o ébola.