Conceição Espada precisou de viver 30 anos intensos para perceber que alguma coisa tinha de mudar. A agitação apareceu-lhe cedo na vida. Aos 14 anos, por exemplo, precisou de cuidar da avó doente, era correio político do irmão que, na clandestinidade, lutava contra o Estado Novo e, ao mesmo tempo, estudava. O stresse estava instalado. E seguiu caminho, a acumular.

Casou muito cedo e desta união resultou um filha. Aos 25 anos separou-se e juntou-se a outra pessoa, com mais duas crianças. Abdicou da vida profissional (dedicada, na altura, ao turismo) e geriu tudo isto. Só que quando engravidou a segunda vez aconteceu uma coisa: começou a perder muito sangue e passou para aquilo a que chamou “outra dimensão”.

São as chamadas “experiências limite”, onde se passa por um túnel e se vê a chamada luz branca, num misto de sensações inenarráveis. “Senti a sobrecarga dos papéis”, diz à MAGG, numa alusão à vida anterior à experiência. “Depois tive um despertar muito grande e muito forte, daqueles que não permitem, na maior parte dos casos, que a pessoa volte atrás. A consciência é outra.

E assim foi. Conceição Espada, hoje com 59 anos, é a criadora de um modelo de gestão de stresse holístico, é especialista nesta área no SHA Welness Clinic, em Al Albir, Alicante, onde também já foi coordenadora do departamento de body and soul. Trabalha sobretudo junto das mulheres. Já lançou vários livros: “Manual de Gestão de Stresse para Empresas”, “Gerir o Stresse em Tempos de Crise”, “Estoy Ex-Stressada” e, mais recentemente, “Encontre o seu Equilíbrio”, este último editado pela Manuscrito e dedicado exclusivamente às mulheres.

O livro inclui exercícios para ajudar as mulheres a gerirem o stresse em diferentes frentes: laboral, na gravidez, no ciclo de vida ou no casal
O livro inclui exercícios para ajudar as mulheres a gerirem o stresse em diferentes frentes: laboral, na gravidez, no ciclo de vida ou no casal

“Quando uma mulher permite isto no século XXI não há revolução nenhuma social e política que resolva a igualdade de género”

“As mulheres estão mais cansadas, mas de uma forma geral toda a gente está mais cansada”, comenta, relativamente ao estudo "As Mulheres, Hoje", que foi publicado em fevereiro pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, que mostrou a realidade do sexo feminino em Portugal: ganham menos, trabalham mais e, assim, estão mais suscetíveis a problemas de ansiedade e de depressão.

Cansaço, salários e desigualdade. “Uma pessoa chega a casa do trabalho e ainda tem outro horário pela frente”
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“O que acontece é que as mulheres exteriorizam mais e dão sinais de alerta mais cedo do que os homens. Isto quer dizer o quê? Que os homens normalmente têm uma estrutura mental e educacional que só numa situação limite — com um burnout ou enfarte, por exemplo — é que percebem que estão mal." Nas mulheres manifestam-se outros sintomas, todos referidos no livro. Entre eles, estão aqueles apontados pelo estudo, como depressões, ansiedade, aceleração, cansaço extremo.

Porém, no caso da mulher, nota que se verifica uma acumulação de papéis. São trabalhadoras empenhadas em ser reconhecidas e valorizadas da mesma forma que os pares do sexo masculino, mas, por outro lado — um lado incongruente, talvez — permitem continuar a ser as protagonistas na vida doméstica. Gerem quase sempre todas as funções, continuando a educar os filhos — a matriz do problema da desigualdade, pensa — com o método da geração anterior. Ou seja, as circunstâncias em que os miúdos crescem não estão em linha com as exigências femininas feitas nas outras vertentes da sociedade.

Conceição Espada cresceu num ambiente atípico para a altura: a mãe foi das primeiras mulheres a licenciar-se em Económicas
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“Estão mais cansadas porque vivem cada vez mais papéis ao mesmo tempo. E continuam, a meu ver, a educar muito mal os homens. Quando uma mulher luta pela igualdade de género no trabalho, mas não educa os filhos tendo em conta os mesmos princípios, está tudo errado."

Trata-se do problema na superfície, mas a raiz, que permite que o erro se perpetue, continua a estar podre. São mais permissivas e um dos fatores, além de uma questão cultural, que as faz agir assim, refere-se a uma espécie de culpabilização por falta, não só de tempo, mas da qualidade do mesmo.

“Uma criança não tem de ajudar, tem de colaborar. As mulheres continuam a educar os rapazes de forma muito diferente”, diz. “E quando uma mulher permite isto no século XXI não há revolução nenhuma social e política que resolva a igualdade de género. A única hipótese passa pela atitude de mudar em casa na educação.”

Até lá, prove um pouco do novo livro "Encontre o Seu Equilíbrio", através de 5 estratégias para gerir o stresse.

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1. Respiração abdominal

“É a principal arma para a gestão de stresse, a chave fundamental”, refere Conceição Espada. “As pessoas esquecem-se que a respiração está ligada à qualidade de vida. Perdem o contacto com ela, com o corpo. Ficam fora de si e perdem o ritmo. A respiração permite-nos reconectarmo-nos com o nosso eu mais profundo.”

E porquê a abdominal? Porque a respiração que vem da zona do tórax tem o efeito inverso: faz-nos ficar mais ansiosas, porque é “mais superficial, mais curta, mais fechada.”

Faça assim: oito vezes ao dia, pare e faça dez respiração abdominais. O importante é que ao inspirar a barriga expanda e que ao expirar a barriga diminua, quase como se tocasse na coluna.

2. Exercício de relaxamento progressivo

O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias
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Não custa nada, ajuda a recuperar energia física e mental, revigora e, em cima de tudo, acalma-nos.

Faça assim: deitado no chão, de barriga para cima, e de olhos fechados, relaxe o corpo todo, de forma gradual, começando na cabeça e terminando nos pés, sem esquecer todas as outras partes assinaladas na imagem. Conceição Espada explica que é um excelente exercício para fazer “antes de dormir”, sobretudo para quem tem problemas de sono. Aponta ainda o final do dia, para fazer a transição entre a vida laboral e a doméstica, ou ainda à hora do almoço.

Mas há que respeitar regras. Execute este exercício sempre à mesma hora, porque “para o organismo e a mente introduzirem novos hábitos têm de ter ritmo.” Ou seja, "não podemos fazer hoje às 15 horas e amanhã às 22 horas”, porque “tem de haver rotina, durante entre 21 a 28 dias, para que os novos hábitos se introduzam.”

3. Pintar mandalas

“Ter um livrinho, uma caixa de lápis de cor e trabalhar a criatividade através da pintura”. É a sugestão de Conceição Espada. “É para pintar com calma, aproveitando os momentos em que a rotina se torna mais essencial, como a hora do almoço ou o final do dia.”  É “um utensílio de substituição” para desligar uma parte do cérebro, demasiado ativa, accionando outra, o que evita cortes bruscos que nos desorientam, mantendo-nos ativos.

4. Muito importante: as pausas do telemóvel

É um excelente para conciliar com o anterior. Enquanto estiver a pintar mandalas, desligue-se absolutamente do mundo tecnológico. Neste tempo não há espaço para mensagens, para feeds, para ouvir ou ver notificações.

“Um dos grandes fatores que contribuem para o aumento do stresse são as novas tecnologias”, refere. “As pessoas acham que ficam mais descontraídas, mas a verdade é que só gera mais agitação, porque estamos sempre alerta, a responder a estímulos. Quando o cérebro se habitua a isto, o stresse torna-se crónico e os níveis de ansiedade são tremendos.”

Faça assim: gradualmente, comece a apostar em tempos longe das tecnologias. “Podem começar com cinco minutos, depois dez, aumentar 15, para 30, até uma hora sem olhar para o telefone.”

5. Aposte no Chi Kung

“É uma terapia fortíssima que se tem de aprender muito bem”, diz Conceição Espada, numa alusão à prática do Chi Kung, uma disciplina da medicina tradicional chinesa, que pratica, diariamente, há 25 anos. Aqui utilizam-se técnicas cujo objetivo é treinar a energia interior (chamado chi), no sentido de lhe devolver o equilíbrio — físico, mental e espiritual. Mas esta arte deve ser aprendida com tempo, pelo que a especialista em gestão de stresse criou uma técnica mais simples e funcional, que qualquer pessoa pode praticar. “Com dois exercícios conseguimos reequilibrar a energia e estar em contacto com nós mesmos”, diz.

Soltar o corpo

O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias
O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias

“Com os joelhos flexionados, gire o corpo através da rotação das ancas, e rode os braços, ombros, pescoço e cabeça, tudo no mesmo sentido. Fazer suavemente, ou mais rápido, se estiver cansada e necessitar de estimular a energia.”

Abanar os ombros

O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias
O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias

Para fazer depois do anterior. “Sinta que a energia flui através do seu corpo, dando-lhe uma maior flexibilidade e soltando alguns bloqueios existentes na zona dos ombros e costas.”

Aqueça as mãos

O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias
O cansaço das mulheres, a desigualdade e a gestão do stresse em 5 estratégias

“Aqueça as palmas das mãos, uma na outra, sentido a sua própria forma de sentir a energia (pode ser calor, frio, dormência, peso); faça círculos à volta da cara como se estivesse a lavá-la. De seguida, sacuda os braços e mãos com força em direção à terra e relaxe as pernas. Como se estivesse a sacudir algo fora.”