Em março de 2020 tudo era desinfetado ou arejado: os produtos de supermercado eram lavados ou ficavam nos sacos durante dias, a roupa ia diretamente para a máquina de lavar, qualquer toque em botões de elevador ou corrimão era evitado.

A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e das agências de saúde pública continua a ser a mesma e toda cautela é necessária para evitar a contaminação. "O vírus que causa a COVID-19 espalha-se principalmente por meio de gotículas geradas quando uma pessoa infetada tosse, espirra ou fala. Também pode ficar infectado ao tocar numa superfície contaminada e, em seguida, tocar nos olhos, nariz ou boca antes de lavar as mãos", pode ler-se no site da OMS.

"Para se proteger, mantenha pelo menos 1 metro de distância de outras pessoas e desinfete as superfícies tocadas com frequência. Limpe bem as mãos com frequência e evite tocar nos olhos, boca e nariz."

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No entanto, quanto a esta última forma de contaminação, há poucas certezas. As provas de que a transmissão do vírus pode acontecer por via das superfícies, disse já um porta-voz da mesma organização, são "limitadas", salientando, no entanto, que esta continua a ser considerada "uma forma de transmissão possível", uma vez que é possível identificar o material genético do vírus nas zonas adjacentes à pessoa contaminada.

Mas isto não é suficiente para dizer com certeza que esta é uma forma de transmissão. Apesar de vários trabalhos terem indicado o tempo de permanência do vírus infecioso nas superfícies (seis dias no plástico, três em notas e seis em máscaras cirúrgicas), isto por si só não prova que pode haver contaminação por via do toque em superfícies. Tanto assim é que o americano Centro de Prevenção e Controlo de Doenças diz agora que a transmissão via superfícies "não é uma forma comum de o vírus de espalhar". 

É preciso testar a sobrevivência do SARS-CoV-2 fora do laboratório, diz um artigo da revista "Nature" de janeiro de 2021, que cita Emanuel Goldman, microbiólogo da Escola de Medicina Rutgers de Nova Jersey, nos Estados Unidos, que desde julho põe em causa este modo de transmissão, como se pode observar num artigo assinado pelo mesmo na revista científica "The Lancet".

“O ARN [material genético] viral é" o equivalente ao cadáver do vírus. Não é infeccioso”, disse à mesma revista.

Também uma investigação do Hospital Universitário Assuta Ashdod, em Israel, uma das poucas que estudou a transmissibilidade do vírus fora do laboratório, veio dizer o mesmo: metade das amostras de objetos de hospitais e de quartos de hotel onde pessoas infetadas fizeram quarentena tinham ARN, mas esse material genético não conseguia infetar as células. "Metade das amostras de dois hospitais e mais de um terço das amostras do hotel de quarentena foram positivas para RNA viral. Mas nenhum material viral foi realmente capaz de infectar as células."

Sem respostas fechadas, e sendo preferível "errar por excesso", como disse o mesmo microbiólogo, é preciso investigar mais, no sentido de as orientações serem mais claras.

“O que seria mesmo de valor era fazer mais investigação epidemiológica sobre os padrões de transmissão, seja em residências ou locais de trabalho. Não acho que tenhamos feito o suficiente quanto a isso”, considerou Henrique Barros, presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, citado pelo jornal "Público".

Só que, neste caso, o especialista alerta em sentido contrário, valorizando o contágio através de superfícies: acredita que foi colocado "demasiado ênfase" na transmissão por via aérea, tendo ficado esquecido o "papel das superfícies". É necessário "rever esta posição porque parte do insucesso também pode estar por aí."