A última vez que vimos a açoriana Mariana Rocha, 24 anos, na televisão, foi em 2013. Na altura, "Factor X", o programa de talentos da SIC, estava em antena e a artista tinha-se proposto ao escrutínio do júri e do público, que a permitiram chegar até à final, perdendo para o músico Berg.

Cerca de oito anos depois, Mariana, agora a concorrer ao "The Voice Portugal" da RTP — onde passou as provas cegas com a canção "Arcade", de Duncan Laurence, e escolheu ficar na equipa de Aurea — olha para a derrota sem qualquer dissabor.

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"Quando anunciaram o vencedor, a minha reação foi gritar: 'Yes'. Apesar de não ter vencido, estava tudo bem porque cheguei muito mais longe do que alguma vez achei que iria chegar", conta-nos. Afinal, recorda, quando decidiu inscrever-se no "Factor X", a ideia sempre foi encarar o programa com relativa normalidade.

"Irei chegar onde tiver de chegar", recorda ter pensado.

A passagem pelo "X Factor" e as digressões que se seguiram

"Ter chegado ao segundo lugar [do programa] com 17 anos acabados de fazer, para mim foi uma vitória gigante. Adorei estar em palco e poder viver, de forma tão intensa, a música. Foi sempre uma coisa que quis fazer. Não fiquei nada triste. Foi como se tivesse ganhado", diz em entrevista à MAGG.

Quando lhe perguntamos se sempre perspetivou uma vida na música, a resposta sai-lhe sem grande problema. "Desde miúda", responde, até porque começou a tocar violino com apenas oito anos e tinha a influência do pai, músico na banda militar dos Açores.

"Lembro-me de ser miúda e pensar que um dia iria ser capaz de cantar e tocar as minhas próprias canções. Isto, claro, muitos anos antes de sequer ter composto alguma coisa porque não fazia ideia como era fazer isso ou o que significava. Soube, sim, que era uma coisa que queria fazer."

Da vontade à prática, atualmente Mariana Rocha escreve as suas letras, compõe melodias para a guitarra e para o piano e chegou mesmo a subir a vários palcos além do do "Factor X" e, agora, o do "The Voice Portugal", da RTP.

"Cheguei a fazer uma pequena digressão pela Madeira e pelos Açores com a minha banda composta por músicos açorianos". Depois das ilhas, rumou para o Algarve e tocou, também, nos EUA durante uma gala de entrega de prémios de música lusófona. "Continuei sempre a fazer música. Alguns meses depois de o 'Factor X' ter acabado, o impacto do programa foi passando e foi difícil continuar a fazer concertos." Foi nessa altura, diz, que Mariana Rocha sentiu a necessidade de "ter outros trabalhos, sempre conciliando com a música".

"Cheguei a trabalhar em bares e restaurantes, mas sempre que estava livre em casa, estava a compor e a gravar coisas. Para mim, o trabalho era apenas uma maneira de gerar dinheiro", refere.

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E se, durante a infância, pensar em compor lhe parecia tarefa absolutamente difícil de executar, atualmente Mariana Rocha está mais do que habituada ao processo.

"Por vezes, basta ter uma só palavra na cabeça que depressa me surge a melodia, os acordes e as harmonias. Também acontece ter uma melodia na cabeça que, ainda sem ter qualquer letra associada, depois começo a construir o resto com a ajuda do piano ou da guitarra. Parece que as palavras vão aparecendo aos poucos", conta-nos sobre o seu processo criativo. "Depende muito do meu estado de espírito", sublinha, embora reforce que gosta de compor em estilos diferentes.

Mas se antes sentia que precisava de estar com o espírito certo para construir uma canção, atualmente já não é assim. Talvez seja sinal do crescimento interior enquanto pessoa, mas também enquanto artista. "Quando era mais nova, esperava muito até à inspiração chegar." Agora não precisa disso.

A conciliar a participação no "The Voice Portugal" com o terceiro ano de faculdade, já em Lisboa, Mariana Rocha ocupa ainda os seus dias com aulas de canto e de inglês a amigos. "A minha mãe sempre disse que devia ser professora porque tenho muito jeito para ensinar, mas não é bem a minha cena", conta, a rir-se.

Mariana Rocha encantou no
Mariana Rocha encantou os mentores do "The Voice Portugal" durante as provas cegas

A sua cena, sabemos, é a música. Daí que a participação no "The Voice Portugal" tenha surgido de forma tão natural. A inscrição, no entanto, foi incentivada por uma mensagem que recebeu no Instagram vinda de alguém que tinha gostado muito de a ver no "Factor X".

"[Essa pessoa] enviou-me a hiperligação para as inscrições do programa e disse-me que devia de me inscrever. Disse que sim, mas sem pensar muito naquilo. A conversar com amigos, contei-lhes dessa mensagem e eles disseram-me que me devia inscrever porque não tinha nada a perder. E ya, de facto, não tenho, pensei", recorda.

Sobre a experiência, só tem elogios a fazer. "No fundo, é isto que um artista quer: poder promover-se. Aconteça o que acontecer, só podem chegar-me coisas boas. A parte da competição talvez seja um bocadinho ingrata porque a verdade é somos muito amigos uns dos outros. Já fiz muitas amizades no programa e fico sempre um bocadinho triste pela parte da competição. Mas por outro lado, fico contente por poder conhecer pessoas novas e fantásticas que estão a vir para o mesmo do que eu", refere.

Saí dos Açores, mas os Açores não saem de mim. E onde quer que vá, as pessoas saberão sempre de onde venho por causa do meu sotaque e da minha forma de estar na vida

Sobre projeções para o futuro, Mariana Rocha diz-nos que, à semelhança da forma como encarou a sua participação no "Factor X", não tem quaisquer expectativas sobre o que possa vir a acontecer.

"Estou a encarar este programa da mesma forma que encarei o outro, na medida em que acredito que onde quer que chegue, já será ótimo. Tudo o que faço na vida, faço da melhor forma porque gosto de ser profissional e dedicada. Chegue onde chegar, sei que será porque dei o meu melhor. Claro que o objetivo é chegar o mais longe possível".

Trazer os Açores para a televisão generalista

Com chegar o mais longe possível, a concorrente refere-se à possibilidade de ganhar a competição. Se ganhar, "ótimo".

Mas se não ganhar? "Tudo ótimo, também. Está tudo bem", refere. Espera, no entanto, que a promoção e a visibilidade lhe permitam "continuar a fazer música" e viver dela. Além de o "The Voice Portugal" permitir a Mariana continuar a expressar o seu amor pela música, dá-lhe ainda a possibilidade de trazer para o ecrã um bocadinho dos Açores, onde nasceu e cresceu, representando a sua casa mesmo estando longe.

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"Há muito talento nos Açores, seja a cantar, a compor ou a ilustrar. Sinto que, muitas das vezes, pelo fator distância, é muito difícil sairmos dos Açores ou virem até aos Açores e conhecer o que somos. Acho fantástico poder contribuir para que as pessoas saibam o potencial e o valor que há lá", diz-nos.

"Por vezes, não temos tanta facilidade em chegar ao mainstream, mas Portugal é muito do que Portugal Continental. Saí dos Açores, mas os Açores não saem de mim. E onde quer que vá, as pessoas saberão sempre de onde venho por causa do meu sotaque e da minha forma de estar na vida."

Essa forma de estar, diz-nos, concretiza-se numa personalidade mais "brincalhona", que foi buscar à mãe "que sempre gostou muito de se rir e de conversar".

"Aquilo que sou e a forma de me relacionar com os outros tem muito que ver com o sítio onde nasci e cresci. Aqui, em Lisboa, creio que as pessoas são um bocadinho mais individualistas. Por isso, é bom as pessoas verem alguém na televisão que seja diferente, porque serve para conhecerem outras realidades."