O fim das férias, não do verão, pode levar-nos a estados de ansiedade maiores ou menores, consoante o emprego de cada um. Isto porque enquanto uns adoram o que fazem, outros sofrem todos os dias quando têm de enfrentar mais oito horas de um trabalho que detestam. Independentemente do caso, o regresso ao trabalho é sempre visto como algo negativo, quando não o tem de ser. Só precisa das ferramentas certas.
"Setembro parece que é quase um término e inconscientemente aumenta sempre o nosso stresse, a ansiedade, não só com os tempos que estamos a viver — será que os colégios vão fechar, não vão fechar? — como com o voltar às rotinas", afirma a psicóloga clínica Margarida Alegria à MAGG.
Além das incertezas, a pandemia trouxe uma nova realidade, o teletrabalho, que agora que deixou de ser obrigatório está a suscitar reações positivas e negativas. "Tenho adultos que nunca mais voltaram às empresas desde o início da pandemia, estão em teletrabalho, portanto, o stresse aumentou muito. Por outro lado, há os que vão regressar e só de pensarem como vai ser o convívio, não querem. Não há ninguém que fale de forma positiva sobre o regresso ao trabalho", continua.
O regresso pode mesmo manifestar-se no corpo, provocando cansaço, apatia e tristeza. No entanto, não tem de ser assim. Setembro é todos os anos um mês marcado por regressos — quer das escola das crianças, quer do trabalho — e deve ser visto como "um novo ciclo".
"É preciso encarar de forma positiva o trabalho, porque é uma coisa saudável que nos faz bem à mente. Ao social. Senão a pessoa acaba por estar muito isolada", refere a psicóloga sobre um dos efeitos do teletrabalho que atualmente já podemos contrariar.
1. Traçar objetivos para a rentrée
As férias conseguem ser ainda mais cansativas do que algumas semanas de trabalho, no entanto, é um cansaço diferente porque significa que foi recheado de brincadeira com as crianças, passeios, viagens e paisagens. O ideal será ter ainda alguns dias antes do regresso efetivo ao trabalho de modo a "minimizar os efeitos do cansaço pós-férias" ao "fazer um planeamento com antecedência, conseguir manter e executar pequenas tarefas diárias para manter o bem-estar pessoal em primeiro lugar", diz a psicóloga.
Diferente de cansaço é a depressão pós-férias "sobretudo para quem já não está satisfeito com o seu emprego atual", destaca Margarida Alegria. Para que isso não aconteça, traçar alguns objetivos para o novo ciclo pode ser a estratégia chave para que veja esta fase com outros olhos.
"Acho que é importante para todos nós, não só na rentrée, diariamente ou mensalmente, termos pequenos objetivos que seja". A psicóloga dá como exemplo arrumar uma gaveta, como já aconteceu com pacientes que tinham essa tarefa pendente e depois de a concluírem sentiram-se muito mais aliviados. Outra ideia é traçar como objetivo estar, pelo menos, uma vez por mês com um grupo de amigos ou fazer um programa sem filhos. Isso vai fazer com que comecemos a pensar que "está quase a chegar aquele dia" e não vivamos o dia a dia de forma tão negativa.
2. Criar rituais de prazer
10 a 30 minutos é o tempo que deve tirar para ter uns minutos para si. Afinal, o que são 10 minutos? Desde que os passe a fazer algo prazeroso, é o suficiente para revitalizar e deixar a cabeça livre do trabalho por uns instantes. Contundo, o "ideal era todos termos, no mínimo, 30 minutos por dia para nós, o que é quase impensável, mas se quisermos é possível", refere Margarida Alegria.
Pode dedicar esses minutos a uma caminhada ou simplesmente a apanhar ar, sugere Margarida Alegria, bem como a outras tarefas mais simples, habitualmente desvalorizadas, que podem ser o espape de que precisa. "Tenho pessoas que me dizem que relaxam a tomar banho. Ou no trânsito. Há pessoas que é a fazer desporto. O que seja", acrescenta a psicóloga, destacando que o importante é que cada pessoa pense no que lhe dá prazer e canalize uma hora do dia para isso.
No fundo, a ideia é "tentar fazer algo fora trabalho, um lazer, que não nos leve àquela rotina de trabalho, casa, tarefas domésticas", refere a psicóloga clínica. As crianças também podem fazer parte deste momento de prazer, fugindo à rotina de dar banho, jantar e deitar os filhos. "Brincar 10 a 15 minutos com as crianças no chão em vez de estarem nos tablets. 10 minutos não é nada e pode fazer muita diferença", remata.
3. Cinco dias de rotina, dois dias exceção todas as semanas
Temos tendência a ver o regresso às rotinas como o fim da liberdade. É verdade que é o fim dos banhos no mar (a não ser que goste da água gelada), das semanas passadas num resort com piscina mesmo ao lado e dos convívios que duram dia e noite. Mas os regressos não têm de ser uma sentença. A psicológica Margarida Alegria aconselha que se tente "fazer algo mensal ou estipular algo ao fim de semana" para fugir à rotina.
"Tem muito que ver com a parte económica, social e capacidade de cada pessoa", reconhece a psicóloga, mas não é preciso um plano megalómano. Se tiver possibilidade de passar uma noite fora, tanto melhor, caso contrário, basta uma ida ao cinema ou um piquenique num jardim da cidade.
4. Criar um momento especial ao domingo
Domingo é sempre um dia agridoce. É mais um dia livre, mas também aquele que antecede o que mais queremos evitar: a segunda-feira. Para algumas pessoas, não só é um fator que causa ansiedade, como faz com que a noite de domingo seja mal dormida. "Há muitas pessoas que ao domingo já entram em stress. Sofrem. Tenho pacientes que só aproveitam o sábado, mentalmente", conta a psicóloga sobre a experiência com os próprios pacientes.
Há formas simples de converter isso e nem precisa de sair de casa. A ideia é simplesmente programar algo diferente. "Ver um bom filme, fazer um jantar diferente, mesmo em casa, fazer algo que nos permita distinguir o dia da semana", sugere a especialista. "Às vezes até aconselho para que em vez de ao domingo jantarem na cozinha, para jantarem na sala, no chão, como um piquenique. E só isso às vezes faz a diferença", continua Margarida Alegria.
A psicóloga é mãe de duas raparigas, uma com três e outra com cinco anos, exemplos perfeitos de que esta dinâmica não só faz bem aos adultos, como às crianças. "[Elas] sabem que ao fim de semana, normalmente ao domingo, é dia de asneira. Ou pizza ou McDonald's. É o dia especial para elas", remata.
5. Puxar pelas crianças
Não são só os adultos que sofrem com o regresso ao trabalho. Setembro é também um mês de grandes mudanças para as crianças que passam a ter ou voltam às obrigações exigidas pela escola e pelos desportos que praticam. Uma vez que todos estão no mesmo barco lá em casa, nada como amenizar em família o impacto que o novo ciclo tem nas nossas vidas.
"Tenho famílias com adolescentes que adoram cozinhar. Uma delas tem 12 anos e ao domingo cozinha ela. São sempre ovos mexidos, mas fica no delírio de ser ela a fazer o jantar para a família", exemplifica a psicóloga sobre o momento que acaba por aliviar a ansiedade e até unir a família.