Às 14h35 da tarde de 27 de outubro de 1904, o presidente da Câmara de Nova Iorque, George McClellan, assumiu o papel de maquinista e sentou-se na carruagem principal. Era um dia histórico para a cidade: o autarca estava prestes a inaugurar a primeira linha metropolitana nova-iorquina, que tinha quase 15 quilómetros e 28 estações. McClellan entusiasmou-se tanto com a condução do metro que partiu de City Hall e só largou os comandos na 103rd Street.
É uma das estações de metro mais bonitas do mundo, queria ser a jóia da coroa do metro de Nova Iorque, mas está fechada há 77 anos. É esta a história curiosa de City Hall, também conhecida pelo nome City Hall Loop, que muitos desconhecem que permanece intacta por baixo do chão de Manhattan. Só abre ao público 16 vezes por ano — até pode parecer muito, mas conseguir entrar é uma sorte. Os bilhetes esgotam num instante.
Mas voltemos ao dia em que tudo começou. Às 19 horas, depois de o presidente da câmara terminar as respetivas formalidades da inauguração, as portas abriram-se para o público. Mais de 100 mil pessoas pagaram um níquel para fazer o seu primeiro passeio em Manhattan debaixo da terra.
Nos anos seguintes, o metro não parou de crescer. Em 1905 expandiu-se para o Bronx, em 1908 para Brooklyn e em 1915 para Queens. Hoje tem 24 linhas e um total de 468 estações. Todos os dias, mais de cinco milhões de passageiros recorrem ao metro para se deslocarem pela cidade.
Foi em City Hall que tudo começou. Nunca se tinha visto nada assim: repleta de elementos coloridos, imponentes candelabros e azulejos de vidro, a estação foi projetada para ser a estação modelo do novo metro de Nova Iorque.
Não tem uma única linha reta. Construída numa curva apertada, a arquitetura é toda curvilínea, das entradas aos tetos. Também não tem colunas na plataforma, algo habitual noutras estações. Pelo espaço é possível descobrir ainda clarabóias e lustres de latão.
Em certas partes da plataforma era possível ver a luz do dia, que entravam pelas três clarabóias de vidro de ametista cortada. Só foram tapadas durante a Segunda Guerra Mundial — por questões de segurança, tomou-se a decisão de cobri-las com alcatrão.
A estação foi projetada por Rafael Guastavino, um engenheiro espanhol que deixou um legado impressionante em Nova Iorque — foi ele quem desenhou, entre muitos outros espaços, o Oyster Bar, na estação de metro Grand Central; a Elephant House, no Zoológico do Bronx; ou o mercado da Queensboro Bridge.
Os arcos em tijolo tornaram-se a sua imagem de marca, assim como os azulejos Guastavino — sistema de azulejos abobadados. Guastavino morreu quatro anos depois de City Hall ficar pronta.
Talvez a estação de metro junto à Câmara Municipal de Nova Iorque tenha sido vítima da sua própria beleza. Nos anos seguintes, o metro tornou-se num meio de transporte diário para muitos nova-iorquinos. Em resultado disso, aumentou-se o número de carruagens e, consequentemente, o tamanho das plataformas. Só que aquela curva apertada de City Hall não podia ficar maior.
Havia outro problema. A distância entre a plataforma e as carruagens era mais extensa do que o normal, um resultado da curvatura da linha. Com a modernização do meio de transporte, e a colocação de portas em todas as carruagens, esse gap tornou-se perigoso para os passageiros.
Numa transição quase natural, as pessoas passaram a preferir utilizar a estação Brooklyn Bridge, que ficava mesmo ali ao lado e era maior e mais conveniente. Com uma redução drástica no número de utilizadores, em 1945, o seu último ano de vida, recebeu apenas 600 passageiros. Em média, menos de duas pessoas por dia usaram a estação.
A 31 de dezembro de 1945, City Hall fechou ao público. Foi a decisão mais lógica: remodelá-la estava fora de questão devido aos elevados custos que isso significaria para a câmara. Nas décadas seguintes, permaneceu fechada ao público.
Demoli-la não era uma opção, restaurá-la também não. O impasse só terminaria em abril de 1995, quando o dinheiro do subsídio federal permitiu reabrir a estação como uma filial do New York Transit Museum. Não demorou muito, infelizmente: com visitas ocasionais à estação, no final de 1998 percebeu-se que era demasiado arriscado mantê-la aberta devido à elevada probabilidade de um atentado terrorista na zona junto à Câmara Municipal em Nova Iorque. Os planos para o anexo do museu foram abandonados e acabaram-se as visitas.
Em 2006 foram retomadas. Atualmente acontecem 16 por ano, mas não é fácil conseguir um bilhete: é preciso ser membro do New York Transit Museum (49€ por ano, não é obrigatório ter cidadania norte-americana); tem de ser rápido a comprar a entrada (em meados de abril vão ser postos mais bilhetes à venda através do site) e pagar 41€ pelo ingresso. A tour tem a duração de 1h30.
Há outra forma de ver a estação. Pelo menos é o que sugere a Free Tour By Foot — mas tem de ter cuidado para não ser apanhado. A ideia é apanhar a Linha 6 em direção à baixa da cidade. O metro vai terminar na estação Brooklyn Bridge/City Hall, onde é pedido aos passageiros que saiam das composições.
A Free Tour By Foot dá a sugestão: mantenha-se dentro das carruagens (o melhor é baixar-se para não ser visto) e espere que o metro arranque outra vez — para voltar ao início da linha, o metro tem de passar pela estação City Hall. Infelizmente não vai parar, mas pelo menos vai poder ver de passagem uma das estações de metro mais bonitas (e secretas) do mundo.
*Texto originalmente publicado em 2018 e atualizado a 22 de outubro de 2022.