Em setembro de 2009, depois de sobrevoar o Parque Nacional Serengeti, na Tanzânia, João Rodrigues aterrou junto daquele que é o animal mais temido da Savana.
“Se o leão já tiver comido, estiver de barriga cheia, só quer é dormir e não ataca. Nem quer saber de ninguém”, conta João Rodrigues, um piloto de balões de ar quente que conduziu a MAGG num incrível passeio pelos céus do Fundão, organizada pela empresa Emotion. “Quando estão em movimento, a andar devagar, com a cabeça mais baixa do que o resto do corpo, é que são perigosos, porque significa que estão a caçar.”
Natural de Achada, uma aldeia do concelho de Mafra, João Rodrigues, 59 anos, teve contacto com aquele que viria a ser o seu local de trabalho quando, em 1992, os comandantes das tropas começaram a pensar numa forma melhor e mais barata de promover as tropas paraquedistas (onde se encontrava) sem ter de recorrer a aviões ou helicópteros.
“As demonstrações eram muito caras”, conta. “O balão estava ligado com o ar, era mais interativo, e poderia ser mais eficaz na promoção.”
Pediram dois voluntários e João Rodrigues foi um dos que se chegou à frente. Começou assim a aventura, numa altura em que mal se ouvia falar em balonismo em Portugal.
O primeiro voo aconteceu a 7 de novembro de 1992. Em 1999 foi para França tirar o curso de instrutor, mas, o mais impressionante começa anos mais tarde, em 2006, quando o turismo em Portugal tinha descido entre 65% a 70% e era difícil arranjar passageiros que rentabilizassem a atividade. É neste ano que parte para a Turquia, para ser um dos pilotos dos imensos balões que sobrevoam a Carpadócia e que formam um cenário idílico.
“O mais bonito são as formações rochosas de origem vulcânica, que são únicas no mundo. Os vales também são muito bonitos, tal como as caves subterrâneas ou as igrejas ortodoxas”, diz. “Entre 2012 e 2015, chegavam a voar 100 balões ao mesmo tempo e havia em média 2500 pessoas para voar todos os dias.”
Mas voltemos ao início. Depois de em 2007 regressar da Carpadócia (para onde regressou entre 2010 e 2015), surge outra oportunidade. Em março de 2008 estreia-se nos céus do Parque Nacional Serengeti, na Tanzânia, em voos suspensos sobre a vida selvagem. É aqui que se encontra a trabalhar atualmente, com um contrato que iniciou em maio de 2017 e que só termina em 2020.
O facto de não ser conduzido em direção faz com que se vejam sempre coisas diferentes. É como estar num miradouro que se move ao longo da paisagem."
Mesmo não conseguindo escolher um local preferido, admite que sempre adorou a vida selvagem e os animais, cujos gostos e hábitos já vai conhecendo.
“Tudo se consegue ver de um balão. Os animais mais perigosos em África são os hipopótamos — se alguém se mete nas suas carreiras de água sentem-se ameaçados e atacam — e os búfalos velhos que, por terem sido expulsos da manada pelos mais novos, ficam cheios de raiva e atacam tudo o que podem. Os elefantes também não gostam muito. Mas as zebras, por exemplo, não se assustam, exceto se ouvirem o barulho do queimador do balão.”
Para João Rodrigues, quer seja em África, na Ásia ou na Europa, todos os voos são fascinantes. “O facto de não ser conduzido em direção [só em altura] faz com que se vejam sempre coisas diferentes. É como estar num miradouro que se move ao longo da paisagem.”
Não trocava aquilo que faz por nada. “Sinto-me extremamente bem, relaxado quando estou a voar”, diz. “Na Tanzânia tomamos o pequeno-almoço na Savana e também fazemos churrascadas. O grupo de pilotos — dois do Canadá, um inglês e dois da Tanzânia — é muito unido e ainda há o resto do staff.”
“Os balões são a coisa mais segura de voar, desde que se observem as regras”, diz. É sempre ao nascer e ao pôr do sol que os balões de ar quente voam. Coincidentemente, as alturas mais bonitas do dia são as mais seguras para se voar. Ao não conseguir controlar totalmente a direção, é importante que o voo aconteça nos momentos do dia em que a atividade térmica é reduzida, de modo a que não influencie a viagem com mudanças de direcção repentinas.
Como o piloto só consegue controlar o balão em altitude, não é possível escolher-se um ponto exato de aterragem. Mas o conhecimento e a experiência ensinam. “Ter uma precisão exata do sítio não temos. Mas há previsões e estratégias: largam-se balões de festa para ver a direção do vento e, claro, há a perícia do piloto, que tenta aterrar num local, subindo e descendo o balão para que este mantenha a direção do ponto de aterragem previsto.”
Em 26 anos de pilotagem de balões de ar quente, nunca passou por nenhuma situação de perigo, mas em Barcelos, entre 1998 e 2000, não se recorda da data ao certo, João estreou uma ponte que ainda estava em construção.
“Aqui há uns anos, logo no inicio, pediram-nos para ir às festas da cidade de Barcelos. A ponte circular de Barcelos só estava meia construída. E foi lá que aterrei.”
Os balões de ar quente são o trabalho e os hobbie do piloto, que tem na sua bucket list os céus da Austrália e da Nova Zelândia. “Estou a fazer uma miniatura do balão que estou a pilotar na Tanzânia. O real tem 30 meros de altura e o que estou a fazer tem 1,60 metros. O cesto tem 25 centímetros. O real tem seis metros."
A admiração pelo céu apareceu em criança, nos tempos em que jogava à bola e brincava aos índios ou cowboys nas ruas de Achada. “Queria ser piloto quando era pequenino. Nasci no meio rural e lembro-me de ficar a ver os aviões passarem e de ficar fascinado com o rasto que deixavam.”
Não foi piloto. Mas foi paraquedista. E, até completar 64 anos, altura em que terá de se reformar, será piloto de balões de ar quente. O céu é o seu local de trabalho. E o cesto em que parte todos os dias é o equivalente às secretárias em que nos sentamos todos os dias. Inveja? Que ideia.