Maria Pereira dos Santos, de 38 anos e o marido, Luís Barroso, de 41, acabaram de chegar à Bahia, no Brasil, o país onde se conheceram no final de 2012. Entram na videochamada para conversar com a MAGG com ar visivelmente cansado, mas entusiasmado. O propósito da conversa é contarem mais pormenores sobre o projeto que têm em mãos: no final de 2023, vão pegar nos cinco filhos e partir à descoberta da Oceania.

"Ter seguro de viagem é tão importante como levar passaporte ou cartão de cidadão". Porquê?
"Ter seguro de viagem é tão importante como levar passaporte ou cartão de cidadão". Porquê?
Ver artigo

Juntos há uma década, Maria, fotógrafa de profissão, e Luís, engenheiro, são pais de Francisca, de 7 anos, Carolina, de 6, Luísa, de 5, Vasco, de 4 e Margarida, de 3. Vivem entre Portugal e os Estados Unidos, mais concretamente Austin, Texas, onde Luís é Head of Energy Asset Management na Siemens. E é no Instagram que Maria relata o dia a dia desta família numerosa e sempre em movimento.

Questionado sobre como é que as crianças reagiram a esta ideia de ir passar meio ano do outro lado do mundo, o casal ri-se. "Nós não somos os típicos pais que passam as coisas por eles para ver o que eles acham. Nós decidimos as coisas, eles vão e pronto (risos)!", conta Maria. "Eles não conhecem um mundo em que não se ande de um lado para o outro. Mas, ao mesmo tempo, não fazemos um big deal de nada", acrescenta a fotógrafa.

Luís Barroso recorda que, com apenas 5 meses, a filha mais velha já tinha estado em oito países diferentes. "Às vezes pergunto-lhe se quer ir fazer uma viagem e ela responde: 'sim, porque quero aprender todas as línguas do mundo e experimentar muitas comidas'", acrescenta Maria.

Apesar de estar sediada nos Estados Unidos, a família passa "quatro meses por ano" em Portugal. Os filhos estão habituados a viagens longas e a estarem em constante trânsito. "Quando a minha filha Francisca tinha 3 meses fui um mês para Moçambique com ela sozinha, Quando a Carolina, a minha segunda filha, tinha 2 meses e a Francisca 14, fui com as duas também para Moçambique sozinha", recorda Maria Pereira dos Santos.

A história de amor do casal já era premonitória daquilo que viria a ser o futuro, porque desenrola-se entre três continentes (América do Sul, África e Europa) e começa com Maria a tomar a decisão de deixar um trabalho para se mudar para o Brasil e estar mais perto do que viria a ser o futuro marido. "Despedi-me do meu trabalho por uma pessoa com quem tinha estado, ao todo, nem um mês. Achei 'logo se vê'. E desde aí tem corrido bem (risos)".

Apesar de serem ambos apaixonados por viagens, há uma dinâmica entre os dois, de equilíbrio entre família, trabalho e gostos pessoais, que é preciso gerir. "Acho que somos uma boa dupla porque temos mente de viajante, logo muito aventureira. Se houvesse um de nós mais conservador, seria difícil. A Maria é, sem dúvida, mais de arriscar do que eu. Mas a partir do momento em que nos conhecemos bem e sabemos quais são as nossas forças e fraquezas, acaba por se estabelecer uma relação de confiança", explica Luís Barroso, salientando que há uma alternância de liderança na dinâmica da relação, além do respeito mútuo e incentivo. "Nós somos os dois muito alfa. Somos muito competitivos e de gostar de estar no controlo da situação", acrescenta Maria. Para esta viagem à Oceania, Luís vai fazer "uma pausa" no trabalho na Siemens.

"Levar os filhos é uma condição implícita. Onde vai um vão todos", explica Luís. "E também não tínhamos onde os deixar (risos)!", acrescenta Maria, detalhando o porquê da escolha deste continente. "Do ponto de vista geográfico, é uma área do globo desconhecida para ambos. Eu vivi seis anos na América Latina, que corri de norte a sul, a Maria viveu em vários países africanos", recorda Luís.

O casal já percorreu em conjunto o sudeste asiático, o que deixava por conhecer o continente onde ficam países como a Austrália e a Nova Zelândia. "Irrita-me um bocado fazer o mesmo do que as outras pessoas. Não se vê muitas famílias portuguesas a viajarem para essa parte do mundo, sobretudo nas ilhas do Pacífico", acrescenta Maria. "Acho gira a ideia de irmos desbravar."

O "plano dinâmico" será passar três meses na Austrália e Tasmânia, três semanas na Nova Zelândia e três meses nas ilhas do Pacífico (que incluem arquipélagos como a Polinésia, Micronésia, países como a Papua Nova Guiné, Ilhas Salomão ou Vanuatu).

Veja um mapa da Oceania

oceania mapa

Luís conta que, desde que começaram a planear a viagem, já receberam convites de pessoas que conhecem, um deles para ficarem numa quinta na Austrália. "À medida que vamos abrindo esta caixa de Pandora, vão surgindo oportunidades para sairmos dos trilhos mais convencionais e tentarmos integrar e viver a cultura local, o que para nós é essencial."

O home schooling (ensino em casa, que é bastante comum nos Estados Unidos) será a forma de o casal colmatar a ausência física das filhas mais velhas, Francisca, Carolina e Luísa (esta última a frequenta o pré-escolar) do sistema de ensino. "Os professores, o que dizem é 'eles aprendem muito mais a fazer isso'. Na verdade, nem sequer são cinco meses que eles perdem porque as aulas começam em janeiro e terminam no final de maio", explica Maria.

Luís argumenta também a vantagem de levar os filhos nesta viagem. "Há um princípio que é importante pensar: o que é que nós queremos para os nossos filhos? Que estejam 20 anos a estudar dentro de uma sala de aula ou que sejam pessoas realizadas e felizes? Se a pessoa tiver em mente qual o objetivo final, toma uma decisão coerente com o objetivo final", explica o engenheiro. "Desenvolver relacionamentos interpessoais, estar exposto a culturas, terem de a ousadia de falar com alguém que não fala mesma língua, tudo são valências que dificilmente se aprendem na sala de aula. Se calhar vão perder uma coisa ou outra, mas achamos que compensa claramente", acrescenta o engenheiro.

O casal criou uma conta de angariação de fundos, que pode consultar aqui e que, até esta segunda-feira, 18 de setembro, tinha angariados cerca de 24 mil euros. Um livro, um ebook com vídeos serão alguns dos projetos que o casal quer fazer, e as contribuições na conta de crowdfunding dão direito a vários presentes, sendo o patamar mais alto, 1.000€, que dá direito a uma viagem com a família. O objetivo é, até 5 de outubro, chegar aos 30 mil euros.

"Claro que temos mais dinheiro do que a maior parte das pessoas mas não temos dinheiro a saltar. Fazemos muitas escolhas racionais"

Vamos a contas. Quanto é que custa uma viagem destas? "Isto é ridículo, mas não olhámos para isso", confessa Maria Pereira dos Santos. Da conta de crowdfunding, o casal espera poder retirar o fundo de maneio para as deslocações. "A fatia maior será a dos voos, que é possível que custem 2000 dólares [1.873€] por pessoa. Temos alguns pontos de cartões de crédito, que poderão ou não dar descontos, e o resto vai depender um bocadinho do que conseguirmos angariar até lá", explica Maria.

O casal explica que o teto máximo ronda os "80 mil dólares [75 mil euros]". A gestão de orçamentos apertados não é novidade para o casal, que viajou nove meses pelo sudeste asiático com um orçamento total de 13 mil dólares (12 mil euros). "Somos muito criativos a poupar", diz Luís.

Tem planos para setembro? Que tal uma viagem de grupo à Índia? Espreite o itinerário
Tem planos para setembro? Que tal uma viagem de grupo à Índia? Espreite o itinerário
Ver artigo

"Tenho medo de fazer as contas porque sou muito forreta (risos)", brinca Maria, dizendo que vão tentar fazer parcerias com marcas para reduzir o orçamento. Apesar desta atitude mais descontraída em relação ao planeamento e ao orçamento, Maria salienta que o casal tem "algumas poupanças". "Às vezes as pessoas dizem 'que sorte'. Não é sorte. Nós trabalhámos imenso para chegar aqui. Sempre poupámos imenso desde sempre. Na faculdade, por exemplo, eu nunca ia aos jantares. Eu ia ter aos jantares porque queria poupar para fazer isso. Se eu sentir que vou poupar 10€, vou poupar."

Maria recorda que uma das viagens em família que fizeram para o Panamá, onde passaram 15 dias custou, no total 6.200€. "Há muita gente que diz 'mas a maior parte das pessoas não tem esse dinheiro'. Não é isso que está em causa. Claro que temos mais dinheiro do que a maior parte das pessoas, mas não temos dinheiro a saltar. Fazemos muitas escolhas racionais", salienta a fotógrafa.

Apesar das profissões e da vida confortável, o casal salienta a importância de uma gestão frugal do dia a dia, precisamente com o objetivo de mostrar aos filhos que as coisas não acontecem de mão beijada. "Não damos presentes aos nossos filhos, nem no Natal nem nos anos. Temos festas de anos com muita gente, recebem montes de presentes, e achamos que eles não precisam de mais nada. Não compramos roupa, exceto muito raramente. Compro roupa igual para todos. Este ano, por exemplo, comprei quatro vestidos iguais que custaram, no total, 40€". Algo corroborado por Luís. "Começámos a trabalhar muito cedo, seja nas férias, seja durante a escola. Dá muito trabalho mas depois colhes os frutos. No dia a dia - e essa é parte em que a Maria é fortíssima - é extremamente frugal". A mentalidade da poupança "está presente no dia a dia" do casal. "Nós somos muito terra a terra", diz o engenheiro.

Maria tem atualmente 48 mil seguidores no Instagram e explica que, durante a viagem, vai manter a dinâmica atual, onde relata o dia a dia da família, "com zero floreados e muito pão, pão, queijo, queijo".

"Vamos começar a fazer vídeos, vai ser a profissão do Luís (risos)", conta. A fotógrafa, que é quem capta todas as imagens colocadas nas redes sociais, revela que imprime tudo o que escreve. "Quero deixar aquilo aos meus filhos, para eles depois lerem como é que foram as coisas. É como um álbum de família, mas com textos". Luís explica ainda que o propósito da viagem será também mostrar o estilo de vida como "uma alternativa fora da caixa" a um dia a dia mais convencional.