Já se sabe que os pulmões e o sistema respiratório são os mais afetados pelo novo coronavírus. Os vários estudos que têm sido feitos com doentes e recuperados dão conta de que o vírus entra pelo nariz ou pela boca e que danifica todas as estruturas por onde passa até encontrar os pulmões. Por isso, muitas das vezes é necessário recorrer a ventiladores para que a respiração fique assegurada. Mas é possível que a COVID-19 não afete só os pulmões mas também outros órgãos como o coração, os rins e até o fígado ou o cérebro. O alerta vem de especialistas de todo o mundo que asseguram que estes casos são poucos, mas que ainda assim merecem atenção.
Ainda que tenham sido feitos poucos estudos sobre o assunto, os cientistas têm conseguido perceber que para além dos pulmões, o coração e os rins são outros dois órgãos afetados. Isto não é só verdade em pessoas com doenças nestes órgãos, mas também foi verificado em indivíduos saudáveis. Mais uma vez, isto acontece com pouca frequência.
No que toca ao coração, os problemas podem surgir direta ou indiretamente, conforme explica Ángel Cequier, presidente da Sociedade Espanhola de Cardiologia, ao “El País”. “Há jovens que vêm ao hospital com uma imagem semelhante a um enfarte do miocárdio, mas com as artérias coronárias bem. O que eles têm é uma miocardite”, explica. Miocardite é uma inflamação do tecido muscular do coração que provoca a morte dos tecidos. Outra possibilidade, explica o médico que trabalha no hospital de Bellvitge, em Barcelona, é uma inflamação de uma parte das artérias que provoca a instabilidade da placa do colesterol mau. Estas placas podem “desprender-se e podem causar um ataque cardíaco se obstruírem a artéria”.
Poderá ainda acontecer outra situação. Por haver falta de oxigénio nos pulmões devido à infeção de COVID-19, o coração tenta compensar esse processo ao acelerar e bombear mais sangue. Isto é algo que ocorre mais frequentemente e que deve ser tido em conta por pessoas hipertensas, que sofram de diabetes ou de doenças cardiovasculares já que nestas pessoas esta situação pode “deteriorar o coração muito rapidamente”.
Mas nem só em Espanha se fala disto. Também no Reino Unido 80 médicos do serviço nacional de saúde explicaram ao “Financial Times” que estão a ver sinais de que o novo coronavírus não ataca só os pulmões mas que também estão a verificar “altas taxas de insuficiência renal aguda”.
A mesma publicação, que cita o jornal italiano “Corriere della Sera”, explica que, no Reino Unido, dos 690 doentes hospitalizados nos cuidados intensivos, 25% precisaram de suporte cardiovascular, 18,5% de diálise e que 4% precisaram de suporte neurológico.
Conforme indicam estas percentagens, outro órgão que poderá sofrer alterações são os rins. Neste caso, é preciso ter especial atenção com aqueles que sofrem de insuficiência renal ou que já realizaram um transplante. Este órgão é afetado porque tem exatamente os mesmos recetores do vírus que os pulmões têm e que servem de porta de entrada para o vírus. Quando expostos, pode ocorrer a destruição e inflamação dos tecidos, o que poderá levar a casos de insuficiência renal, conforme explica Roberto Alcázar, membro da Sociedade Espanhola de Nefrologia ao “El País”. “O efeito do vírus pode ser muito tóxico, sendo que os pacientes chegam ao hospital muito desidratados”, continua. Vários estudos avançam que a possibilidade de doentes hospitalizados virem a desenvolver uma insuficiência renal varia numa percentagem entre os 0,5% e os 7%, explica a mesma publicação. Tal como acontece com o coração, os resultados podem estar alterados mas o paciente não ter manifestações.
É possível, ainda que com menos frequência, que o fígado e o cérebro também sejam outros dois órgãos afetados. O “El País” avança que existem estudos que explicam que existem valores alterados mas que não há efeitos do mesmo. Isto ocorre também em pessoas que não tinham registada doença hepática antes desta infeção.
Já no cérebro, os danos cerebrais são manifestados. Num estado publicado pela revista “Radiology” e citado pelo jornal “La Verdade”, é possível que os doentes registem também manifestações neurológicas, ainda que num grau menos elevado. O exemplo é dado por um caso de uma mulher com COVID-19 que desenvolveu uma doença cerebral chamada encefalopatia necrosante aguda – uma doença que pode ser desencadeada por infeções virais. Este é um caso raro, que precisa de mais investigação, mas que é uma reação semelhante ao que pode acontecer com outros tipos de vírus. Esta situação poderá ainda estar relacionada com alguns dos sintomas como a perda do sabor e do olfato.