As escolhas anuais de leitura de 2020 de Bill Gates já foram anunciadas e, entre as sugestões, inclui-se um livro sobre a pandemia que explodiu em 1918, que ficou conhecida como Gripe Espanhola. Publicado em 2004, chama-se "The Great Influenza", é assinado pelo autor John M. Barry e relata como é que foi viver com o influenzavírus H1N1 que, até 1920, matou 50 milhões de pessoas em todo o mundo.

Não foi a primeira vez que o fundador da Microsoft leu este livro. Mas decidiu relê-lo para "refrescar a memória sobre as realidades e lições daquela pandemia devastadora". 

Depois de recordar as palavras de Barry, Bill Gates — que já havia previsto que seríamos alvo de um vírus novo  —considerou que "o mundo deveria ter feito um trabalho melhor para se preparar contra novos patogénicos".

Estas são as quatro lições que o mundo deveria retirar a partir da pandemia do início do século XX.

Os líderes têm o poder de diminuir a severidade da pandemia

É o primeiro ponto que Bill Gates destaca: a liderança é importante e capaz de fazer a diferença. Pessoas encarregadas de controlar a pandemia são capazes de mudar a trajetória da doença e diminuir o número de vidas perdidas, dando como exemplo a acção dos presidentes da câmara na época da Gripe Espanhola.

Em St. Louis, nos Estados Unidos, por exemplo, o presidente da câmara ordenou o fecho de locais públicos e proibiu ajuntamentos. Já o da Filadélfia, organizou um grande desfile para comemorar o esforço da Primeira Guerra Mundial, que tinha chegado ao fim, resultando no aumento do número de mortes nos dias seguintes. 

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"Os agentes funerários, que também estavam doentes, estavam sobrecarregados. Não tinham sítio onde colocar os corpos. As áreas de trabalho dos agentes funerários estavam a transbordar, eles empilhavam os caixões nos corredores, nos seus aposentos", escreveu Barry, citado pela "Insider".

Na atualidade, temos vários exemplos de países que implementaram medidas eficazes e, por outro lado, o impacto do atraso na imposição de medidas de confinamento e de Estado de Emergência. Neste último ponto, pode dar-se como exemplo o Reino Unido, que retardou o confinamento obrigatório, tendo o próprio primeiro-ministro Boris Johnson sido infetado com a doença, o que levou a que tivesse estado internado nos cuidados intensivos. Até á data, houve 246 406 casos positivos e 34 796 mortes.

Suavizar más notícias só piora a pandemia

Bill Gates também destacou o facto de ser importante transmitir notícias de forma rigorosa e precisa ao público, mesmo que sejam más.

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Suavizar não é boa ideia, porque retira gravidade à doença o que, consequentemente, gera menores níveis de precauções de segurança. "Em 1918, os líderes políticos dos Estados Unidos — até os comissários de saúde — adoçavam as más notícias para evitar o pânico público", escreveu Gates. "Isso minou muito a sua autoridade quando os cidadãos começaram a ver amigos e vizinhos a morrer."

Vejamos o caso dos Estados Unidos. O presidente Donald Trump desvalorizou o impacto e gravidade da doença e o número de infetados e de óbitos por COVID-19 é avassalador:  1 537 830 casos positivos e 90 694 mortes.

A filantropia pode salvar centenas de milhares de vidas

Sem as doações de John D. Rockefeller e Johns Hopkins as coisas poderiam ter corrido de forma muito diferente. As contribuições de solidariedade são fundamentais: na Gripe Espanhola, esses filantropos ajudaram a criar escolas de saúde pública e sistemas de educação que desempenharam um papel crucial, até aos dias de hoje, nos campos da medicina e da ciência.

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Veja-se o exemplo de Jack Dorsey, CEO do Twitter: doou 28% da sua fortuna, ou seja, mil milhões de dólares (cerca de 926 milhões de euros), com o objetivo de financiar a recuperação económica e social pós-pandemia.

Sem respostas para lutar, a sociedade tem de se unir

Segundo Barry, as pandemias são experiências que nos lembram do quão vulneráveis e frágeis somos. A vacina para a Gripe Espanhola só surgiu em 1933, 15 anos depois de a pandemia explodir e 13 anos depois de já ter terminado.

"Desta vez, temos muito mais ferramentas à nossa disposição para criar vacinas e terapêuticas eficazes. Mas a ciência ainda é mais lenta do que qualquer um de nós gostaria, e pôr um fim a esta pandemia exigirá mais do que apenas uma ciência incrível", disse Gates. "Também será preciso muita vontade política, especialmente encorajando o distanciamento social e garantindo que os milagres científicos cheguem tão longe quanto o próprio vírus."