Não vale a pena ir reclamar para uma qualquer plataforma de avaliações de hotel caso fique hospedado no quarto de hotel criado pelo designer Christopher Samuel. É difícil entrar na cama, onde dificilmente uma pessoa alta se sente confortável. A porta da casa de banho não fecha e atrapalha o momento de pegar no rolo de papel higiénico. Há ainda o dispensador de gel, virado ao contrário.
Fica em Blackpool, Inglaterra, e ainda que possa soar a piada, o objetivo é bastante sério. O quarto, parte do projeto artístico Art B&B (que se materializa numa boutique hotel-galeria, em que todos os 19 quartos foram pensados por artistas) foi projetado para ser o mais irritante possível, mas com um propósito. Samuel quis, em parte (há mais, mas já lá vamos), mostrar aos visitantes os obstáculos que pessoas com deficiência têm de enfrentar em espaços não preparados para as suas limitações.
"Eu sabia que as pessoas iam achar divertido no início, mas, na realidade, quando se vive assim todos os dias deixa de ser engraçado", disse o designer, citado pela "BBC". "É inconveniente, frustrante, às vezes é humilhante."
O inglês sediado em Leicester sabe do que fala. Desde 2017 que está numa cadeira de rodas elétrica e durante três meses teve de viver num quarto de hotel inacessível a pessoas com mobilidade reduzida, que lhe foi dado como habitação de emergência.
O sítio provisório em que ficou não estava minimamente preparado para a sua nova condição. O espaço era pequeno e não o deixava mover-se livremente. "Estava muito apertado", descreve. Não conseguia entrar e sair com facilidade e não se conseguia sentar à mesa.
Há mais. E pior: "Tive que dormir na minha cadeira de rodas — não conseguia usar a cama. Não consegui fechar a porta da casa de banho. Não consegui usar a sanita. Precisei usar um balde. Não pude tomar banho porque havia um chuveiro, que não era acessível."
Sobre o quarto que criou e a que deu o nome de Welcome Inn, explica que à primeira vista pode parecer "divertido e teatral", mas que "é real".
O objetivo do trabalho é colocar os outros no papel de quem passa por estas dificuldades."O ponto principal é que essa conversa seja realizada e que as pessoas pensem sobre isso", explica.
Além da cama de difícil acesso e da complicada porta da casa de banho, também o acesso aos interruptores para as luzes ou televisão é dificultado, assim como o acesso à mesa ou cadeiras. "Qualquer pessoa com cadeira de rodas saberá que, quando vamos a lugares que têm mesas e cadeiras, muitas vezes não conseguimos ficar abaixo delas — ou elas ficam muito altas ou barra no meio da mesa, que faz com que seja preciso ficarmos de lado", explica Samuel. "São pequenas coisas assim."
Antes do Welcome Inn, Samuel trabalhou noutro projeto relacionado com dificuldades inerentes às casas. Chamava-se "Crise de Habitação" e inclui imagens com alguns dos 500 emails que foram trocados no processo por que passou, que incluía mensagens com os advogados e os concelhos locais.
Mas isto é mais do que um trabalho sobre as dificuldades enfrentadas por pessoas com deficiência. "O trabalho é sobre uma questão mais ampla que nasce da austeridade e da crise imobiliária, que faz com que haja cortes nos concelhos", explica. "As pessoas que mais sofrem são as mais vulneráveis — os deficientes e os idosos, que estão a ser expulsos da sociedade".
O quarto que desenhou foi encomendado pela Unlimited, uma organização artística que apoia trabalhos de artistas deficientes, e pela Art B&B, que abriu como alternativa aos outros alojamentos Bed & Breakfast tradicionais, instalados na beira-mar de Blackpool.