Filipa Martins fez história nos Jogos Olímpicos de 2024. A ginasta tornou-se, este domingo, 28 de julho, na primeira atleta portuguesa da história a apurar-se para a tão aguardada final da competição de all-around de ginástica artística, no certame desportivo. Está, por isso, entre as 24 melhores do mundo, muito graças ao salto arriscado que executou: um Yurchenko com dupla pirueta.

A ginasta portuguesa terminou a prova, que reúne salto, trave, barras assimétricas e solo, e ficou na 17.ª posição, com 53.166 pontos, resultado alcançado graças aos 14.133 obtidos nos saltos, aos 13.800 nas assimétricas, aos 12.600 na trave e aos 12.633 no exercício de solo. Foi uma classificação mais do que suficiente para garantir uma vaga na fase final, para a qual só se apuram 24 de 60 atletas.

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Isto significa que Filipa Martins vai ter a oportunidade de lutar por uma medalha contra lendas da ginástica, como é o caso da norte-americana Simone Biles, que regressou aos Jogos Olímpicos este domingo e está entre as favoritas para ocupar o primeiro lugar do pódio. A final está agendada para quarta-feira, 1 de agosto, a partir das 17h15 (uma hora a mais em Paris).

"Neste momento, estou um bocadinho emocionada ainda. Acho que hoje, aqui, fizemos algo que nunca imaginámos fazer na vida, na ginástica portuguesa. Acho que nos superámos a todos os níveis e estou super orgulhosa do nosso trabalho", disse a atleta de 28 anos, no rescaldo do apuramento, citada pelo "Diário de Notícias".

Mas, afinal, quem é Filipa Martins? Esta é a primeira vez da atleta nos Jogos Olímpicos? Que mais distinções tem no currículo? E, se o salto que executou é tão arriscado, porque é que o fez e desde quando está a treiná-lo? Nós temos as respostas a estas e outras questões, para que possa ficar a conhecer melhor a atleta, que está a levar o nome de Portugal além fronteiras.

Bateu o seu próprio recorde nos Jogos Olímpicos

Aos 28 anos, a ginasta natural do Porto tem um currículo recheado. Por exemplo, esta é a terceira vez de Filipa Martins nos Jogos Olímpicos – mas, desta vez, bateu o recorde que já detinha. A atleta era já a detentora da melhor classificação portuguesa nesta competição, quando, em 2016, foi a 37.ª classificada, no Rio de Janeiro.

Em 2021, em Tóquio, no Japão, não foi além do 43.º posto. Isto significa que a atleta portuguesa, embora continuasse a registar resultados incríveis e históricos em nome do País, nunca se tinha apurado para a final das olimpíadas – o que, este domingo, 28 de julho, mudou, garantindo o 18.º lugar e a melhor prova da sua carreira, de acordo com a mesma.

Mas estas não são as únicas distinções com que o seu currículo conta. A ginasta do Acro Clube da Maia, em 2015, já tinha conquistado duas medalhas de bronze na Taça do Mundo de Cottbus, na Alemanha, uma medalha de prata na Taça do Mundo de ginástica artística, em Anadia, e a medalha de bronze na trave na 28.ª edição das Universíadas, em Gwangju, na Coreia do Sul.

Além disso, já era também a primeira e única portuguesa a chegar a finais por aparelhos em campeonatos mundiais, nas paralelas assimétricas (oitava), em Kitakyushu, em 2021, quando também disputou pela primeira vez a final do All-around (sétima), um feito que repetiu, em 2023, em Antuérpia (21.ª).

Está a treinar o salto desde 2014

O Yurchenko com dupla pirueta consiste uma rondada com "flic" por cima da mesa e um mortal com, tal como o nome denuncia de imediato, duas piruetas. Este é um salto "tão arriscado" que há "sempre medo de o meter em competição", disse a atleta, citada pelo "Jornal de Notícias".

A verdade é que este é um segredo que a atleta anda a guardar desde 2014, altura em que começou a treinar este salto. Levava-o escrito num caderninho, que ia consigo para os treinos. Contudo, decidiu pô-lo em prática, embora pudesse, em caso de erro, ditar o fim da sua carreira.

"Aos 28 anos, pô-lo em competição... não temos palavras. Estávamos com medo. É difícil e arriscado", continuou a atleta, no rescaldo da prova. E o risco não só compensou, como pode vir a dar-lhe uma medalha. "Para mim, foi o auge", continuou a ginasta, dizendo este feito poderá abrir horizontes em Portugal, por mostrar que é possível "não fazer só aquilo a que estamos habituados".

Tem um gesto técnico com o seu nome

Além das classificações obtidas em competições, Filipa Martins alcançou uma proeza rara no mundo da ginástica: tem um movimento homónimo inscrito no Código oficial. É a única ginasta portuguesa a ter tal honra, fazendo com que se insira numa lista de atletas que não só competem num alto nível, mas também inovam e deixam um legado duradouro no desporto.

Foi a 24 de abril de 2021 que a ginasta apresentou, oficialmente, o movimento, intitulado "Martins", no Campeonato da Europa de Ginástica Artística em Basileia, Suíça. Este momento marcou a entrada de Filipa Martins numa elite restrita da ginástica mundial, destacando o seu talento e criatividade no âmbito da modalidade.

De acordo com o "Sapo Desporto", a criação deste gesto técnico surgiu de maneira inesperada durante a pandemia da COVID-19, quando a atleta e a sua equipa aproveitaram o período sem competições para experimentar novos elementos. "Não foi algo pensado, de todo," explicou Filipa Martins, citada pela mesma publicação, reiterando que, num momento de incerteza e transformação global, a inovação falou mais alto.

Inicialmente, a equipa não sabia se o gesto técnico seria viável ou se valeria a pena o risco. Contudo, depois de descobrirem que era inédito e, portanto, elegível para ser adicionado ao código de pontuação, a determinação de Filipa Martins cresceu. Quase um ano depois, a apresentação pública do "Martins" consolidou a ginasta como a melhor de Portugal, elevando o nome do País no cenário internacional.

Começou na ginástica aos 4 anos (e o fim pode estar próximo)

A jornada de Filipa Martins no mundo do desporto começou em tenra idade, mais precisamente aos 4 anos, graças ao incentivo dos pais. Inicialmente, no infantário, praticava várias modalidades, até que uma amiga da família, que trabalha na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, onde a atleta é estudante do Mestrado em Treino Desportivo – Treino de Alto Rendimento e Treino de Jovens, teve uma proposta para si.

A amiga dos pais estava ligada ao Futebol Clube do Porto e sugeriu que a jovem experimentasse o clube. Assim foi e lá permaneceu até 2019, dando os primeiros passos num percurso que a levaria a ser a maior ginasta portuguesa de sempre, fruto de muito esforço e dedicação, valores pelos quais sempre se regeu.

Desde cedo, a atleta mostrou ter talento, mas a própria nunca pensou que fosse ter uma carreira cheia de feitos. "Nunca imaginei chegar onde cheguei", disse Filipa, citada pela "Sapo Desporto", revelando ainda que o seu objetivo inicial não era nada mais do que ser campeã nacional. Apenas na adolescência, com a participação em competições internacionais, é que os Jogos Olímpicos entraram em cena.

Entretanto, depois da participação em vários certames nacionais, internacionais e de três Jogos Olímpicos, o fim pode estar próximo – afinal, é das mais velhas da lista de participantes na prova individual de ginástica artística em Paris. "Depois destes Jogos, não sei se continuo ou se paro", disse a atleta citada pela mesma publicação, acrescentando que é algo que já lhe passa pela cabeça há algum tempo, fruto das mazelas físicas e psicológicas que a modalidade lhe deixou.

Não treina sem dores nos pés e já foi submetida a cinco cirurgias

"Estes últimos anos não foram muito fáceis para mim, nem para as minhas lesões", disse Filipa Martins, citada pela Renascença. Depois de 24 anos a treinar, é inevitável que assim seja – e, de facto, já não consegue treinar sem ter dores nos pés. E há dias em que essas mesmas dores são insuportáveis, pelo que não pode treinar.

"São sempre as lesões que me impedem de treinar como eu quero e como eu gosto, para atingir aquilo que eu quero", continua a ginasta, citada pela rádio. E a verdade é que já foi submetida a várias cirurgias, pelo que isso também vai afetar, inevitavelmente, o seu desempenho na modalidade.

No total, a ginasta do Acro Clube da Maia já fez cinco operações nos tornozelos – até agora, foi submetida a quatro intervenções num e uma no outro. Este é o resultado de um desporto em que o maior risco se dá no momento em que os pés voltam a tocar no chão com grande intensidade.

"É um processo um bocado de aceitação, de que com a minha idade e com tantos anos de ginástica, o corpo já comece a sentir e, principalmente, perceber que não vai dar para treinar como eu queria, por isso, sempre que consigo treinar sem tanta dor, tenho de fazer aquilo da melhor forma que posso. É difícil", frisou, citada pelo "Sapo Desporto".