Em Portugal, a palavra nem cinco anos tem. Mas hoje é rara a recém-mãe que ainda não se confrontou com o babywearing e as respetivas consultoras. O conceito significa uma forma de carregar os bebés junto ao corpo, permitindo a quem transporta a criança mais liberdade para desempenhar outras funções, ao mesmo tempo que pode dar colo e mimo à criança.

Pode parecer uma simples explicação para definir esta tendência, mas este é um assunto um tanto ou quanto polémico no mundo da maternidade, muito devido às divergências de opiniões sobre as diferentes opções de porta-bebés disponíveis no mercado.

Entre slings, panos e marsúpios, os porta-bebés são muito diferentes e nem tudo é recomendado — e é precisamente no aconselhamento que o babywearing causa discórdia.

A série que todas as mães (e pais) deviam ver
A série que todas as mães (e pais) deviam ver
Ver artigo

O marsúpio (uma espécie de mochila almofadada), por exemplo, é recomendado por alguns pediatras e fisioterapeutas, mas é uma opção completamente proibida e fortemente desaconselhada pelas consultoras de babywearing, que os consideram prejudiciais para o desenvolvimento da ancas dos bebés e nada ergonómicos.

"Os marsúpios podem causar luxações da anca, pois os bebés estão com as pernas penduradas (havendo pressão na zona dos genitais) e a baterem nas pernas de quem o transporta, quando em andamento", afirma Catarina Teles, consultora de babywearing, à MAGG, que salienta a importância "de um porta-bebés dar apoio de joelho a joelho, criando então uma posição de 'sapinho' (rabo abaixo dos joelhos, ficando a anca como se formasse um M), pois o desenvolvimento correto da perna e da anca passa por existir esse ângulo entre o fémur e o acetábulo, coisa que nao acontece com um marsúpio."

“O Babywearing é para quem, essencialmente, sente necessidade e quer dar colo aos bebés, sendo uma alternativa ao colo tradicional”, explica Alice Amieiro Pinho, consultora de babywearing.

Para além desta ser uma prática que oferece liberdade de movimentos para quem transporta a criança, a fisioterapeuta Sofia Cardante explica que “o bebé está mais confortável, para além de que, para a mãe, diminui o vazio da perda da barriga preenchida pelo bebé”.

No entanto, há quem não se tenha adaptado a esta forma de transporte e não a considere assim tão prática. É o caso da psicóloga Diana Sousa, de 29 anos.

“O babywearing não é a minha forma primordial de transportar o meu filho. Há a questão da transpiração que se torna incómoda para ambos, o problema e dificuldade de colocar o pano sentada no carro, o facto de em pleno inverno não dar jeito estar com o bebé ao frio enquanto se coloca o pano quando saímos do carro, entre outros problemas de logística”, conta à MAGG Diana Sousa.

A psicóloga acrescenta também que, apesar do babywearing ter ajudado muito na fase das cólicas, “tem coisas menos boas e não tão práticas que levam a que não tenha sido até agora o nosso meio principal de transporte, para além de que dispenso o fanatismo ao redor do tema. Por vezes, parece que quem não o faz constantemente é imediatamente catalogada como alguém que não dá colo”, conclui Diana Sousa.

Ao contrário dos pediatras, por exemplo, as consultoras não têm a sua atividade regulamentada. Não existe a profissão de consultora de babywearing. Mas são estas as pessoas mais procuradas pelos pais que desejam carregar os seus bebés desta forma, recorrendo às consultoras e cada vez menos a especialistas médicos.

Consultoras de babywearing. Quem são?

"Uma consultora de babywearing é alguém que estuda o desenvolvimento do bebé (desde o nascimento até a criança andar), estuda os diferentes tipos de porta-bebés, malhas, tipos de tecelagem, composição, matérias primas (fibras naturais e sintéticas), portes e situações, e tenta demonstrar a mães, pais, avós, etc, qual será então o porta-bebés que se adequa à família e às suas necessidades”, afirma Catarina Teles.

Catarina, de 31 anos, trabalha a full-time como engenheira em Viena, na Aústria, é consultora desde março de 2017 (e usuária desde junho de 2016), tendo dado cerca de 50 consultas de babywearing a diferentes famílias. Administradora do grupo Babywearing Portugal no Facebook, uma comunidade muito ativa com cerca de 15 mil membros onde dezenas de mães partilham as suas dúvidas diariamente, explica que as consultoras são “alguém que está em estudo contínuo e demonstra às famílias qual é o porta-bebés mais indicado”.

Apesar de cada consultora praticar o preço que lhe parece mais válido, Alice Amieiro Pinho, de 34 anos, fisioterapeuta na área da pediatria e consultora de babywearing desde 2016 (tendo dado cerca de uma centena de consultas até à data), conta à MAGG que as suas consultas têm um custo de cerca de 40€ a 50€, dependo das deslocações implícitas, e incluem um aconselhamento especializado e personalizado.

Existem cursos onde as pessoas não sabem sequer fazer as amarrações, logo, como podem ensinar?"

“Desloco-me a casa da família e levo comigo diferentes opções de porta-bebés, de todos os tipos disponíveis no mercado, mesmo aqueles que não aconselho. Mas faço-o para demonstrar aos pais o porquê de não serem boas opções”, salienta Alice, que começa por fazer uma abordagem teórica sobre o babywearing nas suas consultas.

A consultora explica que aborda as formas corretas de carregar um bebé, a importância do colo, as implicações no desenvolvimento da criança em cada idade e o porta-bebés indicado para cada fase.

“Experimento as várias opções que levei comigo e explico os benefícios ou contrariedades, com recurso a um boneco inicialmente, e ensino os pais a utilizarem as diferentes alternativas. De seguida, a família pratica com o boneco, e depois com o bebé, e consoante a teoria que aprendeu no início da consulta e aquilo que lhes faz sentido para o bebé, escolhe a opção que desejar.”

No final da consulta, se a família ainda não possuir um porta-bebés, Alice deixa a opção escolhida durante cerca de uma semana para os pais praticarem e, posteriormente, aconselha na compra do produto, dado que “existem poucas lojas físicas que vendam os porta-bebés mais aconselhados, é maioritariamente online”.

Qualquer pessoa pode ser consultora, sem ser necessária qualquer formação médica

Catarina explica que as consultoras não têm todas o mesmo tipo de formação, dado que existem várias escolas, com níveis e módulos diferentes. A também engenheira afirma que a formação “depende muito da escola, do tipo/nível de formação e certificação. Existem escolas específicas para tal e alguns módulos são presenciais e durante um fim de semana intenso, enquanto que outros podem ser online e demorar meses”.

É possível andar no Metro de Lisboa com um carrinho de bebé? Fizemos o teste
É possível andar no Metro de Lisboa com um carrinho de bebé? Fizemos o teste
Ver artigo

A consultora residente na Áustria conta à MAGG que fez a sua formação na escola ClauWi Trageschule (Suiça, Áustria e Alemanha) e está a meio do segundo curso com o Bebé no Pano (brasileira/portuguesa). "Mas claro que quero continuar a ter mais formações, porque é de facto uma paixão minha. Mas como tudo na vida, o estudo deverá ser contínuo e a atualização também”.

Dado que não existe enquadramento legal, legislação ou regulação para a atividade de consultora de babywearing, as escolas, as aprendizagens e os próprios formadores diferem muito. “Existem escolas que têm profissionais de saúde a dar as formações mas, normalmente, são consultoras mais experientes a lecionar os módulos”, afirma Alice Amieiro Pinho, que acrescenta que qualquer pessoa pode tirar um curso online e apelidar-se de consultora de babywearing.

É impossível para alguém que só tem acesso àquela formação, sem qualquer outra preparação, prestar um serviço de qualidade a outra família"

“Acho que as formações têm de ter uma componente prática. No meu caso, tirei o curso da ClauWi, uma formação teórico-prática de três dias presencial, numa escola com mais de 20 anos, muito reconhecida, que ensina uma mãe a colocar o seu bebé da forma mais correta no porta-bebés mas tem também noções muito fortes de teoria”, explica a consultora, que afirma que com esta formação e muito empenho, esta é uma escola que pode formar boas consultoras.

Por outro lado, a também fisioterapeuta explica que existem outras escolas e formações, abertas ao público em geral, que podem ser insuficientes.

“Fiz também um outro curso em 2016, da escola espanhola Crianza Natural, onde a formação, na época, se baseava em teoria com demonstração, as mães não praticavam. Na minha opinião, é impossível para alguém que só tem acesso àquela formação, sem qualquer outra preparação, prestar um serviço de qualidade a outra família, não tem como”, salienta Alice, que explica que caso não tivesse a sua formação de fisioterapeuta, não teria ferramentas ou apoio de qualidade com este curso.

Rosa Sorribas, consultora de babywearing e lactação e representante da escola Crianza Natural, afirma, por sua vez, que "o curso é principalmente prático, daí ser desenvolvido presencialmente e não online".

A consultora acrescenta que, no decorrer dos cursos desta escola, "existem mais de 60 pota-bebés com os quais os participantes podem praticar, com recurso a bonecos de diferentes pesos e tamanhos, semelhantes aos bebés reais. A prática também existe para entender as necessidades dos pais e mães e para conseguirmos aconselhar o porta-bebés mais apropriado para cada caso".

Validade de uma consultora

Catarina Teles afirma que é complicado perceber, na totalidade, quais as formações mais válidas ou as formadoras com mais qualificações.

“Existem cursos onde as pessoas não sabem sequer fazer as amarrações, logo, como podem ensinar? Também há consultoras que não apostam em formações contínuas ou não tem muita experiência, o que para mim é fundamental. Podem existir pessoas com muitos cursos mas com pouca experiência, e considero que a prática é muito importante”, explica Catarina.

A consultora afirma que a escolha da pessoa ideal para ensinar uma família é muito subjectiva, mas que deve passar “por pesquisar quem dá consultas na residência da família e tentar perceber os cursos e experiência das consultoras”.

Hugo Rodrigues, médico pediatra, considera que o grande papel das consultoras de babywearing é o de aconselhamento, dado que “são pessoas que fizeram alguma formação na área. Desse modo, podem fazer algum tipo de aconselhamento sendo que, no fim, a decisão é e deve ser sempre dos pais e, na maior parte das vezes, não sei se se justificam formações muito exaustivas”.

O pediatra explica à MAGG também que é fácil perceber o porquê de muitas mães (e pais) se dirigirem mais às consultoras em busca de ajuda do que aos médicos, por exemplo. “É um tema que é ‘chamativo’ para as mães e, assim, é fácil captar a sua atenção. Havendo pessoas que se dedicam apenas a essa área, acaba por ser mais fácil que sejam elas as procuradas em vez dos pediatras, até porque muitas vezes têm mais divulgação online do que a área médica”, afirma Hugo Rodrigues.

Quando a alimentação determina a possibilidade de se ser mãe
Quando a alimentação determina a possibilidade de se ser mãe
Ver artigo

No entanto, o médico pediatra salienta que o enfoque das consultoras de babywearing deve ser mais no bem-estar do bebé do que nos problemas de saúde.

Quando existe algum problema de saúde do bebé que tenha implicação na forma de transportar, nestes casos a opinião deve ser do pediatra. Quem dá as formações de babywearing  pode não ter conhecimentos suficientes para dar uma opinião suficientemente fundamentada e sólida.”

“Quando existe algum problema de saúde do bebé que tenha implicação na forma de transportar, nestes casos a opinião deve ser do pediatra ou de outro profissional de saúde devidamente avalizado para tal. Até porque quem dá as formações de babywearing muitas vezes pode não ter conhecimentos suficientes na área da saúde para pode dar uma opinião suficientemente fundamentada e sólida”, explica o médico pediatra.

Catarina Teles afirma que, no decorrer da atividade das consultoras, "sempre que suspeitamos de algum problema com o bebé reencaminhamos de imediato para os profissionais de saúde. Longe de nós fazer diagnósticos".

Discórdia nos métodos de transportar

Alice Amieiro Pinho afirma que a questão dos marsúpios é transversal a todas as consultoras, sendo esta alternativa “completamente desaconselhada” neste meio. Já Sofia Cardante, fisioterapeuta, recomenda este tipo de porta-bebés “a partir dos dois, três meses assim que o bebé adquirir a capacidade de controlar a cabeça”.

Para além dos marsúpios, a mochila almofadada que encontramos mais facilmente nas lojas (mas que causam muita discórdia, sendo fortemente desaconselhadas pela comunidade de consultoras de babywearing, mas recomendadas por vários médicos e fisioterapeutas), existem outras alternativas de porta-bebés.

Pouch slings
Tira de pano com as extremidades unidas numa costura, que se coloca a tira-colo de maneira a formar uma bolsa, para o interior da qual se desliza o bebé. “O pouch sling é um porta-bebés ergonómico mas que requer alguma atenção por parte dos pais”, explica Catarina Teles, consultora de babywearing, que acrescenta que este produto é um “género de um sling de argolas, mas sem estas, e como tal devem ser usados com o bebé sempre na vertical”.

Dado que não é ajustável, a consultora alerta que este é um porta-bebés apenas recomendado “após os bebés se sentarem e para curtas viagens. Quando usados em recém-nascidos e na posição horizontal, além de não ser ergonómico (relembro a posição sapinho onde os joelhos estão acima do rabo e onde a curvatura natural da coluna é respeitada), pode causar asfixia postural pois as vias respiratórias estarão comprometidas num mau posicionamento do bebé neste tipo de sling“, salienta Catarina.

Sling de argolas
Longa tira de tecido com duas argolas fixas numa das extremidades. Por estas argolas passa a outra ponta, de maneira a prender o tecido do sling, permitindo regular o seu tamanho.

Pano
Tira de tecido que segura o bebé de encontro ao corpo de quem o transporta através de várias voltas e nós. Na opinião de Alice Amieiro Pinho, consultora de babywearing, “este é o método mais aconselhado e versátil”.

Por sua vez, Hugo Rodrigues, pediatra, explica que “a diversidade de formas com que se pode transportar os bebés é enorme e acabam por ser raras as opções que provocam algum tipo de problema ao bebé. Dizer que um marsúpio pode causar displasia da anca, por exemplo, é profundamente incorreto, pois este é um problema congénito”.

A fisioterapeuta Sofia Cardante afirma também que o babywearing não é para todas as pessoas, avançando que “é de excluir casos de pais com problemas da coluna vertebral, como escolioses, cifoses acentuadas, lordoses acentuadas ou hérnias de disco. Este método de transporte pode acentuar estas condições, visto que o facto de existirem se devem precisamente a posturas incorretas no dia a dia, falta de consciência corporal e/ou impossibilidade de reverter essas mesmas condições pela gravidade ou cronicidade das mesmas”.

A consultora de babywearing Alice Pinho, também fisioterapeuta, discorda fortemente desta ideia. “Desde que seja uma situação bem acompanhada, o babywearing pode ser uma solução mais confortável para quem quer dar colo, apesar deste tipo de problemas”.

Apenas por estes dois exemplos é fácil perceber que as opiniões das consultoras nem sempre estão em linha com as dos profissionais de saúde. Catarina Teles afirma que a razão prende-se com “a falta de conhecimento. Não nascemos ensinados e apesar de termos tirado cursos superiores não significa que estejamos totalmente corretos.”

A consultora acrescenta que considera importante que "os pediatras (sendo que não são especialistas em ortopedia infantil) procurem informar-se das diferenças entre marsúpio e porta-bebés ergonómico, pois acho que para eles pode acabar por ser o mesmo. Acho de valor os profissionais de saúde quererem saber mais informações e darem continuidade à sua formação, tal como nós consultoras".

Uma opinião da qual Alice Amieiro Pinho partilha, afirmando que, muitas vezes, “os médicos têm acesso a estudos datados e acabam por recomendar o que conhecem. Era perfeito se os profissionais de saúde fizessem mais pesquisa e se informassem mais, para trabalharmos todos no mesmo sentido”, conclui.

As coisas MAGGníficas da vida!

Siga a MAGG nas redes sociais.

Não é o MAGG, é a MAGG.

Siga a MAGG nas redes sociais.