Os problemas nos serviços de obstetrícia e ginecologia dos hospitais portugueses não são novidade, mas agravaram-se desde junho, quando as urgências de vários hospitais anunciaram o fecho durante horas ou dias. A situação tem sido notícia e surge agora um relato de uma mulher residente no Seixal que foi levada para o hospital das Caldas da Rainha, onde acabou por parir.
Tudo aconteceu na segunda-feira, 22 de agosto, quando Patrícia Alves, de 26 anos e grávida de 40 semanas e quatro dias, começou a sentir dores abdominais e decidiu chamar o INEM para a sua casa, na Amora, Seixal, às 4h da madrugada. Mas dali foi encaminhada para Santarém, a mais de 100 quilómetros, porque nenhuma unidade hospitalar dos distritos de Setúbal e Lisboa estavam disponíveis.
“Quando lá chegámos, às 5h30 da manhã, disseram-nos que tinha havido um erro do Centro de Orientação de Doentes Urgentes, que não devíamos ter ido para Santarém, porque deixavam de ter anestesista a partir das oito da manhã, e que íamos ser transferidos para as Caldas da Rainha”, relatou João Morais, 33 anos, o marido da grávida, ao "Correio da Manhã".
Nisto passaram-se horas, quilómetros e "ataques de ansiedade", revela João Morais, até que às 8h30, já no hospital das Caldas da Rainha, Patrícia Alves conseguiu ser atendida por um médico para acompanhar o trabalho de parto. A filha do casal do Seixal acabou por nascer às 17 horas e é saudável.
Contudo, os constrangimentos causados pela falta de serviços de obstetrícia na região de Setúbal e Lisboa — que fizeram também com que Patrícia não tivesse acompanhamento médico durante mais de oito semanas depois de uma mudança de casa para a Margem Sul — continuam.
"Agora sou obrigado a fazer mais de 200 quilómetros, todos os dias, para visitar a minha filha e a minha mulher ao hospital ou então tenho de pagar um quarto de hotel, porque a Benedita nasceu a 100 quilómetros de casa", disse o marido de Patrícia Alves ao mesmo jornal.
Patrícia não é caso único — e mais podem surgir
Todos os dias surgem atualizações de serviços de obstetrícia que deixam de funcionar devido à falta de médicos, situação que pede medidas urgentes por parte do governo.
“É verdade que a urgência de Obstetrícia e Ginecologia está com problemas, não só em agosto, já tinha em julho, em junho, há alguns meses, e eu temo que, pelo facto de o Ministério da Saúde ainda não ter tomado decisões importantes nesta área, que setembro possa ser pior do que agosto e, se calhar, o resto do ano não corra assim tão bem”, afirmou o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, esta terça-feira, 23 de agosto, aos jornalistas, citado pela Rádio Renascença, após reunir com médicos internos da especialidade de Ginecologia/ Obstetrícia.
O bastonário da ordem denunciou ainda que todos os médicos internos de Ginecologia e Obstetrícia do Serviço Nacional de Saúde (SNS) já ultrapassaram as 150 horas anuais de trabalho extraordinário e defendeu a adoção de medidas urgentes. Nomeou "a valorização das profissões", "questões relacionadas com a motivação para contratarem mais médicos para o SNS" e a criação de "condições de trabalho que sejam dignas e aceitáveis".
Urgências com falhas esta quarta-feira
De Santarém a Lisboa, as urgências de Obstetrícia e Ginecologia de cinco hospitais voltam a encerrar e a condicionar o acesso de cuidados de saúde às mulheres grávidas até ao fim de semana.
É o caso do hospital Beatriz Ângelo, em Loures, cujas urgências de ginecologia e obstetrícia estarão encerradas esta quinta-feira entre as 8 horas e as 20 horas. Em Lisboa estava também previsto o encerramento da maternidade Alfredo da Costa até à manhã de sexta-feira, mas o diretor da área de Ginecologia e Obstetrícia, Ricardo Mira, anunciou esta terça-feira ao final da manhã que a maternidade vai manter-se em funcionamento até ao final do mês, de acordo com a SIC Notícias.
Quanto ao fim de semana, no hospital Garcia de Orta, em Almada, que tem sofrido sucessivos encerramentos nas últimas semanas, volta a ter a urgência e o bloco de partos fechados desde as 20 horas de sábado e as 8 horas de segunda-feira.
O portal do SNS indica ainda que o serviço do Centro Hospitalar Barreiro Montijo vai fechar entre as 21 horas desta quarta-feira e as 9 horas de quinta-feira.
Na região centro do País, o serviço de Urgência de Ginecologia e Obstetrícia (UGO) do Centro Hospitalar do Médio Tejo (CHMT), em Abrantes, vai estar encerrado até às 21 horas desta quarta-feira. Durante este período, o bloco de partos também estará encerrado e as grávidas em situações urgentes serão encaminhadas para o hospital de Leiria.
O hospital de Santarém, que recebeu Patrícia Alves na segunda-feira devido a um erro, também terá o serviço de Urgência Obstétrica/Ginecológica e o bloco de partos com funcionamento condicionado entre as 8h30 de quarta-feira e as 8h30 de sexta-feira.
Os serviços disponíveis ou com constrangimentos podem ser consultados no portal do SNS.