Maria não é o nome verdadeiro desta mulher de 72 anos, mas só através dele é que se sentiu confortável para contar a sua história. Na década de 80, trabalhou como administrativa no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, posição que manteve ao longo de 13 anos e que lhe permitiu ter o primeiro contacto com os doentes infetados com o vírus da imunodeficiência humana (VIH) que chegavam ao hospital para as consultas de acompanhamento, já que era ela quem os recebia e os encaminhava para os profissionais de saúde correspondentes.

Maria era quem, muitas das vezes, acabava também por ter o último contacto com estas pessoas, quando acabavam numa cama de hospital, à espera da morte que podia demorar dias ou semanas, com o corpo assaltado por doenças oportunistas que se aproveitavam de um sistema imunitário cada vez mais debilitado.

Muitos destes doentes morriam sem a presença da família ou amigos e Maria fazia questão de estar com eles nos momentos finais, oferecendo-lhes a mão e aconchego para que fossem em paz — desconfiando de que tal fosse possível durante um processo doloroso e solitário. "Fiz o que achava que estava certo e não me arrependo de nada. Não me acho mais ou menos do que ninguém por isso, e não quero me achem especial", explica, justificando a recusa em divulgar o nome verdadeiro.

Reformada há 16 anos, Maria não viu "It's a Sin", a série da HBO escrita por Russell T. Davies ("Years and Years") sobre o surgimento da SIDA no Reino Unido no início dos anos 80 e que serve de pretexto para esta peça. Mas não precisa. É que assim que lha descrevemos, tudo lhe soa demasiado familiar: a falta de informação, o estigma associado à doença, o preconceito, o desnorte dos doentes, a morte e o medo. Sempre o medo.

"[Os doentes] chegavam sempre muito ansiosos ao hospital e comecei rapidamente a pensar de que forma é que poderia agir para que não se sentissem assim. O meu papel era o de uma administrativa, mas também o de um ser humano. Era importante não esquecer que não estava a lidar com números, mas com pessoas", explica à MAGG.

Por isso, memorizou todas as caras e todos os nomes. "Quando chegavam para as consultas, ou para fazer análises, ficavam muito contentes porque percebiam que já sabia quem eles eram e para que médico iam ser encaminhados. Sentiam-se reconhecidos e visíveis."

Aos mais ansiosos, Maria confortava com um abraço como resposta ao pranto. "A informação era escassa e a maioria das pessoas fugia dos que estivessem infetados. O medo principal era a morte e aquele abraço, parecia-me, dava-lhes o carinho de que se sentiam órfãos."

"Uns voltavam sempre às consultas, mas outros... Morria-se muito facilmente da doença naquela altura"

“Oh, doutor, mas eu não tenho mais ninguém, só o meu gato”. Como viviam os doentes com sida nos anos 80 e 90
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O contacto com os doentes, no entanto, não se limitava ao contexto hospitalar e a confiança que muitos deles foram ganhando com Maria permitiu-lhes vê-la como uma confidente, como alguém com quem poderiam desabafar e falar dos medos que nunca esperaram sentir. Mais de 30 anos depois, garante-nos que ainda fala com alguns deles "que, felizmente, sobreviveram", e que até ao aparecimento da COVID-19 lhe ligavam para "irem beber um cafezinho e conversar sobre a vida".

Mas a presença daquelas pessoas implicava também aprender a lidar com a perda. "Uns voltavam sempre às consultas, mas outros... Morria-se muito facilmente da doença naquela altura. A primeira vez que chegavam ao hospital, diziam-me que iam morrer e perguntavam-me como é que iriam lidar com os outros a partir daquele momento. Muitos, de facto, morreram, mas as suas histórias ficaram sempre comigo", facto que terá motivado "muitos problemas" no seu casamento.

Entre a década de 80 e 90, Maria habituou-se a conviver com a morte, com o vazio deixado por aqueles doentes que "embora não fossem familiares, eram quase como amigos próximos que desapareciam". Mas nunca deixou que o luto a distanciasse emocionalmente das histórias e das pessoas infetadas que, infelizmente, iam chegando em grande número ao hospital.

"Foi uma altura muito complicada. Se eles morressem internados no hospital, eram os médicos que recebiam a notícia e nos informavam. Mas muitos morriam em casa e, nesses casos, era a família com quem já estivesse em contacto que me ligava a dar a notícia. Outros suicidavam-se. Foi muito chocante e não consigo expor por palavras o que senti. Embora não fossem familiares, eram quase como amigos próximos que desapareciam. E lembro-me de muitos que já cá não estão", recorda.

Margarida Martins, 67 anos, atual presidente da Junta de Freguesia de Arroios, assumiu, entre 1983 e 1991, a função de porteira do Frágil, um dos espaços de diversão noturna mais emblemáticos de Lisboa.

Apoiando-se no contacto de perto que manteve com a noite lisboeta, fala com propriedade quando diz que, "em Portugal, as pessoas tinham muito medo e não se falava desse vírus". A morte de António Variações, em 1984, terá servido para que o tema começasse a ser comentado — ainda que na penumbra, e quase sempre em jeito de sussurro.

A SIDA em Portugal.
Margarida Martins, 67 anos, atual presidente da Junta de Freguesia de Arroios, assumiu, entre 1983 e 1991, a função de porteira do Frágil, um dos espaços de diversão noturna mais emblemáticos de Lisboa Margarida Martins/Facebook

A tomada de consciência para os efeitos nefastos da doença aconteceu a 23 de novembro de 1991, e Margarida Martins lembra-se desse dia como se tivesse acontecido ontem e não há 30 anos. "Estava no Porto a festejar a abertura da minha loja. Nessa madrugada, vim recambiada para Lisboa no primeiro comboio para tomar conta do meu amigo com quem tinha falado e que me tinha dito que estava muito mal. No dia seguinte, era noticiada a morte de Freddie Mercury", conta.

Margarida Martins refere-se a João Carlos, o modelo masculino que foi internado no Hospital de Egas Moniz, e que morreu pouco tempo depois vítima da doença. Tinha 32 anos. Durante o tempo em que lhe prestou cuidados, a atual autarca passou a ser presença assídua no hospital, local onde foi vendo cada vez "mais pessoas da noite".

"Estava no Porto a festejar a abertura da minha loja. Nessa madrugada, vim recambiada para Lisboa no primeiro comboio para tomar conta do meu amigo com quem tinha falado e que me tinha dito que estava muito mal. No dia seguinte, era noticiada a morte de Freddie Mercury"

Foi por ver o "estado aflitivo" em que muitas delas estavam que decidiu afastar-se do meio e das portas do Frágil que, à época, era o palco da noite lisboeta.

É que embora a sua presença no hospital tivesse passado a ser regular para prestar apoio ao amigo João Carlos, diz que, a essas pessoas, "não queria transmitir uma qualquer sensação de esperança", ou a ideia de que, de alguma forma, as conseguiria tratar ou aconselhar. "Sabia-se pouco, muito pouco, infelizmente", lamenta num desabafo.

Mais do que a dor de morrer da SIDA, a dor de se morrer sozinho

Um ano depois da morte de João Carlos, em 1992, ajuda a fundar a Associação Abraço, com o objetivo de prestar apoio a pessoas afetadas pelo VIH e de apostar em ações de sensibilização. Naquela altura, começavam a ser dados os primeiros passos para o estudo da doença em Portugal.

Margarida mudou toda a disposição da unidade de internamento para doentes VIH no Egas Moniz, para que todos os pacientes tivessem camas articuladas, e começou contactar com dezenas de doentes.

"Era muito doloroso ver que as pessoas morriam muito cedo", mas diz que a consciência de finitude iminente não estaria presente nos doentes que se encontravam em fim de vida.

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"As pessoas não têm a perceção de que vão morrer, mas sentem uma sensação de falta. Na véspera da sua morte, o João Carlos passou horas a falar comigo e esteve sempre lúcido. Disse-me coisas, falou-me de momentos e lembro-me de que, na altura, não percebi o motivo daquela conversa. Percebi mais tarde. Era quase como se, naquele instante, ele tivesse feito de mim um repositório de situações", como uma espécie de transferência de legado para que a sua memória perdurasse, mesmo depois da morte.

Anos mais tarde, Margarida Martins voltaria a ser testemunha desta ideia. "Um grande amigo meu, uma das pessoas mais importantes da minha vida, morreu vítima da doença quando eu estava longe. Como já não conseguia falar, escrevia letras num papel, que tenho guardado, perguntando por mim, uma vez que já tinha cuidado dele. Morreu a perguntar por mim, porque havia essa necessidade de passagem através da conversa."

"Lembro-me de que a minha primeira reação ter sido comentar que isto [referindo-se ao VIH] deveria ser mais uma qualquer americanice, porque agora até os americanos estavam a usar preservativo."

Amílcar Soares, 66 anos, fundador da Associação Positivo e seropositivo há mais de 30 anos, recorda que na década de 80 "não se falava, de todo" do VIH. O pouco conhecimento que lhe foi chegando, foi através do companheiro da altura que, por trabalhar num departamento técnico da TAP, chegava a estar "três ou quatro meses" nos EUA.

Foi através dele que foi lendo alguma informação, em revistas e em jornais americanos, que este trazia para Portugal. "De cada vez que ele lá ia, trazia cada vez mais informação. Lembro-me de que a minha primeira reação ter sido comentar que isto [referindo-se ao VIH] deveria ser mais uma qualquer americanice, porque agora até os americanos estavam a usar preservativo. Falava daquilo como uma coisa estranha que tinha aparecido e que se tratava com alguns antibióticos, apenas. Com o passar dos anos, foi-se falando da doença em Portugal, ainda que muito pouco, até começar a chegar algum ruído como o nome da alegada doença gay", conta.

A SIDA em Portugal.
Amílcar Soares, 66 anos, fundador da Associação Positivo e seropositivo há mais de 30 anos, recorda que na década de 80 "não se falava, de todo" do VIH Amílcar Soares/Facebook

Embora não fosse frequentador da noite lisboeta, em grande parte porque um trabalhador-estudante como Amílcar não tinha tempo para tal, e até porque nunca foi uma pessoa "de grandes noitadas", recorda-se de sentir alguma quebra de movimento nos pontos de encontro da comunidade LGBT, como as saunas "onde se encontrava quem andava de um lado para o outro".

O medo, ainda que numa fase muito inicial da epidemia da SIDA, terá sido um forte catalisador. Algumas pessoas dessa comunidade, recorda, foi deixando de ver. Outras, encontrou mais tarde nas consultas hospitalares para doentes infetados com o VIH/SIDA.

Soares sabe precisar o momento exato em que soube que estava infetado. "Tirei sangue a 23 de dezembro de 1985 e a médica que me seguia disse-me que não tinha nenhum problema de saúde porque estava com um ótimo aspeto. Associava-se os infetados àquelas pessoas em fase terminal cujo corpo era assaltado pelas doenças oportunistas. Esta ideia era perigosa e paradigmática da escassa informação que havia. Não era nenhum santinho e sabia, exatamente, o que tinha andado a fazer ao longo de todos aqueles anos. Sabia todas as relações que tinha tido."

O resultado positivo chega uns meses depois, em março de 1986. "Éramos todos muito egocêntricos e, por isso, não havia essa ideia de querermos participar em campanhas de prevenção, porque toda a informação que nos chegava era muito discriminatória e acusatória". O que, por sua vez, contribuiu para uma sensação de "pânico total" na comunidade.

"Foi como se tivéssemos levado uma grande paulada na cabeça", referindo-se a si e ao seu companheiro da altura, que também estava infetado, e a única pessoa com quem falava da doença, além do médico que os seguia no Hospital de Santa Maria.

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"Nem ele [o médico] sabia muito bem o que nos dizer, porque não havia medicação para dar, uma vez que os primeiros medicamentos só surgiram entre 1987 e 1988, por isso eram consultas perfeitamente normais. A informação que nos passava é que era uma coisa muito grave e o resto eram exames de rotina, como a apalpação."

O aumento do interesse mediático acontece no início da década de 90, quando deixou de ser possível esconder o tema. A explicação? "O número percetível de pessoas que, mesmo em Portugal, morriam da doença, e que levou a um pânico generalizado que já não se limitava a certas comunidades. Não se sabia muito bem como é que se transmitia", mas havia cada vez mais pessoas que conheciam ou sabiam de alguém que estava infetado.

Foi através da Associação Positivo, fundada no início dos anos 90, que Amílcar Soares e a sua restante equipa passaram a contactar com "todo o tipo de pessoas afetadas pelo VIH", e que, nas suas palavras, "nunca pensou que existissem ou que pudessem ser vítimas da doença". Além de toxicodependentes, prostitutos e prostitutas, Amílcar viu veteranos de guerra e pessoas sem-abrigo infetadas. O vírus, sabemos bem, atacava todos e fazia estragos.

Fernando Maltez, diretor do Serviço de Infecciologia do Hospital Curry Cabral, sabe de memória que o primeiro caso de infeção por VIH diagnosticado em Portugal foi em 1983 e recorda a escassez de métodos que os profissionais de saúde tinham nestes casos.

"No último dia em que a visitei, disse-me que precisava de falar comigo a sós e pediu-me para, no dia seguinte, chegar mais cedo. Não fui a tempo"

"Não dispúnhamos de nenhuma arma terapêutica específica e, portanto, limitávamo-nos a tratar as infeções oportunistas que os doentes apresentavam. Invariavelmente, a taxa de sobrevivência média destes doentes não ia muito além dos 18 meses. Causou muito receio entre o público, sobretudo porque ainda não estavam clarificados, de forma correta, completa e clara, os meios de transmissão. Para nós, clínicos, o que mais nos impressionava e afetava era sabermos que ao recebermos estas pessoas, a probabilidade de conseguirmos prolongar as suas vidas era muito limitada."

Desse tempo, recorda experiências traumatizantes, como as crianças que viu morrer. "Segui muitas crianças de 14 e 15 anos, hemofílicas, e infetadas com o VIH, que morreram nas minhas mãos. Foi absolutamente traumatizante até porque, naquela altura, era muito jovem."

É em 1986 que surge o o AZT, o primeiro fármaco antirretroviral que "permitiu prolongar durante mais alguns meses a vida destes doentes". Ao final de algum tempo, porém, "estes acabavam por ganhar resistência ao medicamento".

As cargas virais voltavam a aumentar, as defesas imunitárias baixavam e as doenças oportunistas acumulavam-se. O desfecho era a morte.

A SIDA em Portugal.
Fernando Maltez, diretor do Serviço de Infecciologia do Hospital Curry Cabral, sabe de memória que o primeiro caso de infeção por VIH diagnosticado em Portugal foi em 1983 e recorda a escassez de métodos que os profissionais de saúde tinham nestes casos

A grande evolução no combate ao vírus surge em 1996, "quando se percebeu que o tratamento através de três agentes funcionava melhor do que com apenas um", refere Maltez. Ou seja, dez anos depois da entrada em Portugal do primeiro antirretroviral.

À medida que o vírus se foi disseminando, Amílcar Soares não tem dúvidas de que para qualquer paciente infetado com VIH, mais do que a dor de estar a morrer, doía muito mais morrer sozinho.

"Muitos dos que davam a mão aos pacientes em fim de vida eram os médicos ou os enfermeiros. Havia casos de pessoas que morriam acompanhadas pela família, claro, mas não era raro as famílias rejeitaram a presença dos companheiros ou das companheiras devido ao estigma da homossexualidade", diz.

"Era muito aflitivo ir a um hospital e ver que o andar, ou a unidade destinada às pessoas com VIH, estava repleta de pessoas novas, sempre muito debilitadas. Algumas delas com visitas, muitas sem. Nos quartos que tinham visitas, não se falava. Estava-se, apenas, e dava-se a mão, e só isso fazia a diferença. Nunca vou esquecer uma entrevista, em 1989, a uma senhora africana a quem a jornalista lhe perguntou se não tinha medo de estar a morrer com SIDA no hospital. Ela disse que a única coisa de que tinha medo era de estar a morrer sem que houvesse alguém que se chegasse perto para dar a mão. Tinha fome de pele."

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Também Maria, ex-administrativa do Hospital de Santa Maria, reconhece a importância da conversa e do estar junto dos doentes em fim de vida.

"Uma das senhoras que visitei até ao último dia, era sempre acompanhada pelo marido na ala de internamento. No último dia em que a visitei, disse-me que precisava muito de falar comigo a sós e pediu-me para, no dia seguinte, chegar um bocadinho mais cedo. Não fui a tempo, porque ela morreu nessa noite. Marcou-me muito porque nunca percebi o que é que ela me queria dizer", desabafa.

Em Portugal, os casos de infeção do VIH mantêm uma tendência decrescente

No final de 2020, num relatório produzido pela Direção-Geral da Saúde (DGS) e pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), concluiu-se que o número de novos casos de infeção por VIH voltou a descer, reforçando uma tendência decrescente desde o início de 2000. Desde janeiro até dezembro de 2019, diagnosticaram-se 778 novos casos — menos 331 dos que foram reportados no ano anterior.

"Quando, nas salas de espera, havia pessoas que, como eu, se sentiam à vontade para falar sobre a doença e sobre os medicamentos, os menos à vontade lançavam um olhar desagradável porque sentiam que isso era denunciar aquilo que eles lá estavam a fazer."

O relatório conclui ainda que a transmissão heterossexual é a que, até à data, se mantém como a mais frequente. No entanto, o número de casos detetados em homens que têm sexo com homens constituiu a maioria dos novos diagnósticos no grupo de doentes do sexo masculino, com uma percentagem de 56.7%.

Mais de 30 anos depois, e estudado o vírus até à exaustação, muita coisa mudou. E para melhor. Uma doença que antes matava em cerca de 18 meses, hoje pode ser controlada e a esperança média de vida de um doente infetado pode ser igual à da restante população desde que a toma da medicação diária seja cumprida escrupulosamente. Mais: as terapêuticas atuais possibilitam, desde que respeitadas, que o risco transmissão do vírus caia para quase 0%.

Apesar de os números salientarem uma tendência decrescente, até mesmo nos diagnósticos tardios (o que significa que há mais pessoas a ser diagnosticadas numa fase inicial da doença), praticamente não se ouve falar da SIDA no País, facto que Margarida Martins considera "muito perigoso", já que, com pouca abordagem ao assunto, "as pessoas deixam de ter cuidados, deixam de usar preservativo e acham que está tudo normal quando, na verdade, ainda se regista muita infeção por VIH".

Amílcar Soares garante que hoje as coisas estão diferentes, mesmo que continue a haver estigma associado às pessoas infetadas com VIH, embora não no mesmo grau como se sentia na década de 80 e 90 em que a culpabilização era interna e perpétua.

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"Quando passou a haver mais informação e os medicamentos passaram a estar acessíveis a todos os doentes, as salas de espera das unidades dedicadas às consultas para VIH no hospital começaram a ter revistas com artigos sobre a doença. Sabíamos o que levava as pessoas àquelas consultas, mas elas não tocavam nas revistas porque faziam de conta que estavam ali para outro problema qualquer", diz.

"Quando, nas salas de espera, havia pessoas que, como eu, se sentiam à vontade para falar sobre a doença e sobre os medicamentos, os menos à vontade lançavam um olhar desagradável porque sentiam que isso era denunciar aquilo que eles lá estavam a fazer. Falávamos de um problema que, no fundo, era de todos, mas que eles faziam de conta que não era nada com eles. Havia uma muito forte culpabilização interna e uma vergonha castradora", lamenta.