Até podíamos dizer que se juntássemos os filmes "Interstelar", "A Todos Os Rapazes que Amei" e a série "Riverdale", nascia "MoonShot", a nova comédia romântica que se estreia esta quinta-feira, 31 de março, na HBO Max — mas não seria justo. Para todos os outros, no caso.
"Riverdale" cativou-nos logo na primeira temporada, "Interstelar" é uma referência no campo da ficção científica e, bem, "A Todos os Rapazes que Amei" é o que é, mas faz o trabalho e chega a arrancar aquela lágrima marota aos mais sensíveis. Já "Moonshot", protagonizado por Lana Condor e Cole Sprouse, chega com um conceito promissor, mas perde-nos no (longo) caminho até Marte.
Em "Moonshot", estamos algures em 2040 e já há vida além do planeta terra. Marte é, agora, o destino predileto de todos aqueles que por cá continuam e representa uma espécie de realidade paralela, baseada num conceito de seleção cruel.
É que só entra na guestlist deste quarto planeta do sistema solar quem: 1) é um génio e vai acrescentar alguma coisa ao seu desenvolvimento; ou 2) tem dinheiro suficiente para comprar um bilhete astronomicamente caro para o efeito.
"Moonshot" é a prova de que os clichês sobrevivem até no espaço
Na Terra, temos Walt (Cole Sprouse), que sonha explorar o espaço desde que se lembra de ser gente, mas que tem um emprego cujo ordenado nem chega para pagar todos os cafés que bebe em horário laboral. E Sophie (Lana Condor), uma jovem com uma inteligência acima da média, que tem a conta bancária recheada e o namorado, literalmente, noutro planeta. Walt não abandona a Terra porque não tem dinheiro; Sophie porque tem medo de voar.
São literalmente o oposto um do outro, como obriga a tradição dos clichês, mas o destino lá se encarrega de os cruzar. Assim que Walt se apercebe de que Sophie só não vai para Marte porque tem medo do percurso, faz-lhe a cabeça até que esta se aperceba do quão privilegiada é. E, pronto, aproximadamente 2 minutos e meio de conversa depois, a fobia de Sophie desaparece, esta enche-se de coragem e, pumba, compra a passagem para Marte.
Ai, ai, tantos anos encalhada na Terra e afinal só precisava de falar com um desconhecido (que diz odiar) para mudar de ideias? Realista. Mas adiante.
Escusado será dizer que a insistência de Walt, que além de sonhar com o espaço desde miúdo, teve também um caso louco de uma noite com uma rapariga antes de esta partir para Marte, tinha água no bico. O que este protagonista queria mesmo era fingir ser familiar de Sophie para a poder acompanhar à entrada da nave espacial e, claro, esgueirar-se para o seu interior. Sem grandes problemas, três sustos depois e... está lá dentro.
E é aqui que o ritmo do filme começa a quebrar. A viagem da Terra a Marte dura aproximadamente 35 dias — e não é que sentimos o desespero do tripulantes da nave? É que até para o espectador o tempo demora a passar e resistir a um scroll discreto no telemóvel torna-se difícil.
Fazer uma lista com as qualidades do príncipe encantado? Talvez não seja boa ideia
Sophie é a menina das listas. Tem a vida planeada ao milímetro e recusa-se a permitir que a distraiam do objetivo final: encontrar-se com o namorado, Calvin, em Marte e convencê-lo a regressar consigo para a Terra. Perdeu os pais aos 14 anos e, desde então, integrou a família do rapaz que julga amar. Afinal, namoram desde o 8.º ano e ele preenche todos os requisitos presentes na sua longa lista de exigências: é inteligente, calado, alto, com abdominais. Enfim, tudo o que a deveria fazer feliz, certo? Errado.
A partir do momento em que Walt entra na vida de Sophie, tudo muda. As chamadas meticulosamente planeadas com o namorado tornam-se raras e as escapadelas às escondidas até à cozinha ou até ao espaço (literalmente, ao exterior da nave, onde a gravidade é nula) cada vez mais frequentes. Pelo guião, percebemos que é algures nesta altura que o romance nasce. Já pela química (ou falta dela), ficamos na dúvida.
Os dias passam, a relação intensifica-se, mas é como se costuma dizer: a linha entre o amor e o ódio é ténue e não tarda até que estes dois protagonistas se desentendam. No entanto, se o início do filme se revela demasiado lento, os últimos momentos de "Moonshot" passam a uma velocidade alucinante. Sophie encontra-se com o namorado e Walt mete mesmo os pés em Marte, lá isso é certo, mas será que as expectativas correspondem à realidade? Talvez não e deixamos que tire as suas próprias conclusões. Mas há lições importantes pelo meio.
Primeiro, antes de largar tudo em nome do amor, certifique-se de que a outra pessoa faria o mesmo por si. Depois, também dá jeito perceber o que é que quer fazer em Martenantes de lá chegar — ou arrisca-se a passar 35 dias fechado numa nave, de fato de treino e com meros desconhecidos, em vão.
E por último, e talvez a mais importante: às vezes, o problema não são os outros nem é o sítio, somos nós. Por isso, de nada serve gastar um fortuna numa passagem para outro planeta, se, no final do dia, cá ou lá, é consigo que se deita. "Não podes fugir de ti próprio" é uma das poucas frases sérias do filme e talvez a que melhor sintetiza a mensagem de "Moonshot".
Se aplicar estas três lições na sua vida, uma coisa é certa: não acaba de coração partido nem de carteira vazia. Em vão, pelo menos.
Sophie assaltou o armário da Lady Gaga, mas rendeu-se ao fato de treino de "Squid Game"
Mas nem tudo é mau. E há que dizê-lo: soltámos umas quantas gargalhadas ao longo do filme. Sophie é tão intransigente que se torna cómica e Walt devia ter "problemas" escrito na testa. O casalinho não tem química, mas tem piada. Portanto, a comédia está lá, o romance é que não.
Ainda assim, as roupas são o que mais questões levanta neste filme. Às tantas, damos por nós a pensar como é que os fatos de treino de "Squid Game" foram parar ao espaço e em como Sophie nos surpreende com um vestido digno de Lady Gaga e logo a seguir nos deixa desnorteados com passos de dança à moda dos cromos do antigo programa da SIC "Achas Que Sabes Dançar?".
"Moonshot", escrito por Max Taxe e realizado por Christopher Winterbauer, já disponível na HBO Max, é uma espécie de universo paralelo, que em vez de nos aliciar a querer mudar de vida, nos leva a agradecer encarecidamente pela que temos o privilégio de viver.
A verdade é que fomos a Marte e não gostámos, mas pelo menos "Moonshot" arrancou-nos gargalhadas a partir de uma nave espacial. No fundo, a concretização falhou, mas a mensagem está lá.
É fofinho e oferece o que promete: comédia — talvez só não fosse preciso 1h40 para lá chegar.