Ao entrar no Boshq, um dos restaurantes do Mercure Lisboa Almada, sentimo-nos a entrar no filme de animação "Tarzan", lançado em 1999. Não, não há gorilas, nem uma encantadora Jane, há sim vegetação suspensa no teto, quase como que a cair para o prato. A transição não é direta, mas podia ser. É que neste restaurante, que abriu completamente renovado em novembro de 2021, a ementa colhida numa horta sazonal (uma parte no terraço do hotel) e os pratos de base vegetal têm verdes, sim, mas muito mais.
Para o outono foram lançadas propostas, sendo que algumas das que venceram o Concurso Sabores Almada foram mantidas, até porque continuam a cumprir com o conceito principal do restaurante: oferecer pratos de base flexitariana, com ingredientes de qualidade locais e sazonais.
Os vencedores foram a boshqueta, com burrata e pesto (9€), que ganhou o 1.º lugar na categoria entrada / cozinha vegetariana e vegana; o BBQ da Horta, um duo de beterraba fumada, seitan, cogumelos, tomate, salicórnia e alface do mar biológica (14€), vencedor do 1.º lugar na categoria prato principal / cozinha vegetariana e vegana; e o cajucake, que ganhou o 2.º lugar na categoria sobremesa.
Além de uma cozinha quase vegetariana e vegan (vai perceber quando falarmos do polvo sublime), o Boshq prima por uma cozinha equilibrada. "Quando estou a criar os pratos do Boshq, não estou a pensar no sofrimento, mas no saudável e ao mesmo tempo saboroso", referiu o chef Luccas Paixão Oliveira à MAGG na visita ao restaurante do hotel Mercure Lisboa Almada. E é neste equilíbrio que tanto entram croquetes, como saladas e sobremesas — sempre com "vegetais e frutas sazonais", como o chef fez questão de sublinhar.
E não se deixe enganar pelo facto de o Boshq estar situado num hotel. Qualquer ideia da formalidade típica dos restaurantes de hotel é desconstruída aqui, desde logo pelo facto de ter uma entrada independente, e depois pelo que aconteceu de seguida.
Cocktails de aspeto, saúde de sabor
Estamos habituados a pedir um cocktail e a ser-nos servido um copo elegante, com uma combinação de álcool e o doce de licores ou de sumos de fruta naturais. No caso do Boshq, a apresentação está lá. Os sumos de fruta também. Mas o álcool não.
Aqui, todos os cocktails são feitos num mini laboratório, o Juice Lab, e o resultado é um sumo feito na hora, como o que vem num copo Tiki, composto por morango, melancia, framboesa e ameixa (4€) ou o do copo de pé alto e fino: uma limonada de pêra com romã, com pedaços da mesma dentro de cubos de gelo.
Os cocktails gelados proporcionaram um contraste de temperaturas ao longo da refeição, uma vez que, para o outono, a ideia foi trabalhar com a terra, o fogo e fumo — os temas da nova carta — para dar uma "sensação de aquecimento", explicou o Luccas Paixão Oliveira, que já trabalhou em Itália com o chef Massimo Bottura, responsável pelo restaurante Osteria Francescana, com três estrelas Michelin.
A influência da gastronomia italiana e Michelin foi trazida para Almada, mas de forma humilde nos pratos que sabem a "casa", em especial uma casa aquecida com lareira.
Começámos (e bem) logo a saborear Itália na focaccia integral do Boshq, acompanhada de húmus de azeitona e manteiga fumada (3,50€), seguimos para a Ásia numas leves gyosas caseiras de kimchi (fermentação natural de vegetais com especiarias, ao estilo coreano) (8€) e ainda aconchegámos com quentes croquetes vegan de ragú sarraceno (que parecem MESMO saber a carne) e de queijo vegan que casam na perfeição com o molho de caju e laranja (8€). Ainda aterrámos os talheres na salada de beterraba roxa e amarela — que não conhecíamos — caramelizada em balsâmico (dos céus), com queijo de caju (11€).
"Era um prato só de mil folhas, sff"
Não precisávamos de provar mais nada para perceber que uma cozinha equilibrada é o contrário de sofrimento. Mas sofrimento seria ir embora e não testar o que o chef Luccas Paixão Oliveira preparou mais para esta estação. Mais uma vez, foi a Itália e trouxe para o Boshq um gnocci siciliano caseiro e delicioso (15€), e sem sair de cá levou ao tacho um polvo (16€) que convenceu até quem à mesa não gosta(va) de polvo. Não foi o nosso caso, que apesar de gostarmos do molusco, preferíamos ter tido um prato só com o acompanhamento mais surpreendente que provámos até hoje: mil folhas de mandioca e batata doce bem tostado.
Na sobremesa continuámos pelos sabores da época e do ano de 2021. É que o medalhado cajucake, feito com fruta da estação, foi dos que se manteve na carta, e a versão de outono é feita com jelly de dióspiro. "São as vitaminas do dióspiro que protegem o nosso corpo", justifica o chef sobre a escolha do fruto para esta receita, tal faz nos outros pratos, sempre no sentido de nutrir e proteger o nosso corpo nesta altura do ano.
Uma ida ao Boshq é melhor que uma ida ao médico, mas não a casa de uma avó — que apesar dos seus cozinhados não serem substituídos, para a matar as saudades dos doces caseiros tem o pumpkin brulèe (6€), um leite creme de abóbora, merengue queimado e bolo de frutos secos (que ficou para uma nova visita).
"O Pecado Mora ao Lado"
Não é apenas o nome do icónico filme com Marilyn Monroe lançado em 1955. É a melhor forma de descrever o Boshq. É que mesmo ao lado, também dentro do Mercure Lisboa Almada, mora o Wild Burgers & Shakes e os seus hambúrgueres, batidos e gelados que quebram por completo com o conceito de base vegetal anterior, mas não com os ingredientes de qualidade e o equilíbrio.
O sentido da palavra equilíbrio é mesmo o que encontra no hotel de Almada, onde pode fazer um brunch de manhã ao fim de semana no Boshq — à carta ou através dos menus desde 17€, compostos pelas novas sugestões de inverno, como a tosta de abacate com tomate confitado, waffle com mascarpone, sumo natural do Juice Lab e uma bebida quente — e jantar um king truffle, com hambúrguer de novilho e trufa negra laminada (19€) do Wild Burgers & Shakes.
Já durante a semana, no Boshq vai encontrar um menu de almoço por apenas 15€, composto por couvert, entrada, sugestão da semana e bebida. Para garantir que tem lugar em qualquer um dos restaurante, só tem de ligar a marcar.