Fazer parar os Now United por mais do que cinco minutos num local implica abordagens esporádicas de pessoas que nunca viram na vida mas que, apesar disso, os sentem próximos. Quase como família. O cantor americano Noah Urrea, 20 anos, ia a meio de uma frase quando, de repente, os seus olhos se desviaram do gravador para o rosto de uma criança que passava pouco discreta e que ainda não estava capaz de acreditar que ali, mesmo à sua frente, estava o grupo que se tinha habituado a ver à distância através do YouTube ou do Instagram, a rede em que a banda já soma mais de sete milhões de seguidores.
Urrea interrompeu-se, seguiu a criança com os olhos e ao acenar da mão seguiu-se um sorriso genuíno. Quando a conversa com a MAGG terminasse, estava prometida uma fotografia, garantiu Any Soares, a cantora e dançarina brasileira, 19 anos, que também faz parte do grupo.
A estreia do grupo em Portugal teve os Globos de Ouro como pretexto, através de uma atuação especial ocorrida este domingo, 3 de outubro, no Coliseu dos Recreios. Se a multidão de fãs que se deslocou até lá surpreendeu quem via ao longe, o feito tinha sido repetido dias antes, no aeroporto de Lisboa, quando a onda de seguidores transitou do digital para as ruas com o objetivo de os receber.
O mundo não é estranho a grupos de música pop, mas este parece e apresenta-se como sendo diferente num mercado cada vez mais saturado de mais do mesmo.
Talvez porque os Now United, nascidos da mente de Simon Fuller (o mesmo que criou as Spice Girls e formatos televisivos como o "Ídolos"), sejam o primeiro supergrupo de música pop a representar várias nações, com membros que cantam e dançam que se desunham e vindos de países como Rússia, Brasil, Reino Unido, Espanha ou Japão.
Ainda que exaustos da atuação nos Globos de Ouro e da ronda de entrevistas que compôs a segunda-feira, 4, do grupo, a energia volta-lhes com relativa facilidade quando recordam a atuação na gala. "Foi uma experiência fascinante, até porque foi a primeira vez que tive oportunidade de dançar com o público. O recinto era fantástico", diz Alex Rey, 16, cantor e dançarino espanhol.
Para Lamar Morris, cantor, rapper e dançarino em representação do Reino Unido, foi ainda mais especial. "Poder atuar nos Globos de Ouro foi muito importante para mim porque não atuava há algum tempo. Poder voltar e estar em frente ao público, sentir aquela adrenalina e poder alimentar-me da energia de quem nos vê para que a atuação seja ainda mais enérgica... foi uma sensação fantástica da qual tinha saudades há muito tempo", diz-nos. Nas várias atividades que o grupo teve pelo Brasil e pelo México, Lamar não esteve com a banda e, em vários momentos, a sua presença limitou-se apenas ao que podia ser feito remotamente.
Vir a Portugal e poder regressar aos palcos com o grupo foi, apesar do cansaço, como regressar a casa. Porque todos são família.
E ainda que a média de idades seja de 22 anos, sabem exatamente o que querem do futuro. "O meu desejo é que daqui a cinco anos estejamos, individualmente, felizes com o que alcançámos", diz Sina Deinert, 23, cantora e dançarina, que representa a Alemanha.
Enquanto grupo? A resposta é coletiva: ser o maior grupo de música pop e transmitir positivismo através da música.
A responsabilidade de representar o país, mesmo que longe dele
Mas em todos há uma sensação de responsabilidade que carregam nos ombros e que não permitem esquecer. Até porque, dizem-nos, acreditam ser isso que os diferencia. Referem-se, claro, ao facto de representar os seus respetivos países nos vários cantos do mundo por onde vão passando.
Quem o diz é Jeong Heyoon, 25, cantora e dançarina vinda da Coreia do Sul. "O facto de termos sido escolhidos para representar os nossos países ou as nossas regiões é uma loucura enorme. Isso, claro, obriga a uma enorme responsabilidade que, enquanto artista, te deve querer fazer o melhor que conseguires para que representes o teu país da melhor forma", explica. É isso, continua, "que cada um tenta fazer aqui, trazer a sua cultura para o seu do grupo" e fazê-lo crescer assim.
Porque como em tudo, o contexto importa, o dos Now United é este: foram fundados em 2017, são compostos por 18 membros (embora, para Portugal, tenham viajado apenas 13), e não têm um único disco lançado — embora garantam que esteja para breve —, mas sim 51 singles, atuações alucinantes no YouTube e vídeos feitos nas várias partes do mundo por que passam.
No YouTube e no Instagram, as duas principais redes em que mantêm contacto com os fãs, somam já mais de 14 milhões de seguidores. Não é de estranhar, portanto, que a conversa com a MAGG tenha sido interrompida várias vezes por quem queria levar um autógrafo ou uma selfie para casa. Mesmo em Portugal, local em que nunca estiveram.
"Temos estado a explorar Lisboa e à medida que passávamos por locais icónicos da cidade, víamos fãs que nos reconheciam e isso é fantástico porque [devido à pandemia] não víamos fãs há muito tempo. É muito bom poder conhecê-los, abraçá-los e tirar fotografias com eles", diz a brasileira Any Soares. Joshua Beauchamp, 21, cantor e dançarino do Canadá, tem mais dificuldades em pôr em palavras o que é ouvir o seu nome gritado por quem nunca viu na vida.
"Não há forma de explicar isto. É absolutamente surreal para qualquer um de nós, porque é quando viajamos que temos a oportunidade de conhecer os rostos por detrás das contas de Twitter e Instagram que interagem connosco. É tudo tão diferente e poder sentir o carinho de cada uma destas pessoas, e sentir que retribuímos com o mesmo grau de amor... é bonito", refere.
Sobre se é possível alguma vez habituarem-se a ouvir os seus nomes gritados com o entusiasmo com que têm sido recebidos em todo o mundo, Sofya Plotnikva, 19, cantora e dançarina da Rússia, diz que não. "É sempre inesperado ouvir alguém a gritar o teu nome, mas também é bonito sentir o carinho e o apoio deles. Isso faz-me sentir muito motivada e acredito que todos nós sentimos isso."
Quando a música e o amor se unem num mundo virado ao contrário
Também é por isso, continua Sofya, que o grupo tem saudades de subir aos palcos. "Tudo o que fazemos, fazemos pelos nossos fãs. Poder estar com eles, seja de forma for, e ouvi-los a gritar e a dar-nos apoio é algo de que nunca nos vamos cansar", reforça.
Mais do que promover a tolerância e a representatividade entre nações, os Now United também procuraram reconciliar-se com acontecimentos recentes. De repente, o mundo estava mergulhado numa pandemia e, nos EUA, o movimento #BlackLivesMatter tomou as ruas em protesto contra a violência policial que vitimou George Floyd às mãos de um polícia branco.
Em resposta, o grupo lançou, em junho de 2020, o single "Stand Together", que reforçava mensagens de tolerância e união em resposta ao caos. A escolha não foi ao acaso e, dizem-nos, é essa a linha identitária dos Now United enquanto banda.
"Tomar um posição destas [de união face ao caos] era muito importante, especialmente tendo em conta esta geração da internet que tem crescido e que faz com que as pessoas sejam mais individualistas e comuniquem apenas por telemóveis, muitas vezes sem conhecer o rosto da pessoa com quem estão a conversar", diz-nos Sina Deinert, 23, cantora e dançarina, que representa a Alemanha.
Também por isso, não é de estranhar que os fãs se tenham unido num corpo único, mesmo que separados por fronteiras.
"O mais fascinante de tudo isto é que até os nossos fãs fizeram amizades, mesmo que sejam de países diferentes. Ver que as pessoas estão a encontrar formas de comunicar, de se juntar e ter experiências reais é formidável. Por isso, creio que sim, que foi mesmo a altura perfeita para termos ganho tração e poder mostrar às pessoas que, sim, é possível, que a música é uma língua universal e de que é possível ultrapassarmos qualquer coisa através dela", acrescenta Melánie Thomas, 18, cantora e vocalista da Costa do Marfim.
E porque extravasar fronteiras também faz parte dos objetivos do grupo, uma das colaborações mais esperadas envolve a dos Now United com os BTS, o grupo de sucesso de música pop coreano.
Sobre quando vai acontecer? "Talvez daqui a uma hora. Talvez amanhã. Quem sabe? Na verdade, descobrimos grande parte do K-pop através dos nossos fãs e estamos muito entusiasmados com a possibilidade de uma colaboração. Talvez amanhã ou na próxima semana. Estamos prontos", diz-nos Jeong Heyoon.
A bandeira ao peito que aproxima a casa que está longe
De cada vez que os Now United sobem aos palcos ou se preparam para gravar um vídeo novo, a bandeira dos respetivos países que representam está ao peito. Ajuda a identificar quem é quem, é certo, mas talvez tenha ainda outro significado: o de trazer para perto a casa que está longe.
Os jovens, sempre alegres e extrovertidos, acusam alguma tristeza e baixam as cabeças quando o assunto é falar de casa.
"Estar longe da família e dos amigos durante tanto tempo... é um desafio. Todos temos saudades dos nossos amigos, namorados e namoradas. Mas este é um sacrifício que assumimos e que fazemos juntos. Ajudamo-nos mutuamente sempre que as saudades batem com mais força", diz o americano Noah Urrea.
Jeong Heyoon, a vocalista coreana, toma a palavra para reforçar o "orgulho" que sente de cada um dos membros por aquilo que, nas suas palavras, foi o encontrar de uma forma de "crescer, fazer parte desta indústria e enfrentar algumas das situações mais duras que a vida tem para oferecer". Sempre em conjunto. A cada palavra que lhe sai, a voz soa frágil, mas os colegas retribuem com o um aceno de cabeça, outros dão as mãos.
"Acho que os Now United são o exemplo daquilo que o mundo pode ser se todos se juntarem e deixarem os preconceitos de lado. Não há motivo nenhum por que ninguém possa abraçar o outro. Podemos todos amar-nos e aceitarmo-nos independentemente das nossas diferenças", diz Lamar.
A conversa com o grupo termina, mas eles continuam juntos e de mãos dadas. Afinal, é difícil separar quem faz da união mote. Eventualmente afastam-se, mas apenas porque chegou mais uma fã que venceu a timidez e decidiu pedir um autógrafos.
Eles sorriem e falam com ela, como se fossem família. Estão habituados. Nasceram para isto.