Numa das muitas conversas que se tem à porta da redação na pausa para café, uma das grávidas da MAGG revelou-me que nunca chamaria Fernando ao filho. Mas talvez mude de ideias depois de ler este artigo sobre o novo Vila Galé Douro Vineyards, em Armamar. É que este Fernando, o funcionário do restaurante do hotel, brilhou no serviço e na receção dos hóspedes ao jantar. Foi familiar e transmitiu aquele conforto quase paternal de um anfitrião que só quer ver aqueles que serve satisfeitos.

Mas porque falar de experiências requer que se comece pelo início, a chegada ao novo agroturismo da região, que abriu portas em abril, é acompanhada de uma desilusão quase fatal: é que ir ao novo Vila Galé Douro Vineyards e não levar carro é um erro — e não é apenas porque deixa de haver a possibilidade de conhecer melhor a região.

Embora a receção, o restaurante e o bar estejam à entrada do alojamento, os sete quartos que o compõem estão separados por uma encosta íngreme, onde o solo é irregular.

Olhei para cima, tentei calcular a distância que separava o ponto A do ponto B e o meu corpo encheu-se de tremeliques e suores frios. É dada a facada final quando o funcionário me diz que são 500 metros de distância desde a entrada até ao topo da colina.

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A ideia, segundo os responsáveis, é respeitar a privacidade dos hóspedes, o que obriga a que as subidas e as descidas sejam sempre feitas por transfer para quem decida não levar carro. E enquanto as descidas se fazem sem grandes problemas, apesar do solo irregular, as subidas são incomportáveis. Especialmente nos dias de muito calor.

Tinha chegado há cerca de dez minutos para uma estadia de duas noites e já estava a suar. Peço que se coloquem no meu lugar, caros leitores: não gosto de depender de ninguém e, pior ainda, sentir que estou a dar trabalho extra.

É que embora o serviço de transfer esteja previsto no trabalho dos funcionários do hotel, não há ninguém alocado especificamente para essa função. A tarefa cabe a quem estiver na receção, obrigando muitas vezes a que o funcionário tenha de deixar o seu posto para ir buscar um hóspede ao topo da encosta ou levá-lo do restaurante de volta para os quartos.

A viagem dura cerca de dois minutos. Um dos funcionários que nos levou nesta viagem revelou-nos que já perdeu a conta às vezes que subiu e desceu aquela encosta. "Faço este caminho tantas vezes por dia que já estou habituado, mas às vezes ando a correr de um lado para o outro".

Mas a verdade é que, de todas as pessoas que estiveram hospedadas no hotel, só eu é que precisei de transfer e, por isso, assumo que talvez não seja um problema generalizado. Apesar de ter sido a componente menos confortável da minha experiência, aceito que faça parte da disposição e do método de funcionamento do hotel. E a verdade é que, das vezes que foi preciso chamar o transfer, nunca esperei mais do que cinco minutos para que o funcionário chegasse. E fazia-o sempre com um sorriso e uma simpatia contagiantes.

No entanto, e tendo em conta que até 2020 está prevista a construção de mais 42 quartos no topo da colina, talvez não fosse má ideia pensar na criação de uma sala de pequenos-almoços e restaurante junto aos quartos. Fica a sugestão.

O maravilhoso rio Douro tão perto da janela

Uma vez subida a encosta, os elogios vão para o sossego que este Vila Galé oferece. Mesmo que os sete quartos estejam ocupados por hóspedes no fim de semana escolhido para esta estadia, a tranquilidade do Douro não deixa que isso seja percetível e o que temos é um escape ao ritmo frenético, às luzes e ao movimento da cidade — com uma vista panorâmica para o rio e para os socalcos.

O Vila Galé Douro Vineyards é, acima de tudo, o sítio perfeito para relaxar e conhecer um pouco da cultura do Douro. Para isso, o hotel garante visitas à adega e às provas de vinhos que estão abertas a todos os hóspedes.

Os quartos deste alojamento não fogem muito àquilo que são as linhas estéticas de outros hotéis do grupo Vila Galé. Mas aqui a vista panorâmica sobre o Douro dá-lhes outro encanto e permite-nos usar a janela para o terraço para aproveitar as noites sob o céu estrelado. Acordar e ter como paisagem o movimento suave do rio é das experiências mais especiais que o alojamento oferece. E só isso é capaz de valer a pena a estadia.

Ainda no quarto, apenas dois inconvenientes: uma das portas do armário não prendia quando fechada e, no duche, a água quente falhou, obrigando a uma chamada para a receção que foi rápida e eficiente a resolver o problema.

O facto de os quartos estarem isolados da receção, a 500 metros de altura, tem como ponto positivo a privacidade quase total, mas também no acesso rápido e fácil à piscina — que está, literalmente, a quatro ou cinco passos das portas das casas.

Nesse aspeto, a piscina relativamente pequena — não podemos esquecer que ainda só há sete unidades de alojamento construídas —, serve como ponto de convívio onde todos os hóspedes se encontram para relaxar numa espécie de silêncio comungado. O cuidado e o respeito pelo sossego dos outros é levado muito a sério aqui.

O Vila Galé Douro Vineyards faz uso de toda a paisagem circundante para oferecer uma experiência memorável
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Ao contrário do que acontece noutros hotéis, não é preciso percorrer grande parte do alojamento para chegar à piscina. E esta embora não seja aquecida, ganha pontos pela forma como faz uso da vista para toda a paisagem natural.

Poder nadar com vista para o Douro ou estar deitado na relva (ou espreguiçadeiras) a ler com os socalcos das colinas a fitar-nos é o ponto forte deste Vila Galé Douro Vineyards. E só quem lá vai percebe porquê. Porque é naquele momento que somos seduzidos a desligar do online, das preocupações do mundo lá fora e do stresse.

Talvez por isso o hotel tenha esta disposição. Naquele momento, enquanto apreciava o silêncio daquele Vila Galé — sem a habitual azáfama dos funcionários, do restaurante e da chegada e saída de hóspedes —, consegui entender a estratégia de dividir o espaço em dois. Na teoria, é maravilhoso. Na prática, levanta alguns desafios a quem chega sem carro como eu.

Neste Vila Galé Douro Vineyards há panquecas, croissants e queijos — mas faltam as bebidas vegetais

O pequeno-almoço é servido no restaurante, em regime à la carte. A explicação é muito simples, segundo nos revelou um dos funcionários: "As pessoas vêm em alturas diferentes da manhã e não faz sentido que os croissants estejam expostos desde muito cedo se há pessoas que só chegam às 11 horas, até porque assim ficam rijos."

Além dos croissants, há um cesto com diferentes variedades de pães e merendas que chegam à mesa e que podem ser recheadas com vários tipo de queijo (brie, emmental e flamengo), fiambre (de porco ou peru), chourição, marmelada e doce de pêssego.

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Mas além deste conjunto que chega sempre à mesa, é possível pedir mais produtos da carta como ovos mexidos, cogumelos salteados, tomate gratinado com queijo e as deliciosas panquecas macias que, acompanhadas de pasta de avelã com chocolate e pedaços de morangos, são a estrela da carta preparada no momento pelo chef.

Apesar da comida estar bem confecionada e deliciosa, destaco pela negativa a falta de opções de bebidas vegetais na carta. É um ponto a melhorar numa altura em que vários dos hotéis do Grupo Vila Galé têm, na sua carta, opções como leite de soja — que aqui não existia.

Para falar sobre o serviço de jantar, temos de voltar ao ponto de partida deste texto: Fernando, o funcionário responsável por servir os hóspedes no restaurante, aberto também a clientes externos.

Fernando é um homem alto, magro e faz lembrar aquele tio simpático que não perde uma oportunidade de se sentar junto a nós para contar mil e umas histórias sobre a produção e o sabor dos vinhos. É o empregado prestável que, com mais de 20 anos de experiência, toda a gente gostaria de ter no seu restaurante e qualquer pessoa gostaria que o servisse.

Desde a abordagem que fazia a explicar cada prato, ao cuidado e preocupação que tinha no trato e nas perguntas colocadas, Fernando foi sempre uma figura muito próxima e familiar num espaço que, de tão frenético que por vezes consegue ser, pode dar azo a uma distância entre o funcionário e o cliente.

A empatia gerada foi imediata, o que tornou toda a experiência mais agradável. Porque um serviço de jantar não se limita apenas à comida, Fernando contou-nos histórias da sua vida e da sua profissão com uma simpatia e uma sinceridade que nunca pareceu desagradável ou forçada.

E o entusiasmo na forma como apresentava cada prato denunciava aquilo que Fernando nunca fazia por esconder: a paixão pela área e por este contacto próximo e cuidado com quem vai lidando diariamente.

Entre o caldo verde aveludado e o robalo com mousse de aipo, não repeti por vergonha

O serviço começa com uma couvert de pão para molhar numa taça de azeite que se destaca pelo tom amarelado e delicado. Sobre a cor, Fernando não perde tempo: "A cor é amarelada porque este azeite não é filtrado, o que permita que seja tão suave no palato". E merece todos os elogios pela forma como abre o apetite para o que se segue.

E o que se segue é um caldo verde que Fernando diz ter sido o melhor que já comeu na vida. "Já comi muitos caldos verdes na vida, inclusive aqueles que servem nas festas. Mas aí as pessoas já não estão a ver bem e é tudo bom [risos]. Mas este é melhor", confessa.

O caldo verde é composto por um caldo aveludado que é servido em cima de um monte de couves. Serão cortadas na hora? Nunca vamos saber. E em vez de ter chouriço, como é tradicional, tem presunto da região que dá um sabor totalmente diferente a esta sopa. Não pedi para repetir por vergonha.

Da carta fazem parte opções como polvo grelhado com feijoca e enchidos regionais (19€), que se desfaz na boca como manteiga devido à cozedura lenta, durante três dias, com temperaturas muito baixas; medalhões de bacalhau com esmagada de batata (20€); e filete de robalo acompanhado de um salteado de gnocchis e mousse de aipo (16€) — que é sem dúvida a estrela da carta.

A suavidade da mousse de aipo contrasta na perfeição com a robustez de um filete que se desfaz a cada garfada por vir cozinhado no ponto e com uma pele suficientemente estaladiça sem estar queimada
A suavidade da mousse de aipo contrasta na perfeição com a robustez de um filete que se desfaz a cada garfada por vir cozinhado no ponto e com uma pele suficientemente estaladiça sem estar queimada

Pedi o robalo sem saber muito bem ao que ia, até porque não gosto do peixe nem de aipo. Mas a recomendação de Fernando (sempre Fernando), que passou grande parte do serviço a elogiar o prato, fez-me arriscar. Fui a medo e fui surpreendido.

A apresentação excecionalmente apetecível do prato dá vontade de o comer, embora com remorsos de estragar a beleza da apresentação preparada pelo chef. A mousse de aipo sabe a tudo menos aipo e isto é um elogio.

A suavidade do creme contrasta na perfeição com a robustez de um filete que se desfaz a cada garfada por vir cozinhado no ponto e com uma pele suficientemente estaladiça, sem estar queimada. Não fosse este um restaurante de um hotel e teríamos lambuzado o prato até não restar mais nada. Infelizmente, não houve espaço para sobremesa porque não aguentava mais e a refeição terminou com um café de frente para o Douro estrelado.

Ao fim do serviço, a despedida. Entre a conversa com Fernando, que se dividia entre vários temas e elogios aos pratos que servia, agradeceu a presença e a simpatia.

"Espero que tenha gostado da experiência e deixe-me dizer-lhe que foi um gosto de todo o tamanho servi-lo". O gosto foi todo meu, Fernando, e prometo regressar.

*A MAGG esteve no Vile Galé Douro Vineyards a convite do alojamento