Foi mãe há poucas semanas e rezou a todos os santinhos por lhe ter calhado na rifa um bebé fofinho, cheio de saúde, que come bem e dorme o dia todo. E eis que chega ao marco das três semanas e o seu bebé, que até à data era um pequeno anjo, transforma-se num diabo ao final do dia, com choro constante e sem acalmar por nada deste mundo. Calma, pois o mais provável é que esteja a passar pela hora da bruxa, um termo popular que descreve uma fase de irritação comum a bebés pequeninos.

"A hora da bruxa é basicamente uma altura do dia muito difícil para os bebés mais pequenos. Corresponde à hora das cólicas, começa geralmente pelas 19, 20 horas, embora possa começar um pouco mais cedo ou mais tarde conforme os bebés, e pode estender-se por um período de uma a duas horas. Após isso, adormecem e ficam traquilos", explica à MAGG a pediatra Carolina Prelhaz.

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Tal como salienta a médica pediatra, o seu bebé pode estar a atravessar a hora da bruxa se, ao fim do dia, passar por um período de choro prolongado, difícil de consolar, e onde não encontra uma razão para ter ficado assim de uma hora para a outra. Carolina Prelhaz explica que "é importante perceber se não são realmente cólicas intestinais, ou algo mais grave" e caso este choro não se console com nada, se prolongar por um período mais extenso de horas, se o bebé não quiser comer ou fique assim também durante o dia, "é necessário ser visto por um médico, pois pode ter uma causa abdominal".

Feito o alerta, se o seu bebé seguir um padrão de repetição de choro ao final do dia, este quadro sugere que se trata de "algo menos complicado, como a hora da bruxa", reforça a especialista.

O que causa a hora da bruxa?

A pediatra Carolina Prelhaz salienta que existe um conjunto de fatores a contribuir para este estado de irritação. "Quando falamos de bebés amamentados, está provado que as mães produzem menos leite ao final do dia. Assim, estes bebés não vão ficar tão saciados e vão querer estar mais tempo na mama", diz a especialista, que reforça assim a importância de amamentar num horário livre.

"Nem as mães produzem a mesma quantidade de leite ao longo do dia, nem os bebés, tal como os adultos, têm a mesma fome durante todos os períodos do dia", destaca a médica pediatra, assinalando a menor produção de leite como um dos fatores comuns da hora da bruxa.

hora da bruxa
Carolina Prelhaz é médica pediatra

Outra situação que leva a este estado de irritação é a transição do dia para a noite. "Os bebés pequeninos são muito dependentes, vêm programados para terem um bocadinho de medo ao final do dia devido ao desaparecimento da luz solar. Ficam com mais medo, querem estar ao colo e pedem mais proteção da parte da mãe", argumenta Carolina Prelhaz.

Também a hiperestimulação pode conduzir a este cenário. Depois de um dia em que houve um pouco de tudo, desde passeios a brincadeiras, os "bebés ficam mais cansados e podem ter mais dificuldade em desligar". A pediatra acrescenta que, "a juntar-se isto à sensação genética de ser uma altura do dia mais ameaçadora, culmina num cocktail em que os bebés têm um choro pior do que no resto do dia, não se acalmam e ficam muito irritados".

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Identificadas as razões, há solução para acalmar os bebés? Em primeiro lugar, Carolina Prelhaz descreve que esta é uma situação que acontece num determinado período de vida dos mais novos, e que acaba por passar. "A hora da bruxa começa a ser notada a partir dos 15 dias e pode prolongar-se até aos 3, 4 meses, sendo a pior fase por volta dos 2 meses."

Mas enquanto o seu bebé atravessa este período, a médica pediatra explica que existem alguns gestos que podem minimizar o desconforto das crianças. "Há bebés que já mamaram, querem o conforto de chuchar, mas ficam irritados por estar na mama e estar a pingar leite. Para estes, oferecer a chucha pode ser uma opção, mesmo que o uso da chupeta seja desaconselhado nas primeiras semanas de vida para não dificultar a amamentação. Mas com 3 semanas de vida a alimentação já deverá estar estabelecida, por isso a chucha pode ser dada sem medo."

Outros bebés, que ficam assustados com a transição do dia para a noite, podem acalmar com o colo, mas podem recusar o mesmo se este for um colo mais nervoso. "Ao final do dia, as mães estão mais exaustas e, se o bebé estiver a passar pela hora da bruxa, a chorar sem razão, isto pode fazer com que as mães fiquem mais stressadas, a abanar mais o bebé, e a oferecer tudo menos um colo tranquilo. Isso passa para as crianças, e pode ser mais benéfico passar o o bebé para alguém que esteja mais calmo ou mesmo para o berço", diz Carolina Prelhaz.

"Há bebés que assim que são deitados, se estiverem enrolados numa fraldinha, acalmam logo. Isto de pensar que se o bebé está a chorar precisa de mais colo não é necessariamente verdade", alerta a médica pediatra, que salienta que a criança tem de se sentir protegida, perto da mãe, mas não tem de ser abanada com mais força. "Embora cada bebé seja um caso, a proximidade física quer-se na hora da bruxa, mas tem de ser tranquilizadora."

A especialista também reforça que "tudo o que contribuir para tranquilizar o bebé" é válido, e as máquinas de sons podem ser uma opção. "Sons de natureza, de passarinhos, de bater do coração podem acalmar as crianças, dado que os sons repetitivos em frequências suaves podem ter esse efeito."

"Chamar cólicas a este período é redutor"

Se já conhecia ou passou por este cenário com o seu filho, mas sempre se referiu ao mesmo como cólicas não está necessariamente errada — afinal, o termo cólicas é muito usado para descrever esta sensação de irritação dos bebés mais novos. Mas Carolina Prelhaz não está de acordo.

"Chamar cólicas a este período é redutor. Ouvimos a palavra cólicas e pensamos em gotas e massagens, e acabamos por descartar atitudes que podem ajudar o bebé como o colo, o mimo, a mama mais prolongada. Atenção que um cenário de cólicas, relacionadas com a barriga, pode-se sobrepor à hora da bruxa", alerta a médica pediatra.

Carolina Prelhaz acrescenta, no entanto, que apesar da hora da bruxa poder ser um cenário difícil, é importante perceber se existe uma repetição desta irritação diariamente, que acaba por passar depois de umas horas, ou se podemos estar perante outro tipo de casos. "Se o bebé está bem o dia todo, come bem, passa por umas horas complicadas ao final do dia, mas depois vai dormir, isto é, regra geral, um bebé que está bem. Mas se nada o acalma por um largo período, se não quer comer, se há vómitos ou diarreia associada, isso será sempre para discutir com o médico."