E de repente o mundo percebeu que está a usar demasiado plástico. Não que esta não seja uma realidade antiga, mas às vezes é preciso uma capa como a da National Geographic para chamar a atenção dos mais céticos (ainda que tenha sido vendida num invólucro de plástico, mas isso é outra conversa).

Ainda com o Dia Mundial do Ambiente bem fresco — este ano também dedicado à luta contra a poluição pelo plástico —, e o Dia dos Oceanos a celebrar o mesmo tema, as Nações Unidas aproveitaram para lembrar que 80% da poluição dos oceanos provêm das pessoas que estão em terra.

Esta quinta-feira, 7 de junho, um novo relatório divulgado pela WWF — World Wide Fund for Nature, vem reforçar esta preocupação, ao lançar o alerta de que o Mar Mediterrâneo corre o risco de se transformar numa armadilha plástica, com níveis recorde de poluição causada por microplásticos, que ameaçam tanto espécies marinhas como a saúde humana.

Tentei passar um dia sem usar plástico. Não passei do pequeno-almoço
Tentei passar um dia sem usar plástico. Não passei do pequeno-almoço
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"Ah, mas o Mediterrâneo acaba ali em Espanha, já não nos afeta", parece que já ouvimos alguém dizer. Pois bem, além da necessidade de pensar no planeta como um todo, Portugal acaba sempre afetado devido à proximidade com este mar. É comum ver destacadas as áreas de Lisboa e Costa Vicentina como zonas com risco elevado de contaminação pela sua proximidade com os Estuários do Tejo e Sado, que apresentam elevadas densidades de microplásticos.

De notar que, segundo um estudo publicado em 2015 sobre a costa portuguesa, 20% dos peixes de consumo quotidiano revelam microplásticos nos seus estômagos (entenda-se como microplástico todas as pequenas partícula de plástico com um máximo de 5 milímetros).

Esta capa da National Geographic já é considerada uma das melhores de sempre
Esta capa da National Geographic já é considerada uma das melhores de sempre

Para essa pesquisa foram analisados 263 peixes de 26 espécies diferentes. Foram encontrados microplásticos no interior de 17 espécies e 32,7% dos peixes tinham até mais do que um tipo de microplástico no estômago.

"O agravamento da poluição do plástico ameaça o turismo e atividades de pesca não só no Mediterrâneo mas também no nosso país, já que as nossas praias, o nosso pescado e as nossas fontes de água doce estão em risco. O problema dos plásticos é um sintoma do declínio geral da saúde do Planeta", lembra Ângela Morgado, diretora executiva da Associação Natureza Portugal, a representante portuguesa da WWF, no comunicado que acompanha o novo relatório.

O perigo do plástico

Grandes pedaços de plástico ferem, sufocam e matam frequentemente animais marinhos, mas são os microplásticos que atingiram níveis recordes de concentração de 1,25 milhão de fragmentos por quilómetro quadrado no Mar Mediterrâneo, quase quatro vezes mais altos do que na “ilha de plástico” encontrada no Oceano Pacífico Norte e que tem 17 vezes o tamanho de Portugal.

Para esta pesquisa, a organização analisou as biopsias de cem mamíferos marinhos que vivem no Santuário de Pélagos, uma área protegida que fica entre Itália, França e Sardenha. Os resultados mostram altos níveis de contaminação de cetáceos com ftalatos, partículas normalmente encontradas em embalagens, cortinas de casa de banho, medicamentos, vernizes, tintas e maquilhagem. Esta substância é considerada tóxica para o ser humano e animais, e afetam principalmente a fertilidade e o desenvolvimento do feto.

Podíamos continuar aqui com mais números, percentagens e análises a estômagos de animais, mas as provas estão mais que dadas. "No Dia Mundial dos Oceanos [8 de junho], pedimos aos consumidores, à industria, aos governos e às cidades costeiras que reduzam o uso do plástico e fomentem a sua reciclagem", refere o líder da iniciativa marinha mediterrânica da WWF, Giuseppe Di Carlo.

Por cá, e bem devagarinho — não nos esqueçamos que cada português ainda produz 453 quilos de lixo por ano — já começa a crescer a consciência de que a necessidade de reduzir o uso do plástico é urgente. Os supermercados nacionais vão ter unidades de recolha de plástico usado, que vão converter o peso entregue pelo consumidor em senhas de desconto. A iniciativa faz parte do pacote de iniciativas do Governo para reduzir o impacto da poluição causada por estes resíduos

As medidas passam também pela redução do consumo de garrafas de plástico, voltando a usar garrafas de vidro nos restaurantes ou substituindo as garrafas de plástico usadas, por exemplo, em congresso por jarros de água e copos de vidro.