"Este copo de café é no amarelo ou no azul?", "Onde posso comprar a granel em Alvalade?", "Como fazes bebida vegetal em casa?","E essas roupas vintage, compras onde?". Marta Cerqueira habituou-se a receber destas mensagens no Whatsapp ou no Instagram, dos amigos que ficavam com dúvidas sobre os hábitos sustentáveis que já tinha e que eles queriam começar a adotar.
Não demorou a perceber que talvez este raio de influência pudesse ser alargado a um público maior que o seu grupo mais restrito. O facto de escrever sobre sustentabilidade há alguns anos, assim como de aberturas de novos espaços em Lisboa, davam-lhe a bagagem para criar um projeto de raiz ligado ao tema.
Mas para esta ideia passar à prática, foi fundamental a candidatura ao Women 4 climate, uma iniciativa que tem como objetivo aumentar a participação e liderança das mulheres no mundo da sustentabilidade. Para isso, abriu um concurso para mulheres empreendedoras com ideias e projetos inovadores nesta área, e Marta lançou-se, ainda a solo e sem nome para o projeto que, até ali, só existia na sua cabeça.
Com as mentorias certas e as pessoas que entretanto se juntaram ao projeto, este é agora bem real. A Peggada — assim mesmo, com dois 'g', que todo o green é pouco — nasceu para ser um guia para quem quer fazer opções mais sustentáveis no seu dia a dia. Para já está focado em Lisboa, mas o objetivo é avançar para outras zonas do País.
O site, além de uma agenda de eventos e de artigos com dicas e reportagens, junta um diretório de todos os estabelecimentos a granel, roupa em segunda mão e lojas eco, assim como os restaurantes e hotéis que a equipa da Peggada considera terem práticas sustentáveis.
E falamos aqui em equipa porque a Marta deixou de estar sozinha. Conheça os outros dois passos desta Peggada.
Quem é a equipa da Peggada?
"Eu nunca quis fazer este projeto sozinha, mesmo quando me candidatei. Não tinha era ninguém que o quisesse fazer comigo. Desde sempre percebi que se não conseguisse juntar uma equipa, o projeto nunca ia chegar à prática. Acabei por convidar a Lígia", diz Marta Cerqueira.
Lígia Gomes, de 35 anos, é outra das mulheres empreendedoras que se candidatou ao Women 4 climate. No entanto, o seu projeto sobre trabalho remoto acabou por não avançar. Sem se conhecerem e tendo apenas falado algumas vezes através do Instagram, precisamente sobre sustentabilidade e também sobre viagens, outra das paixões em comum, Marta lança o desafio: "Olha, quereres fazer isto comigo?", perguntou a Lígia, que respondeu prontamente que sim, para espanto de Marta.
Enquanto Marta trabalha os conteúdos da Peggada, como textos e copies, Lígia ficou responsável pela construção do site. Contudo, faltava ainda alguém ligado ao design e imagem e foi aí que entrou Hugo Nogueira, de 29 anos, gestor de social media na MAGG e na Pips Bazaar.
Marta, Lígia e Hugo não podiam representar melhor a diversidade do público que chega até à Peggada: dos iniciados aos avançados da sustentabilidade. É que Hugo assume que começou a reciclar há bem pouco tempo.
"Quando estou num projeto, gosto de saber, gosto de estar relacionado com a mensagem que está a passar. Portanto, mesmo que o meu contributo seja maioritariamente na parte criativa, de design, etc, acho que faria sentido aplicar aquilo de que falamos ao meu estilo de vida", diz à MAGG.
Tem começado por coisas básicas e de vez em quando ainda surgem algumas dúvidas, que pergunta sem vergonha. "Onde é que ponho as máscaras? Depois lembrei-me que, no outro dia, a Marta tinha dito que eram no lixo comum e eu comecei a pôr", lembra. Mas Hugo já vai mais longe: agora reserva a água do banho até esta aquecer num jarro, para usar depois na sopa ou cozer massa ou até para tirar o excesso de sujidade de alguma louça antes de ir para a água.
Hugo é talvez o que melhor compreende aqueles que vão mudar a pegada mas a "um passo de cada vez", como sugere o mote do projeto. "Não dá para exigir que de repente toda a gente mude. Acho que há pequenos passos que nos tornam uma boa influência e nos mudam e deve ser sempre tido em consideração. Mais vale fazer alguma coisa do que não fazer nada", diz, por experiência própria, Hugo Nogueira.
Já Lígia, que é farmacêutica de base, foi copy de várias agências de publicidade, passou pela Zomato e agora define-se como nómada digital, embora este ano essa função tenha sido dificultada, é outras das entusiasta pela sustentabilidade da Peggada e diz que está num nível não tão pró como a Marta, nem tão no início como o Hugo, mas sim, no meio.
"Há muitos anos que não compro roupa em fast fashion, garrafa reutilizável, evitar plástico, usar sacos de pano, essas coisas assim já faço. Há algumas partes da minha vida em que ainda estou a integrar, como detergentes na cozinha. Tem sido um processo", conta à MAGG. Desde processo, faz agora parte a Peggada, um desafio "para o bem comum", diz.
Afinal, qual é o objetivo da Peggada?
A caminhada da equipa deste novo projeto fez-se remotamente. Estiveram juntos apenas uma vez em casa de Marta Cerqueira, com um bolo de banana e chá que os inspirou a dar rosto ao projeto e a traçar o seu objetivo.
"O nosso principal foco é criar uma comunidade. Criar um espaço em que todas estas pessoas que se preocupam em ser mais sustentáveis, que são cada vez mais, tenham um lugar comum. Sejam as pessoas que têm um estabelecimento ou aquela que quer começar a comprar a granel. Este é o nosso grande objetivo", explica Marta Cerqueira.
"É um projeto que vai mostrar que não é assim tão difícil ter preocupações sustentáveis. Simplesmente não sabem onde procurar. No fundo, queremos criar um sítio onde as pessoas sintam que a informação é fidedigna e que conseguem perceber que há pequenas coisas que podem fazer e podem realmente mudar o nosso planeta", acrescenta Lígia.
E para quem está a dar os primeiros passos, a que secção do site da Peggada deve dirigir-se? "Depende muito. Para uma pessoa que gosta muito de comer fora, talvez saber quais os restaurantes que têm mais preocupações com sustentabilidade. Também, para quem está a começar, ver as lojas a granel. Ver que não é um bicho de sete cabeças. No fundo, perceber o que se pode comprar. Não é só feijão seco que depois dá imenso trabalho em casa a demolhar. Ir a uma loja a granel para quem está a começar é obrigatório", diz Lígia.
Às vezes, estas lojas ou mercearias estão à mesma distância de um supermercado e nem imaginava. Agora não só pode imaginar, como pesquisar aqui. Dos hotéis aos restaurantes, todos os estabelecimentos foram escolhidos através de critérios rigorosos.
No casos das unidades hoteleiras, tinham de ter o selo “We Care” de Sustentabilidade Ambiental e o Selo “We Share” de Responsabilidade Social. Já para os restaurantes, com ajuda de jornalistas da área, produtores e comerciantes, Marta criou uma lista de critérios, enviada através de um inquérito para vários restaurantes que se encaixavam no perfil. Se cumprissem os critérios da lista, entravam na Peggada. "É por isso que para já são poucos, porque somos exigentes nos critérios", diz Marta.
A grande aposta do projeto é o online e o próprio feedback da comunidade que começa a juntar-se. Depois de terem juntado no site da Peggada o diretório de todas as lojas físicas de Lisboa, estão já a pensar expandir o projeto com base nesse feedback. "Principalmente durante os meses de pandemia, houve muitos negócios a nascer online, desde a pessoa que começou a fazer champôs sólidos em casa à que criou uma linha de roupa sustentável e são essas pessoas que nos têm contactado mais, vendo em nós uma espécie de montra para mostrar o seu trabalho", diz Marta. "É muito por aí que queremos apostar nesta primeira fase", termina.
Quanto à candidatura ao Women 4 Climate, esta quinta-feira será a final, que dita se a Peggada sai ou não (ainda mais) vencedora.
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