Esta segunda-feira, 26 de outubro, a TVI estreou a sua nova novela da noite, "Bem Me Quer". Passada entre Aveiro e a Serra da Estrela, a produção conta com um trio de protagonistas bastante jovem, encabeçado por Kelly Bailey, Bárbara Branco e José Condessa. Giro, novas gerações a comandarem, e toda eu a sentir-me velha. Sabem quando vemos a novela e já nos identificamos mais com a vida da mãe do que com a da protagonista? Pois.
Bom, passando à frente o desabafo, enchi-me de esperanças para ver esta estreia, muitas personagens novas, um enredo incrível e uma história que nos prende ao ecrã. Pena que pouco disto se tenha passado. Meus amigos, já vi a minha quota parte de primeiros episódios de novelas, e embora comece a seguir religiosamente muito poucas, as estreias têm sempre o condão de nos captar a atenção. Mas tal não aconteceu aqui, em grande parte do episódio — mas já lá vamos.
E um dos primeiros problemas é a ligação do público com dois dos protagonistas. Kelly Bailey é linda de morrer, mas confesso que a vitória na lotaria da genética não se traduziu num talento incrível para representar. A prestação da atriz da TVI como uma jovem e humilde pastora parece forçada demais, ninguém percebe muito bem que tipo de sotaque bruto é aquele e parece que tudo lhe sai com muita pouca naturalidade. E vamos falar sobre o "fula da vida"? Em 50 minutos de novela, ou algo semelhante, o chavão saiu da boca de Maria Rita umas cinco ou seis vezes (é mais que um fula por 10 minutos, percebem?), e fico a pensar se os argumentistas têm falta de vocabulário.
Já David de Aveiro, ou só David para os amigos, interpretado por José Condessa, vai na mesma onda de tudo lhe parecer tirado a ferros. E química entre os protagonistas, que já se está mesmo a ver que se vão apaixonar? Zero. David e Maria Rita conhecem-se quando a pastora pensa que lhe estão a assaltar a casa, e resolve dar um tiro no alegado ladrão. De pressão de ar, certo, mas isto não é moça para meias medidas e saca logo da espingarda. Aqui a questão é que David estava engravatado, a espreitar pela janela, e a ser um ladrão, deveria ser o melhor vestido de sempre. Mais depressa eu pensava que era o Homem do Fraque atrás da prestação do crédito da casa do que um ladrão.
"Ele a mim não me engana, é do banco", diz Maria Rita ao avô depois do tiro. Ah, bom, já se colou à minha linha de pensamento. Mas espera, é aceitável começar a atirar nos bancários? Este é apenas um dos muitos momentos WTF da estreia, que tenho todo o prazer de enumerar — sim, se eu vi o episódio inteiro, vocês também vão levar com isto.
Aveiro é o centro do mundo, a Serra da Estrela ficou parada no tempo e os ricos bebem champanhe o dia todo
A estreia de "Bem Me Quer" foi recheada de momentos curiosos. Vá, estranhos. Na verdade, sem muito sentido. Para começar, assim que David chega à pequena aldeia da Serra da Estrela, todos denotam a sua presença e este diz a mais do que três pessoas de seguida que é de Aveiro. Aliás, quando confronta Maria Rita depois desta o alvejar, volta a dizer que é de Aveiro. Não se cala com isto, tanto que todos os locais se começam a referir a si como o David de Aveiro. Alguém me diz o que é que eu perdi aqui para o ser de Aveiro ter uma importância atroz, mais do que de qualquer outra cidade? É por causa dos ovos moles? Não sei.
Continuando. Pelo menos na lógica da novela, a Serra da Estrela ficou tão parada no tempo que Maria Rita e o avô entram num autocarro dos anos 60 para irem até à prisão, como se os expressos existentes na zona não fossem bem mais modernos. Por outro lado, o pequeno centro de saúde da aldeia deve ter tecnologia de ponta e ser dos mais avançados do País, dado que, em menos de 24 horas, tratam um ferimento de tiro e diagnosticam uma doença cardíaca ao avô de Maria Rita. Se o centro de saúde da minha zona conseguir marcar-me as vacinas das miúdas com três semanas de antecedência eu fico contente, mas isto no universo "Bem Me Quer" é malta que sabe fazer as coisas.
Falámos em doenças cardíacas? Nada disso, isso é coisa que não atinge Honório (interpretado por Pompeu José), que num dia sentiu-se mal e estava de cama no centro de saúde, no outro estava sentado à chinês em cima de uma pedra para aí com cinco metros de altura. Isto para uma personagem que deve ter entre 60 e 70 anos. Impecável.
E vamos falar sobre clichés? Ainda não foram apresentados muitos núcleos neste primeiro episódio, mas o rico já está destinado às famílias de David e Vera, a antagonista interpretada por Bárbara Branco. As matriarcas das famílias mais abastadas são Julie Sergeant e São José Correia, cujas personagens têm o nome de Carmo e Mercedes. O verdadeiro incrível aqui é como é que uma Carmo e uma Mercedes chamam David e Vera aos filhos, mas pára aí a dose de simplicidade.
É que fazendo jus aos verdadeiros lugares-comuns das telenovelas, as duas personagens aparecem sempre de champanhe na mão — Mercedes surge numa cena em que chega a casa e se serve imediatamente de um "drink", qual novela da Globo, e deita abaixo um whisky porque tinha a boca seca —, com um ar afetado quando têm de sair das suas mansões, com um sotaque beto forçado e a caminhar de uma maneira para lá de estranha. Alguém reparou que um dos braços nunca baixa, mas fica ali a pairar como os gatos às portas das lojas chinesas?
O melhor da novela? O cliffhanger final, Bárbara Branco e a premissa
Não foi um episódio brilhante, mas o enredo tem tudo o que queremos numa novela. Maria Rita, a simples pastora, cresceu a acreditar que os pais, emigrados na Alemanha, tinham morrido num acidente de carro. Na verdade, a personagem de Kelly Bailey é fruto de um caso extraconjugal de Henrique (Pepê Rapazote), um empresário rico de Aveiro, com a filha do pastor Honório.
Segundo a versão do avô de Maria Rita, Henrique abandonou Carolina quando descobriu que esta estava grávida, e a filha do pastor acabou por abandonar a família. Já Henrique, que está preso por desfalque, diz a Maria Rita que a história é muito comprida no primeiro encontro dos dois.
Ah, e não esquecer que o empresário, para além de pai da pastora, é também pai de Vera, namorada de David, que por sua vez foi à Serra da Estrela à procura de Maria Rita, levou um tiro, mas também já se nota que ficou caidinho pela rapariga. Ou seja, duas irmãs, um só homem para disputar. Filhos bastardos, triângulos amorosos entre irmãs, o que é que se pode querer mais numa novela?
Por falar em Vera, a personagem interpretada por Bárbara Branco é a mais credível dos protagonistas, e aquela que mais gostei de ver o episódio inteiro. Para além de apresentar um estilo impecável e estar lindíssima, Bárbara Branco foi das poucas personagens (para além de Pêpê Rapazote e Pompeu José) que surgiu sem parecer em esforço e nos fez acreditar na sua história.
Já é fácil de perceber que será a vilã, mas talvez não tenha um mau fundo. Por outro lado, também já conseguimos antever que Vera se vai envolver com Artur, o melhor amigo de David, só para pôr mais lenha na fogueira. E David Carreira que cumpriu no papel de Artur, sendo uma das surpresas positivas da noite? Sim, fiquei tão admirada quanto vocês.
Para finalizar, a estreia da TVI é salva pelo cliffhanger final. Depois de no início do episódio termos percebido que Henrique precisava de encontrar Maria Rita, dado que essa era a chave da sua liberdade, como explicou a David, a novela termina com encontro entre pai e filha na prisão.
Henrique diz a Maria Rita que tem conhecimento que a queijaria do avô está em perigo, e oferece-lhe uma oportunidade para pagarem todas as dívidas. "Para isso, só tinhas de fazer uma coisa", afirma o empresário. "Que coisa é essa?", pergunta a pastora. Corta para o ar carismático e misterioso de Pêpê Rapazote, que só nos faz querer ir a correr rever a sua temporada de "Narcos", e o episódio acaba. Será suficiente para ficarmos presos ao próximo episódio? Não sei, mas se José Condessa tirar a camisola, contem comigo.